Um surto de peste suína africana está a espalhar-se pela Europa e a Federação Portuguesa de Associações de Suinicultures diz que é uma questão de tempo até chegar a Portugal. Itália e a Macedónia do Norte foram os últimos países a notificarem casos desta doença, mas ela já foi detetada na Alemanha, Polónia, Eslováquia, Bulgária, Roménia, Estónia, Letónia, Hungria e Lituânia. Casos isolados já têm surgido nos últimos anos na Europa, mas a disseminação está “a agravar-se” e a espalhar-se pelo continente, tendencialmente de sudeste para sudoeste.
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De acordo com a federação, o primeiro caso italiano — o mais recente na proximidade geográfica de Portugal — foi detetado num javali selvagem na região do Piemonte. O animal foi encontrado em Ovada, província de Alexandria, a 30 quilómetros a noroeste de Génova, e testou positivo à infeção pelo vírus desta peste num teste realizado pelo Centro Nacional de Referência para a Peste Suína (Cerep) do Instituto Experimental Zooprofilático da Úmbria e Marche.
Desconfia-se que o javali estivesse infetado por uma variante do vírus que não é endémica em Itália (há 23 genótipos conhecidos deste agente infeccioso). Mas não se sabe como é que chegou ali: o surto ativo mais próximo ficava a 800 quilómetros dali, na Alemanha, pelo que as autoridades acreditam que o vírus foi transportado por humanos, para quem o agente patogénico não representa qualquer perigo para a saúde.
Desde então, outros dois casos foram detetados em Itália. A Federação Portuguesa de Associações de Suinicultures acredita, por isso, que “o risco de disseminação da peste suína africana à área mediterrânea da Europa é iminente”. Num comunicado publicado a 18 de janeiro, a federação sugere mesmo a diminuição ou mesmo suspensão da importação de animais vivos, carne e produtos de carne durante os próximos meses até conhecer o desenvolvimento e evolução da doença.
No último boletim informativo da Direção-Geral da Alimentação e Veterinária (DGAV), entidade tutelada pelo Ministério da Agricultura, só este ano até 10 de janeiro foram detetados 319 surtos em javalis e 13 em suínos na União Europeia. Ao longo do ano passado, houve 12.076 focos em javalis e 1.826 em porcos domésticos. Portugal ainda não tinha sido afetado até dia 10: desde 15 de novembro de 1999 que não se regista qualquer surto de peste suína africana em território nacional.
Ainda assim, a DGAV indica que a situação “continua a agravar-se devido à disseminação da doença a novas áreas livres” — a América, por exemplo, detetou casos em 2021 pela primeira vez em quatro décadas — e que o número de surtos é “elevado”. Por isso, solicitou a qualquer pessoa que lida com estes animais “para que sejam reforçadas as medidas preventivas”.
A peste suína africana é causada por um vírus altamente transmissível que infeta porcos e javalis através de fluidos corporais (sangue, urina, fezes, secreções nasais, oculares e genitais), alimentação com resto de comida contaminada, carraças moles infetadas ou materiais de exploração suína contaminados. Embora não haja indícios de transmissão destes animais para os humanos, os surtos afetam o comércio suíno e comprometem a economia no ramo, alerta a DGAV.
Os primeiros sintomas da doença surgem três dias a duas semanas após a infeção — quanto mais grave forem, mais cedo surgem. Os animais exibem febres altas (superior a 40ºC), aumento da pulsação e da frequência respiratória, apatia, falta de apetite, vermelhidão na pele, vómitos e diarreias; e corrimentos nasais e oculares.
Em casos de agravamento, os porcos exibem descoordenação motora nos últimos dois dias antes da morte — que ocorre seis a 20 dias após a infeção — e as fêmeas sofrem abortos. Na forma mais extrema, os suínos morrem subitamente com poucos sinais da doença. Entre os porcos e javalis domésticos, a mortalidade pode mesmo alcançar os 100% e aqueles que sobrevivem ficam portadores do vírus durante toda a vida.
Os sintomas da peste suína africana, para a qual não há tratamento nem vacina, podem ser confundidos com os de doenças que também provocam infeções generalizados do organismo (septicémias). Só mesmo uma análise laboratorial pode confirmar o diagnóstico, mas qualquer suspeita tem obrigatoriamente de ser notificada à DGAV. E quem encontrar algum porco ou javali morto também tem de avisar o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).
Esta doença já é endémica em muitos países africanos abaixo do deserto do Sahara. Mas, após ser encontrada desde 2007 em alguns países europeus (o primeiro foi a Geórgia), foi introduzida na União Europeia em 2014 e na Ásia em 2018, ano em que também a Hungria, Bulgária e Bélgica (que teve o último surto ativo em março de 2020). Há dois anos, entrou na Oceânia em suínos na Papua-Nova Guiné; e em 2021 foi detetada na República Dominicana e Haiti.