O Banco de Portugal reviu em alta a projeção de crescimento económico em 2022 para 6,3%, um crescimento elevado que beneficia muito de um efeito técnico relacionado com o ímpeto positivo trazido de 2021 – esse efeito será decisivo porque, como o Banco de Portugal prevê, nos próximos trimestres poderá haver uma “estagnação, em média”, da expansão económica de trimestre para trimestre. A partir de 2023, por outro lado, o crescimento será menor do que o previsto anteriormente (2,6% em 2023 e 2% em 2024).

Já “a inflação deverá aumentar para 5,9% em 2022, reduzindo-se para 2,7% e 2,0% nos dois anos seguintes”, antecipa o Banco de Portugal, confirmando que a subida dos preços será mais intensa do que o “cenário adverso” que tinha previsto em março. “Este perfil reflete a evolução das pressões externas sobre os preços. Ao longo do horizonte de projeção, estas vão-se dissipando, sendo parcialmente compensadas por um aumento das pressões internas”, afirma o supervisor.

Porém, a previsão do Banco de Portugal, de uma inflação de 5,9%, baseia-se em dados até 17 de maio. Desde então, reconheceu Mário Centeno esta quarta-feira, com os dados da inflação de maio e com outros indicadores que entretanto surgiram, é possível fazer uma estimativa “mecânica” que eleva a taxa de inflação em mais 0,5 pontos percentuais, para 6,4%.

O agravamento do enquadramento internacional condiciona a evolução da atividade. A economia portuguesa sofre impactos, diretos e indiretos, da invasão da Ucrânia, que resulta no aumento da incerteza, em maiores taxas de inflação e no acentuar das disrupções nas cadeias de produção globais”, diz o Banco de Portugal.

As novas previsões do Banco de Portugal contrastam com aquilo que foi projetado em março, quando se apontou para um crescimento de 4,9% em 2022 (depois de 4,9% em 2021) e um aumento de 2,9% do produto económico, em 2023. Nessa altura, o Banco de Portugal também projetou uma taxa de inflação de 4% em 2022 (com um cenário adverso de 5,6%) e de 1,6% em 2023.

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Fonte: Banco de Portugal

“É um risco que não pode excluir-se” uma “normalização mais rápida” da política monetária

Mário Centeno reconheceu que “é um risco que não pode excluir-se” a possibilidade de haver uma “normalização mais rápida” da política monetária, em relação ao que se previa. Esse foi um processo que foi decidido já em dezembro de 2021, altura em que o BCE anunciou que após terminar o período de compras líquidas do Programa de Compras de Emergência Pandémica (PEPP) “estaria disponível para, utilizando os reinvestimentos, com flexibilidade, acomodar e responder a eventos que pudessem resultar da materialização de riscos de fragmentação na área do euro”.

A declaração surge no dia em que o BCE teve uma reunião de emergência onde foi anunciado que irá “acelerar-se” a preparação de um “novo instrumento” para contrariar a subida das taxas de juro.

Sem levantar o véu sobre que novo instrumento pode ser esse, Centeno disse que “estes instrumentos são instrumentos que existem para prevenir escalada de taxas, além daquilo que os fundamentos fariam antecipar” e “funcionam quase como seguros, a sua existência proporciona indicações ao mercado daquilo que é a disponibilidade do BCE para atuar”.

Questionado pelo Observador na conferência de imprensa, Centeno recusou-se a revelar mais detalhes. “Essa informação ainda está a ser trabalhada. A seu tempo vamos falar sobre essa matéria”, afirmou o governador do Banco de Portugal, sublinhando que “tem de se tomar em conta também os desenvolvimentos do mercado”.

BCE “acelera” preparação de novo instrumento contra a subida dos juros soberanos

A disposição e a vontade do eurossistema de preservar os mecanismos de transmissão vai estar presente, sempre esteve, e não vai haver qualquer hesitação em atuar”, afirmou Mário Centeno.

“Não há neste momento nenhuma evidência material de desancoragem da inflação no médio prazo e é para o médio prazo que a política monetária trabalha”, concluiu o governador do Banco de Portugal.

Consumo privado aumenta 5,2% em 2022, à custa da poupança acumulada na pandemia

Esta quarta-feira, o Banco de Portugal estimou que o consumo privado deverá aumentar 5,2% em 2022, um movimento que irá corresponder a uma “redução da poupança corrente, desacelerando em 2023-24 para uma evolução mais alinhada com a do rendimento disponível real, que se reduz 0,4% em 2022 e cresce 1,5% em média nos dois anos seguintes”.

Já o investimento irá manter um “crescimento de 6% em média em 2022-24, próximo do observado em 2021, em larga medida refletindo os recebimentos de fundos europeus”, acrescenta o Banco de Portugal.

Por outro lado, “as exportações crescem 13,4% em 2022, desacelerando gradualmente para um ritmo próximo do pré-pandemia em 2024”. “Este perfil é determinado pela recuperação das exportações de serviços, projetando-se que o turismo regresse ao nível pré-pandémico em meados de 2022”, afirma o Banco de Portugal.

O crescimento do emprego abranda ao longo do horizonte de projeção. A taxa de desemprego diminui para 5,6% em 2022 e 5,4% nos anos seguintes. Os salários reais por trabalhador no setor privado reduzem-se 1% em 2022, refletindo a subida da inflação, mas aumentam, em média, 2% em 2023-24, aproximadamente em linha com a produtividade”, diz o supervisor.

O Banco de Portugal reconhece que as previsões têm “riscos descendentes” para a atividade económica e riscos “ascendentes” para a inflação, em particular no ano de 2022. “A possibilidade de agravamento do impacto da invasão da Ucrânia constitui o principal foco de incerteza e riscos”, admite o supervisor.

Que resposta se deve dar, perante esta incerteza? “O aumento continuado das qualificações da força de trabalho é essencial num contexto demográfico desfavorável e de transformação tecnológica orientada para a digitalização”, diz o Banco de Portugal, acrescentando que “uma implementação efetiva dos investimentos e reformas subjacentes ao Plano de Recuperação e Resiliência permitirá ganhos adicionais de crescimento a longo prazo”.

O Banco de Portugal já tinha antecipado uma parte deste boletim económico, um tema em destaque onde analisou o possível impacto do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).

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