O bastonário da Ordem dos Advogados (OA) rebateu esta segunda-feira as críticas às possíveis consequências do acórdão do Tribunal Constitucional (TC) sobre o uso de metadados e lembrou que a investigação criminal tem de respeitar a Constituição.

A investigação criminal não pode atuar à margem da Constituição e do Estado de Direito, havendo naturalmente que garantir que a recolha da prova decorre nos termos constitucionais. E para isso as decisões dos tribunais devem ser respeitadas, especialmente aquelas que surgem em defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos”, afirmou Luís Menezes Leitão em resposta à agência Lusa.

O bastonário da OA salientou a declaração de inconstitucionalidade, “com força obrigatória geral”, da norma relativa à transmissão de dados armazenados às autoridades competentes para investigação, deteção e repressão de crimes graves, na parte em que não prevê uma notificação ao visado de que os dados foram acedidos pelas autoridades, a partir do momento em que tal comunicação não comprometa as investigações, a vida ou a integridade física de terceiros.

“A eventual afetação de processos penais é um imperativo da própria Constituição, que determina expressamente (…) que são nulas todas as provas obtidas mediante tortura, coação, ofensa da integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações, como eventualmente terá ocorrido”, considerou.

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Menezes Leitão destacou também a importância da intervenção da Provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral, que esteve na origem do pedido de inconstitucionalidade desta matéria, face ao entendimento expresso pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, em 2014, que já então alertou que a lei em causa representava uma violação da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

“A declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral foi solicitada pela senhora Provedora de Justiça que considerou corretamente existir violação da Constituição nesses preceitos legais, sendo que lhe compete precisamente fiscalizar o cumprimento da Constituição”, observou o bastonário.

O TC anunciou a 27 de abril ter declarado inconstitucionais as normas da chamada “lei dos metadados” que determinam a conservação dos dados de tráfego e localização das comunicações pelo período de um ano, visando a sua eventual utilização na investigação criminal.

Tribunal Constitucional chumba normas da “lei dos metadados”

Num acórdão proferido no dia 19, o TC entendeu que guardar os dados de tráfego e localização de todas as pessoas, de forma generalizada, “restringe de modo desproporcionado os direitos à reserva da intimidade da vida privada e à autodeterminação informativa”.

O possível impacto desta decisão nos processos com recurso a metadados na investigação criminal desde 2008 está já a ser questionado por diferentes agentes do setor judiciário e foi inclusivamente comentado pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que sublinhou a posição “muito firme” dos juízes do TC.

“O problema é o seguinte, o Tribunal Constitucional entende que a Constituição é muito fechada. Quando ela foi aprovada era muito fechada e muito restritiva e, portanto, tem mantido em sucessivas decisões uma posição muito firme que é não permitir uma lei que dê o acesso aos chamados metadados para efeitos de investigação criminal internacional”, disse Marcelo Rebelo de Sousa.