A complicada situação económica que o Afeganistão atravessa desde a tomada de posse por parte dos talibãs está a levar muitos afegãos a tomarem medidas drásticas para conseguirem alimentar as suas famílias. Segundo conta a Associated Press, há mesmo quem arrisque as suas vidas vendendo um dos seus rins, enquanto outros ponderam vender os próprios filhos.

Após a subida dos talibãs ao poder, a comunidade internacional decidiu congelar os ativos do Afeganistão no estrangeiro e suspender todos os financiamentos em resposta ao novo regime. As consequências foram devastadoras, atingindo sobretudo os elementos mais frágeis da sociedade afegã, aos quais as ajudam raramente chegam.

Como lembra a Associated Press, grande parte do dinheiro angariado pelas Nações Unidas desde o início do ano, numa campanha lançada para ajudar os afegãos, foi usado para pagar trabalhadores essenciais, deixando de fora aqueles que passam maiores necessidades.

A dura realidade levou a que muitos optassem por vender os seus órgãos. Nasir Ahmad, urologia e cirurgião especializado em transplantes de rins na província ocidental de Herat, revelou à Associated Press que realizou 85 operações desde o início de 2022.

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Dependendo do tipo de sangue, um rim pode custar entre 1.700 a 3.500 euros. Já uma operação de transplante completa pode chegar aos 7 mil euros. Os dadores vêm na sua maioria de famílias pobres afetadas pela crise económica e não estão informados acerca dos riscos de tirar um dos rins, disse Nasir Ahmad.

Mir Ahmad, ancião da aldeia de Qudoosabd, no distrito de Kohsan na província de Herat, contou que muitas pessoas escolhem deixar o país não só porque temem pelas suas vidas, mas também devido à falta de emprego. Quando não o conseguem fazer, “voltam para casa e têm de pagar o dinheiro que pediram emprestado para as despesas de viagem”.

Sem outras alternativas, têm de vender os seus bens e os seus rins. “Algumas pessoas até decidem vender os seus filhos”, revelou Mir Ahmad.

A situação continuará a piorar ao longo de 2022. De acordo com um estudo do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (UNDP), divulgado em setembro do ano passado, até 97% da população afegã poderá ultrapassar o limitar da pobreza até meio de 2022 se nada for feito para combater a crise política e económica no Afeganistão. Em setembro, o UNDP estimava que a taxa de pobreza rondava os 72%.