Tanto a Amnistia Internacional como a Human Rights Watch dizem ter provas de que a Rússia está a cometer crimes de guerra na Ucrânia. O principal motivo apontado pelas duas associações de defesa dos direitos humanos é o tipo de armamento que está a ser usado pelos militares russos: bombas de estilhaços e bombas de vácuo. Por enquanto, as provas apresentadas dizem respeito apenas às primeiras, mas teme-se que, depois de Vladimir Putin ter anunciado que tinha o seu arsenal nuclear em alerta máximo, também as bombas de vácuo cheguem ao terreno.
Se tal se vier a verificar, a Rússia pode ser julgada por crimes de guerra. Esta segunda-feira, o procurador-geral do Tribunal Penal Internacional (TPI) anunciou que “existe uma base razoável” para que o país liderado por Putin seja acusado de presumíveis crimes de guerra e crimes contra a humanidade.
Na sexta-feira, tinha sido o ministro dos Negócios Estrangeiros da Ucrânia a avisar que o país estava a recolher provas para os enviar para o TPI. “Os ataques russos contra um jardim infantil e um orfanato são crimes de guerra e violações do Estatuto de Roma”, tratado que estabeleceu o TPI, escreveu Dmytro Kuleba no Twitter.
Ao final da noite de segunda-feira, anunciou na mesma rede ter enviado um pedido formal ao tribunal para que aja sobre a Rússia. “À luz da extraordinária urgência da situação, pedimos respeitosamente ao Tribunal Penal Internacional que realize uma audiência sobre o pedido da Ucrânia o mais rápido possível e instamos a Rússia a interromper imediatamente todas as atividades militares na Ucrânia.”
In light of the extraordinary urgency of the situation, we respectfully ask the International Court of Justice to hold a hearing on Ukraine’s request as soon as possible and call upon Russia to immediately halt all military activity in Ukraine. pic.twitter.com/XBha7KIMcp
— Dmytro Kuleba (@DmytroKuleba) February 28, 2022
Bombas de fragmentação
Sobre o uso deste tipo de armas, que por si só, já valeriam à Rússia uma acusação de crimes de guerra, é do que alegadamente há provas. Um dos grandes problemas das bombas de fragmentação é que não se sabe ao certo o que vão atingir e, como o nome indica, lançam fragmentos — estilhaços — por todo o lado. Esses pequenos explosivos não detonam imediatamente e acabam por poder funcionar como minas antipessoais.
Um especialista da Human Rights Watch disse não ter dúvidas de que é isso que está em causa. Para Mark Hiznay, vice-diretor do departamento de armas daquela ONG, as imagens que viu do ataque a Kharkiv são prova disso mesmo. E concretizou: a Rússia terá usado rockets Smerch com munições de fragmentação para atingir zonas residenciais. “Este ataque mostra claramente a natureza indiscriminada das munições de fragmentação, e deve ser condenado”, disse numa entrevista ao Washington Post.
A Amnistia Internacional apontou o dedo ao mesmo: as bombas de fragmentação mataram civis ucranianos e pediu, esta segunda-feira, a abertura de uma investigação por crime de guerra. Antes disso, já tinha alertado que ataques a hospitais ou infantários não devem acontecer, segundo as regras do direito internacional. “Alguns destes ataques podem ser crimes de guerra”, acusou a secretária-geral da Amnistia Internacional, Agnès Callamard, condenando a Rússia por afirmar que está a levar a cabo ataques de precisão, quando não é verdade.
Nas redes sociais, a mesma acusação foi feita pelo presidente da Polónia. “Acabei de falar com o presidente Zelensky sobre a guerra na Ucrânia. Foguetes e mísseis russos, incluindo bombas de fragmentação proibidas internacionalmente, estão a cair em bairros residenciais de Kiev, Kharkiv e outras cidades”, escreveu Andrzej Duda. “A situação é difícil, mas a Ucrânia é corajosa.”
I’ve just talked with President @ZelenskyyUa about the war in Ukraine. Russian rockets and missiles, including the internationally banned cluster bombs, are dropping on residential quarters of Kiev, Kharkiv and other cities. The situation is difficult but Ukraine is brave! ????????????????????
— Andrzej Duda (@AndrzejDuda) February 28, 2022
Apesar de as bombas de fragmentação terem sido proibidas por uma resolução das Nações Unidas de 2008, assinada por 110 estados, nem a Ucrânia, nem a Rússia a ratificaram. Dentro de cada bomba existem centenas de outras, mais pequenas, que se dispersam por um longo perímetro. É esse efeito que as torna em minas antipessoais, banidas em 1997 pela Convenção de Otava.
Segundo a organização Handicap International, mais de 100 mil pessoas morreram ou ficaram mutiladas na explosão deste tipo de bombas desde 1965: 98% terão sido civis e, entre eles, mais de um quarto crianças.
Bombas de vácuo
Têm vários nomes: armas termobáricas, bombas de vácuo e são conhecidas como “Father of All Bombs” (pai de todas as bombas). Não há provas de que estejam a ser usadas contra a Ucrânia, mas é sabido que a Rússia as tem e que têm um enorme poder de destruição. E como funcionam? O explosivo interno usa o oxigénio do ar à sua volta para gerar uma explosão de elevada potência. Além disso, cria uma onda de explosão e as temperaturas que atinge são suficientes para esmagar órgãos internos.
Existem relatos na imprensa internacional de que o Solntsepek, o lançador de foguetes termobáricos que foi utilizado na guerra do Afeganistão, foi deslocado para a Ucrânia. Faltam as provas.