O governo liderado pelo Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, ameaçou os pilares da democracia e continuou a desrespeitar recomendações científicas para prevenir a disseminação da Covid-19, denunciou, esta quinta-feira, a Human Rights Watch (HRW).

No 32.º relatório anual da organização, que faz um balanço sobre o cumprimento dos direitos humanos em mais de 100 países, destacou-se no capítulo sobre o Brasil que, no ano passado, Bolsonaro ameaçou a democracia ao “tentar minar a confiança no sistema eleitoral, a liberdade de expressão e a independência do judiciário”, mas frisou que as tentativas do governante acabaram repelidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

A organização não-governamental avaliou que o chefe de Estado brasileiro terá agido para intimidar o principal tribunal do país, que conduz quatro investigações sobre a sua conduta, incluindo se interferiu em nomeações da Polícia Federal a fim de promover os seus interesses pessoais, e se cometeu prevaricação em relação a um caso de suposta corrupção envolvendo a compra de vacinas para a Covid-19.

“O Presidente Bolsonaro tentou enfraquecer os pilares da democracia, atacando o judiciário e repetindo alegações infundadas de fraude eleitoral”, disse Maria Laura Canineu, diretora da Human Rights Watch no Brasil, num comunicado divulgado junto com o relatório anual.

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“Com a proximidade das eleições presidenciais de outubro, o Supremo Tribunal Federal, o Tribunal Superior Eleitoral, o Ministério Público Federal, o Congresso e outras instituições democráticas devem permanecer vigilantes e resistir a qualquer tentativa do Presidente Bolsonaro de negar aos brasileiros o direito de eleger os seus líderes”, acrescentou a especialista.

Sobre a saúde pública e o combate à pandemia, a organização não-governamental destacou que, até 7 de novembro de 2021, o Brasil registou 21 milhões de casos confirmados de Covid-19 e 609.447 óbitos — o segundo maior número de mortes no mundo em valores absolutos.

“O Presidente Bolsonaro continuou a desrespeitar recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e a promover medicamentos ineficazes contra a Covid-19”, frisou-se no relatório da HRW.

Atualmente, o Brasil contabiliza mais de 620 mil mortes e 22,5 milhões por Covid-19 confirmadas.

A ONG mencionou uma investigação parlamentar aberta na câmara alta sobre a crise sanitária causada pela pandemia, que constatou que o governo brasileiro e várias autoridades locais teriam falhado no fornecimento de oxigénio a hospitais no estado do Amazonas, levando a dezenas de mortes em janeiro de 2021.

A investigação, que pediu no seu relatório final o indiciamento de Bolsonaro pela alegada prática de nove crimes na pandemia e o indiciamento de mais de 80 pessoas ligadas a empresas e ao atual governo, também encontrou evidências de corrupção na compra de vacinas e outras falhas na resposta a pandemia.

No comunicado divulgado junto com o relatório 2022, a HRW destacou que Bolsonaro continuou a disseminar informações falsas sobre as vacinas contra a Covid-19, frisando que o seu governo fracassou na gestão do enorme impacto da pandemia na educação.

Fazendo uma síntese, a ONG destacou que, em 2021, o governo brasileiro “promoveu políticas contrárias aos direitos humanos em outras áreas, incluindo direitos dos povos indígenas, direitos das mulheres, direitos das pessoas com deficiência e liberdade de expressão. A letalidade policial atingiu um número recorde, enquanto o desflorestamento na Amazónia disparou para o nível mais alto desde 2006”.

Numa projeção para o ano de 2022, a HRW destacou que as eleições presidenciais e parlamentares marcadas para outubro “testarão a força da democracia brasileira diante das ameaças do Presidente Bolsonaro, um fervoroso defensor da brutal ditadura militar brasileira (1964-1985)”.

O comunicado e o relatório destacaram ameaças à liberdade de expressão mencionando que o governo brasileiro pediu abertura de investigações criminais contra pelo menos 17 críticos, inclusive usando a Lei de Segurança Nacional, criada na ditadura militar e revogada no ano passado.

“Embora muitos dos casos tenham sido arquivados, essas ações passam a mensagem de que criticar o Presidente pode resultar em perseguição”, destacou a HRW.

“O Presidente Bolsonaro também tem bloqueado veículos de imprensa [media], organizações da sociedade civil e outros utilizadores das suas contas nas redes sociais, contas estas que utiliza para compartilhar informações ou discutir assuntos de interesse público”, acrescentou.

Por fim, a HRW lembrou que embora o governo brasileiro tenha feito promessas de proteger a Amazónia em fóruns internacionais, terá implementado políticas para acelerar a sua destruição.

“Em resposta à grande indignação nacional e internacional, o governo Bolsonaro compromete-se a proteger a floresta, mas os dados oficiais mostram que essas promessas são vazias”, disse Canineu.

“O presidente Bolsonaro precisa mostrar resultados concretos na redução do desflorestamento e no combate à impunidade por crimes ambientais e atos de violência contra defensores da floresta”, concluiu a diretora da HRW Brasil.