Os cientistas apresentaram esta quarta-feira na reunião no Infarmed uma ilustração com a estrutura tridimensional da proteína S que a variante Ómicron utiliza para se infiltrar nas células. É uma espécie de retrato-robô da nova linhagem do SARS-CoV-2 que, em conjunto com outros estudos efetuados “a velocidade relâmpago” no terreno, revelaram ao mundo as 11 principais características da nova variante — desde a maior transmissibilidade à menor gravidade da Covid-19.

A variante Ómicron tem muitíssimas mais mutações na proteína S, a que confere um aspeto coroado ao coronavírus, do que a variante Delta — sobretudo na região dessa mesma proteína que se liga às células humanas. É isso que justifica, pelo menos em parte, a maior transmissibilidade: as partículas virais da variante Ómicron têm muito mais afinidade com as células.

As mutações características da variante Ómicron também se concentram nas regiões da proteína S onde os anticorpos — tantos os induzidos pela vacina como pela imunidade natural — se costumavam ligar para neutralizar o vírus. As deformações provocadas por estas alterações são a segunda razão pela qual esta variante é mais transmissível.

A variante Ómicron multiplica-se cerca de 70 vezes mais rápido do que a variante Delta nas células das vias respiratórias superiores, como a garganta e a traqueia, mas 10 vezes mais lentamente nas células dos pulmões. A conclusão é dos cientistas da Universidade de Hong Kong, que expuseram um tecido que mimetizava o trato respiratório superior (vias respiratórias) e outro que imitava as células do trato respiratório inferior (pulmões) à variante selvagem do SARS-CoV-2, à Delta e à nova variante Ómicron. Isto justifica não só a menor severidade da doença, porque o pulmão é menos afetado, como também a maior transmissibilidade: afinal, é a partir do trato respiratório superior que se expelem os aerossóis responsável por transmitir o vírus de pessoa para pessoa.

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A menor afinidade da Ómicron com o pulmão humano está relacionada com umas proteínas específicas que existem nas células pulmonares, mas não nas células dos tecidos do trato respiratório superior, apurou a Universidade de Cambridge. Apesar de a nova variante ter mutações que lhe conferem uma ótima afinidade com as células das vias respiratórias, a afinidade com as proteínas específicas do pulmão é péssima. E é por isso que a Ómicron não consegue sequer ser tão severa como a Delta.

Apesar de todas estas diferenças entre as duas variantes, os dados recolhidos pelas autoridades de saúde em Portugal revelam que não há uma diferença significativa entre a carga viral desenvolvida pelos doentes infetados com a Ómiron e os doentes infetados com a Delta. A maior transmissibilidade, concluíram, não parece tanto estar relacionada com a quantidade de vírus expelidos por aerossóis, mas sim com a maior rapidez com que uma pessoa infetada se torna contagiosa com a maior capacidade de a nova variante para escapar ao sistema imunitário.

A menor severidade da Covid-19 provocada pela variante Ómicron foi provada também em modelos animais, num estudo conjunto dos Estados Unidos e do Japão em hamsters. Em comparação com as variantes Alfa e Beta, os cientistas concluíram que a Ómicron causava infeções menos severas, muitas vezes limitadas às vias respiratórias superiores — nariz, garganta e traqueia. E verificaram também que os hamsters infetados com a Ómicron desenvolviam menos problemas nos pulmões e havia uma menor taxa de morte.

O risco de internamento por causa de um agravamento da Covid-19 provocada pela variante Ómicron é cinco vezes inferior em relação à probabilidade de hospitalização perante uma infeção pela variante Delta, revelaram os dados que chegaram de África do Sul até 21 de dezembro. Mas, entre os casos internados, não parecia haver diferença na probabilidade de ver o quadro clínico a agravar-se entre os infetados com uma variante e a outra.

O risco de reinfeção com a variante Ómicron é dez vezes superior em relação ao que era com a variante Delta, segundo um estudo que chegou da Escócia.

Num estudo publicado esta semana nos Estados Unidos, o risco de recorrer a uma urgência hospitalar, ser internado, ser admitido numa unidade de cuidados intensivos ou de necessitar de ventilação mecânica foi sempre inferior em quem estava infetado com a variante Ómicron em comparação com os infetados com a variante Delta. E isto é válido para todos os grupos etários, embora os riscos sejam sempre superiores para as pessoas mais velhas do que para as mais jovens. A nova variante conduz ao internamento e às urgências hospitalares menos de metade dos casos em comparação com a variante Delta.

A efetividade vacinal da AstraZeneca/Universidade de Oxford e da Pfizer/BioNTech é inferior para a variante Ómicron do que a que foi estimada para a variante Delta, segundo os dados recolhidos até 31 de dezembro em Inglaterra. No entanto, o reforço vacinal aumenta esta efetividade, mesmo contra a variante Ómicron: depois dele, a efetividade contra a infeção varia entre os 40% e os 70% (dependendo da vacina tomada no esquema original e do tempo que decorreu desde a sua conclusão); e contra a hospitalização é de até 88%.

O risco de hospitalização com a variante Ómicron corresponde a 40% do risco relativamente à Delta e a 30% no caso de cuidados intensivos. Apesar de a eficácia vacinal ser inferior à registada contra a variante Delta, o reforço com a terceira dose pode elevar a proteção vacinal a níveis semelhantes. Por isso, espera-se uma elevada disseminação da doença, mas com um peso relativo da doença mais grave