Duas em cada três pessoas com crédito à habitação em Portugal só vão terminar de pagar esses empréstimos depois dos 70 anos – aliás, cerca de 25% dos créditos à habitação existentes em Portugal têm termo previsto quando os clientes já terão 75 anos ou mais. Isto é um “risco para o sistema financeiro” português, avisa o Banco de Portugal, que a partir desta sexta-feira vai apertar os critérios de idade para a concessão de novos créditos à habitação.

“Atendendo ao envelhecimento da população portuguesa e à redução significativa do rendimento dos mutuários na passagem da vida ativa para uma situação de reforma, não obstante a redução de despesas que poderá ocorrer, a elevada concentração de empréstimos em mutuários com idade superior a 70 anos no termo do empréstimo poderá constituir um risco para o sistema financeiro“, diz o Banco de Portugal num relatório em que faz o acompanhamento anual da medida (macroprudencial) anunciada em 2018 e que, entre outras medidas, limitou a 90% o financiamento máximo dado pelos bancos, em relação ao valor do imóvel.

A divulgação deste relatório surge na véspera de entrar em vigor uma outra medida macroprudencial, uma revisão que foi anunciada em janeiro e que começa a ter efeito a 1 de abril. A partir desta sexta-feira, os bancos têm de ter mais em conta a idade de quem contrata o crédito – aplicando-se maturidades máximas nos seguintes termos:

  • Máximo de 40 anos para mutuários com idade inferior ou igual a 30 anos — sem alterações;
  • No máximo, 37 anos no crédito para clientes com idade superior a 30 anos e inferior ou igual a 35 anos;
  • Prazo máximo de 35 anos para mutuários com idade superior a 35 anos no início da operação.

Esta mudança nas maturidades máximas, conforme a idade dos clientes, foi decidida porque o Banco de Portugal constatou que estava a haver um desvio cada vez maior em relação ao prazo de referência. “A maturidade média das novas operações de crédito à habitação fixou-se, em dezembro de 2021, em cerca de 32,5 anos, permanecendo significativamente acima de 30 anos, limiar a atingir no final de 2022″, nota o Banco de Portugal em comunicado de imprensa divulgado esta quinta-feira.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

O Banco de Portugal decidiu tomar medidas para precaver riscos e porque a maturidade média dos créditos à habitação no país “apresenta valores elevados no contexto da UE”. “Em 2021, a maturidade média das novas operações de crédito à habitação em Portugal situou-se em torno de 33 anos, acima dos países da UE para os quais existe informação disponível, cuja maturidade média oscilava entre 20 e 27 anos”, nota o Banco de Portugal, avisando que “maturidades mais elevadas diminuem a flexibilidade de reestruturação de créditos para mutuários em dificuldades financeiras, para além de facilitarem o aumento do endividamento“.

A preocupação do supervisor financeiro vem no contexto das conclusões de um relatório recente que indicou que já a partir da próxima década vai acelerar a discrepância entre os últimos rendimentos do trabalho e as pensões de reforma dos portugueses que se aposentem. Quem o fizer, por exemplo, em 2040, poderá ter de passar a viver com pouco mais de metade do salário que estava habituado a ter. E quem se reformar em 2045 já terá direito a menos de metade.

O alerta foi feito recentemente no relatório “The 2021 Ageing Report” – disponível nesta ligação –, um estudo que, a cada três anos, analisa a evolução demográfica e confronta-a com a sustentabilidade dos sistemas nacionais de pensões.

Reformas pela metade? O que pode fazer para acautelar o seu futuro

A nova recomendação aplica-se a novos créditos, o que inclui transferências de créditos (existentes) para outras instituições bancárias, mas não se aplica a renegociações de créditos, por exemplo, devido a dificuldades financeiras dos mutuários.

Taxa fixa no crédito será boa aposta para evitar “surpresas” com Euribor em alta?