O Presidente cabo-verdiano, José Maria Neves, disse esta terça-feira que toda a sociedade está a falhar no combate à violência baseada no género e sexual de menores, uma “vergonha” que merece “tolerância zero” aos agressores e prevaricadores.
“Temos de dar combate sem tréguas tanto à violência baseada no género como à violência sexual de menores em Cabo Verde”, disse o chefe de Estado, que falava à imprensa, na cidade da Praia, após receber a terceira dose de vacina contra a Covid-19.
Esta reação surge após os mais recentes casos de violência no país, em que uma mulher assassinou o seu companheiro à facada, na ilha do Sal, e um agente da Polícia Nacional matou a tiro a sua parceira, na ilha do Fogo, após desentendimentos em casa.
Também de uma adolescente de 13 anos que foi encontrada morta numa praia na ilha do Sal, que segundo o delegado de saúde local morreu por afogamento, mas há suspeitas de que terá sido violada sexualmente antes da morte, e ainda muitos outros casos que são noticiados frequentemente no país.
“Todos nós estamos a falhar, a responsabilidade não é só das famílias, não é só das autoridades, é das famílias, das autoridades, das escolas, das comunidades”, insistiu José Maria Neves, apelando à sociedade cabo-verdiana para que desperte para esta questão.
“É uma vergonha, não podemos permitir que esta nódoa continue a manchar Cabo Verde”, referiu o chefe de Estado, sublinhando que nove em cada 10 vítimas de violência com base no género no arquipélago são mulheres.
Neste sentido, disse que é preciso responsabilização de todos, cumprimento e respeito pelos diretos, as liberdades e as garantias de cada um. “Ninguém é propriedade de ninguém e não podemos continuar a tolerar em Cabo Verde a violência com base no género”.
Para o Presidente, Cabo Verde deve construir uma sociedade de paz, sem violência e da amizade.
É fundamental que o Governo, todos os órgãos de soberania, as empresas, as igrejas, as ONG, as escolas, as famílias, todos trabalhemos no sentido de criar na consciência das pessoas essa ideia da paz e da amizade. Só assim poderemos construir uma sociedade mais sã, mais sadia”, defendeu.
Quando à violência sexual contra menores, constatou que é “uma vergonha maior” no país que deve ser combatida “de forma muito agressiva”.
“Não haver nenhum tipo de tolerância em relação aos agressores e aos prevaricadores e, sobretudo, criar centros de emergência infantil para acudir as pessoas que tiverem necessidade”, apontou, pedindo igualmente trabalho social de empoderamento das famílias.
Também sugeriu uma melhoria das condições de transporte escolar, melhoria de presença das crianças nas escolas, combate à pobreza e outras formas de exclusão social.
De acordo com o relatório anual sobre a situação da Justiça, referente ao ano judicial 2020/2021, elaborado pelo Conselho Superior do Ministério Público (CSMP), transitaram para o atual ano judicial, iniciado em 31 de julho, um total de 2.025 processos de crimes de violência baseada no género.
Estes crimes abrangem, genericamente, a violência física, na família ou no namoro, a violência doméstica, psicológica, emocional ou sexual, sendo as mulheres as principais vítimas.
Ainda segundo o mesmo relatório, os crimes sexuais participados registaram uma descida no último ano, com a entrada de 461 queixas no MP (menos 21,5%), sendo 157 de abusos sexuais de crianças (-33) e 108 de agressão sexual (-22).
Ainda assim, encontram-se pendentes, a nível nacional, 1.053 processos referentes a crimes sexuais, menos 16,6% face a 2019/2020, e foram resolvidos 670 processos.
No ano passado, o país aprovou alterações no Código Penal e os crimes de abuso sexual de crianças passaram a ter penas agravadas, chegando aos 14 anos de prisão.