No novo filme de Pedro Almodóvar, “Mães Paralelas”, mães solteiras e mulheres sozinhas estabelecem relações de solidariedade feminina e formam famílias, umas mais periclitantes do que outras. Com uma única – e frouxa – exceção, os homens, e os pais, são sombras em segundo plano, fantasmas do passado distante ou más recordações do passado próximo. Almodóvar é o cronista privilegiado do universo das mulheres, com um talento ímpar para o auscultar à minúcia em todos os seus cambiantes emocionais, anímicos e psicológicos, e depois traduzi-los em personagens e histórias.
[Veja o “trailer” de “Mães Paralelas”:]
Penélope Cruz interpreta Janis, uma fotógrafa de 40 anos que engravida por acidente e está decidida a criar o filho sozinha, tal como o fizeram a mãe e a avó. Na maternidade, Janis conhece uma adolescente, Ana (Milena Smit, uma revelação), que vive sozinha com a mãe atriz e também engravidou em circustâncias imprevistas, mas mais dramáticas do que as dela. Janis está feliz, Ana está cheia de medo. Ficam amigas, sem imaginar de que forma as suas vidas irão ficar ligadas a partir do momento em que se encontraram nos corredores da maternidade, pouco tempo antes de darem à luz.
[Veja uma entrevista com Pedro Almodóvar e Milena Smit:]
O gatilho narrativo de “Mães Paralelas” é um dos expedientes com mais barbas da literatura de cordel, do melodrama de encharcar lenços e das telenovelas de carregar pela boca: a troca de bebés à nascença. E nem sequer Pedro Almodóvar consegue escapar ao seu lastro sentimentalão neste filme, ao tratar os temas da maternidade equivocada, do peso da filiação e da identidade familiar com superficialidade lacrimosa e calculismo emocional, mascarados de parcimónia e contenção, afastando as personagens de nós em vez de as aproximar.
[Veja uma entrevista com Penélope Cruz:]
Além do lábio sempre trémulo e da lágrima a bailar no canto do olho, “Mães Paralelas” tem ainda um subenredo de agenda política, que envolve a polémica da memória histórica e os espectros da Guerra Civil espanhola, apresentados por Pedro Almodóvar com desonestidade intelectual e soslaio ideológico. Choramingas e raso, “Mães Paralelas” é também lamentavelmente tendencioso.