As armas só são secretas até que alguém deixe escapar os seus segredos e, neste caso, foi o próprio Kremlin quem divulgou à imprensa informações sobre o armamento a laser que, garante, já está a usar na Ucrânia. O sistema Peresvet, apresentado em 2018 pelo próprio Vladimir Putin, pode cegar satélites — como aqueles que os Estados Unidos usaram para ter acesso à localização de militares russos e, em seguida, cederam à Ucrânia — enquanto que a Zadira destrói veículos aéreos não tripulados (UAV), como os drones turcos Bayraktar, que o exército de Volodymyr Zelensky tem usado para destruir navios e tanques russos.

Em comum, têm o facto de ambos recorrerem à tecnologia laser.

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O Presidente ucraniano não acredita nas palavras de Yury Borisov, membro do Kremlin e responsável pelo desenvolvimento militar russo, e ridicularizou o uso de armas a laser, anunciado na quarta-feira, numa conferência de imprensa em Moscovo.

Zelensky comparou as declarações de Borisov à propaganda nazi, alegando que a Rússia procura a wunderwaffe, a arma maravilha. “Aqui estamos, no terceiro mês de guerra total, e a Rússia ainda está a tentar encontrar a sua arma maravilha. Alegadamente a laser. E isto claramente indica o falhanço completo da invasão”, desdenhou o Presidente da Ucrânia.

Verdade ou ficção? Mesmo que não haja provas de que os dois sistemas estão a ser usados na guerra, como indicou o Pentágono, há alguns detalhes que são conhecidos.

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Peresvet: o laser que cega satélites

No princípio, não tinha nome. Quando Vladimir Putin apresentou um grupo de novas armas russas, em 2018, pouco antes de ser reeleito Presidente, o sistema terrestre de laser era apenas isso. Após consulta popular, altura em que os russos puderam escolher os nomes do novo armamento, o sistema passou a chamar-se Peresvet. Não é um nome qualquer: é o de um monge ortodoxo que teve um papel fundamental na Batalha de Kulikovo, em 1380, na qual os russos venceram tártaros e mongóis, apesar de o seu exército ser mais pequeno.

Ao contrário de Zadira, do Peresvet há imagens. Na altura, o Ministério da Defesa russo divulgou um vídeo com o então novíssimo sistema, onde se via o equipamento branco a girar rapidamente, em várias direções, sinal da sua capacidade de apanhar alvos em movimento.

[Vídeo divulgado pelo Ministério da Defesa da Rússia]

“Alcançamos um progresso significativo em armas a laser. Não é mais apenas um conceito ou um plano. Não está sequer nos estágios iniciais de produção. Desde o ano passado, as nossas tropas estão armadas com armas a laser. Não quero revelar mais detalhes. Ainda não é a hora. Mas os especialistas entenderão que, com esse armamento, a capacidade de defesa da Rússia se multiplicou”, disse Putin, em 2018, durante o discurso do Estado da Nação.

Nessa altura, também foi revelado que os militares que iam operar o sistema seriam treinados na Academia Espacial Militar Mozhaiskiy, em São Petersburgo, mostrando que a nova arma teria algum ligação ao espaço. Na quarta-feira, Borisov foi claro: o Peresvet consegue cegar satélites de reconhecimento a 1.500 quilómetros de distância da terra.

A 4 de maio deste ano, o New York Times revelava uma das ajudas que os Estados Unidos têm prestado à Ucrânia. Os serviços secretos usam o seu sistema de satélites pata localizar as posições dos militares russos no cenário de guerra e transmitem essa informação aos ucranianos. Graças a essa partilha, a Ucrânia conseguiu abater vários generais russos.

Embora os detalhes sejam pouco, o que a maioria dos analistas acredita é que o Peresvet pode danificar os sistemas óticos de aeronaves, drones, mísseis de cruzeiro ou de satélites. E, se estes últimos ficarem cegos, o adversário não tem qualquer hipótese de seguir as posições russas.

[Uma das imagens do Peresvet que tem sido partilhada no Twitter]

Zadira: a destruidora de drones Bayraktar

“Se o Peresvet cega, a nova geração de armas a laser destrói fisicamente o alvo. Queima-o.” Foi assim que Yury Borisov descreveu Zadira, a irmã mais velha de Peresvet. O seu nome, numa tradução livre, tem significado semelhante ao de bully.

O sistema de Zadira, segundo o vice primeiro-ministro russo, é “mais avançado” do que o do Peresvet e pode derrubar facilmente vários tipos de veículos aéreos não tripulados (UAV), “evitando o gasto de mísseis caros como Pantsyr e Tor”.

Entre os seus principais alvos estarão os drones Bayraktar, armas turcas que os ucranianos têm usado para abater um grande número de tanques russos e que já ganharam o direito a uma música, viral nas redes sociais. Estes drones terão feito parte do ataque ao cruzador russo Moskva, que acabou por afundar-se.

De Zadira não se conhecem imagens e, até agora, o que se sabe é apenas a informação que Borisov quis partilhar: o sistema é capaz de incinerar alvos até cinco quilómetros de distância em apenas cinco segundos.

Ao Washington Post, um general australiano na reserva, Mick Ryan, afirmou que armas deste género podem derrubar drones de reconhecimento, mas também podem ser usados para cegar soldados, algo que o direito internacional proíbe. Apesar disso, aconselhou prudência já que não há provas de que a Zadira seja real e a Rússia tem tentado impressionar o Ocidente com sua suposta superioridade militar.

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No entanto, diz, essa estratégia não tem funcionado. “É improvável que funcione com um sistema de laser experimental, do qual ainda não há provas de que seja capaz de trabalhar”, ressalvou Mick Ryan.

Borisov garantiu que os dois sistemas já estão no terreno e a ser usados na Ucrânia. “Já começaram a chegar ao exército”, disse na quarta-feira.

Para além dos sistemas de laser, a Rússia também enviou para o campo de batalha veículos de combate de apoio a tanques BMPT — os Terminator.  Equipados com quatro lança mísseis anti-tanque, dois canhões de 30 milímetros, dois lança-granadas e uma metralhadora, a velocidade máxima do “Terminator” é de 36 quilómetros por hora e, de acordo com o The Times, o exército russo já o usou na Síria. É capaz de destruir tanques, helicópteros e aeronaves que estejam a voar a baixas altitudes.

Em Severodonetsk, já foram vistos a patrulhar as ruas.