A Deloitte foi acusada pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) por falhas no trabalho de auditoria feito na Portugal Telecom, em 2014 pelas contas de 2013, quando foi descoberto que a operadora tinha investidos quase mil milhões de euros em dívida da Rioforte, uma empresa do Grupo Espírito Santo. Essa dívida ficou, aliás, por reembolsar, tendo contribuído para uma reformulação do acordo com a Oi no âmbito da combinação de negócios de telecomunicações das duas empresas.

Segundo comunicação da CMVM, a Deloitte foi multada em 100 mil euros porque “não documentou adequadamente, nos papéis de trabalho/dossier de auditoria” em várias situações:

  • “na análise por si efetuada e os fundamentos da sua conclusão sobre a correção de informação divulgada em nota explicativa (respeitante a riscos com atividade de tesouraria) às demonstrações financeiras auditadas”;
  • “na análise por si efetuada e os fundamentos da sua conclusão sobre a adequada valorização (imparidade) de instrumentos financeiros de dívida relevados (como ativo) no balanço da entidade auditada”;
  • “na análise por si efetuada e os fundamentos da sua conclusão sobre a correção de informação divulgada em nota explicativa (respeitante a investimentos de curto prazo) às demonstrações financeiras auditadas”;
  • “na análise por si efetuada e os fundamentos da sua conclusão sobre a correção da informação divulgada em nota explicativa (respeitante a transações com partes relacionadas – acionistas) às demonstrações financeiras auditadas”.

E, segundo a CMVM, “não obteve prova apropriada e suficiente para suportar a sua conclusão quanto à informação divulgada em nota explicativa (respeitante a investimentos de curto prazo) às demonstrações financeiras auditadas”.

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Assim, “deliberou o Conselho de Administração da CMVM aplicar à arguida [Deloitte] uma coima única de 100 mil euros”. Na documentação da CMVM realça-se que foi requerida impugnação judicial desta decisão.

Em reação ao Observador, a Deloitte diz que “não concorda com os aspetos identificados no referido processo”, confirmando o recurso judicial da decisão. Para a auditora, “os aspetos identificados pela CMVM são de natureza técnica e dizem respeito, essencialmente, a procedimentos relacionados com a documentação do trabalho realizado, não colocando em causa o nosso relatório de auditoria”, garantindo ter feito o seu trabalho “com diligência, no respeito pelas normas de auditoria aplicáveis e na certeza de ter adotado, em cada circunstância, o seu melhor julgamento profissional atendendo à informação disponível à data”.

A Deloitte era a auditora da Portugal Telecom. A própria empresa, assim como administradores seus foram acusados pela CMVM por informação que considerou que “não era verdadeira, não era completa, não era clara e não era lícita”. Entre os acusados, nesse primeiro caso, estiveram Henrique Granadeiro, Zeinal Bava, Luís Pacheco de Melo e Amílcar Morais Pires. Nesse processo, também a Portugal Telecom (agora Pharol) foi condenada a coima de um milhão de euros, que ficou suspensa por três anos. Também suspensas ficaram as coimas de 150 mil euros casa a João Mello Franco, José Xavier de Basto e Mário Matos Gomes.

Neste caso, os ex-administradores condenados em primeira instância viram a Relação confirmar as penalizações.  Henrique Granadeiro teve uma coima de 420 mil euros, a Zeinal Bava de 310 mil euros, a Luís Pacheco de Melo de 300 mil euros e a Amílcar Morais Pires de 180.000 euros.

Agora foi a vez da própria auditora ser sancionada pela CMVM. A Pharol já tinha avançado sobre a auditora para uma ação judicial, depois também de ter avançado para tribunal contra os ex-gestores Henrique Granadeiro, Zeinal Bava, Luís Pacheco de Melo e Amílcar Morais Pires.

Pharol apresenta queixa contra Deloitte por investimento de 897 milhões no GES

Nessa altura, a Pharol comunicou ter intentado uma “ação de responsabilidade contra a Deloitte & Associados, SA, e outras entidades da rede Deloitte, por violação dos deveres contratuais, nomeadamente como auditor externo da Pharol, e que foram causa adequada dos prejuízos sofridos com as aplicações em instrumentos de dívida emitidos por sociedades integrantes do GES”.

A Portugal Telecom investiu, em 2014, um total de 897 milhões de euros em papel comercial da Rioforte, considerando a CMVM que não foi prestada a informação total sobre essa exposição aos investidores.

No âmbito da sua ação de fiscalização aos auditores, a CMVM já tinha condenado a KPMG pelo processo de auditoria ao BES, caso que já chegou à Relação que, em dezembro, manteve a condenação à auditora de 450 mil euros, valor fixado no tribunal de primeira instância, depois da CMVM ter condenado a um milhão de euros. Em relação ao BES, ainda recentemente a CMVM condenou ex-administradores do banco e a própria instituição financeira por informação errada no prospeto do aumento de capital.

Salgado e administradores do BES novamente condenados pela CMVM com coima e inibição de exercício profissional