O objectivo é apenas um, mas polariza posições: para que a Europa atinja, em 2050, a neutralidade carbónica é necessário ir apertando a malha sobre as emissões de dióxido de carbono (CO2) emitidas para a atmosfera. Isso levou a União Europeia (UE) a traçar o “Fit for 55”, um pacote de reformas climáticas que visa baixar as emissões dos veículos ligeiros de passageiros e de mercadorias em 55% até 2030. A meta tem por base os valores de 1990, mas nem isso acalmou as hostes para os lados dos países mais dependentes da octanagem, apoiados por uma forte indústria automóvel. Isto porque, cinco anos depois dessa redução, a proposta visa acabar liminarmente com a comercialização de novos modelos equipados com motor a gasolina ou a gasóleo, o que significa dizer “adeus” de uma só vez também aos veículos híbridos, sejam eles convencionais (HEV), ligeiramente electrificados (MHEV) ou híbridos plug-in (PHEV).
Depois de uma intensa negociação no Parlamento Europeu, em que havia a “esperança” que os decisores políticos suavizassem a “morte” dos motores de combustão, ficou praticamente tudo na mesma. Com 339 votos a favor, 249 contra e 24 abstenções, na passada quarta-feira, o PE mostrou-se pouco sensível a pressões externas, nomeadamente por parte da associação automóvel alemã VDA, que instou os legisladores a acabar com a meta de 2035 por, segundo a VDA, ser muito cedo para avançar para um compromisso com um horizonte de mais de uma década pela frente quando, neste momento, é incerto como decorrerá a implantação da rede de recarga. Outro dos argumentos da VDA era que a decisão de banir os veículos com motor de combustão em 2035 penalizaria os combustíveis alternativos de baixo carbono, apontados como uma possível escapatória para manter os motores térmicos. Daí que o Partido Popular Europeu tenha proposto ao plenário uma emenda alternativa, em que em 2035, a meta de redução de emissões deveria baixar para 90%, ao invés dos 100% originalmente previstos. Mas também essa margem de 10%, que permitiria prolongar o prazo de validade dos motores de combustão, que ficariam sem uma data definida para o seu fim, foi rejeitada.
Basicamente, o texto final aprovado permanece fiel ao que foi decidido em Julho passado, sem que as alterações solicitadas tivessem sido aceites. A versão aprovada reafirma as metas intermédias propostas por Bruxelas (redução de 15% das emissões dos automóveis até 2025 e 55% em 2030) e o fim, em 2035, da comercialização de veículos ligeiros equipados com motor de combustão. A única concessão vai para os fabricantes de baixo volume, isto é, com vendas entre 1000 e 10.000 unidades/ano. De acordo com a AFP, nesse caso, os construtores beneficiam de uma derrogação que lhes permite usar motores de combustão até 2036.
Recorda a Reuters, com base nos dados fornecidos pela Associação Europeia de Construtores de Automóveis (ACEA), que os veículos 100% eléctricos e híbridos plug-in reclamaram 18% das novas matrículas de veículos ligeiros de passageiros na UE em 2021, sendo que o sector dos transportes é responsável por um quarto das emissões com efeito de estufa na Europa e os automóveis, em concreto, representam pelo menos 12% das emissões de CO2 na UE.
Apesar das pressões por parte dos construtores de automóveis para “enfraquecer” a meta de emissões, nomeadamente italianos e alemães (ambos escudados pelo argumento que tal decisão colocará em risco milhares de postos de trabalho), houve também fabricantes que publicamente se colocaram ao lado da determinação da UE em acabar com os veículos que queimam combustíveis fósseis, caso da Volvo e da Ford. Convém ainda recordar que muitas outras marcas decidiram antecipar-se à proibição prevista para 2035 e apontam 2030 como o ano em que serão exclusivamente eléctricas na Europa.
Dado mais este passo para acelerar a mudança da Europa para veículos eléctricos e para “incentivar” os construtores a apostarem fortemente na electrificação, resta aguardar pela lei final. A 28 de Junho, o Conselho do Meio Ambiente da UE reúne para acertar a posição dos diferentes membros, sendo possível que em Outubro o processo esteja concluído e então, aí sim, se confirme a extinção dos motores de combustão nos novos veículos ligeiros na Europa.