Uma guerra aberta contra os fundos de investimento que compravam ou detinham percentagens de passes de jogadores, a luta que levou a um corte de relações entre Sporting e FC Porto tendo a venda conjunta de James Rodríguez e João Moutinho para o Mónaco como ponto alto de contestação, a batalha para que a arbitragem contasse com ajuda da tecnologia, uma viragem de alvo para o outro lado da 2.ª Circular então a visar o rival Benfica. Desde que assumiu a liderança dos leões em 2013, Bruno de Carvalho foi abrindo várias frentes de ataque em diferentes latitudes. Uma delas, neste caso olhando para o que era a história, apontava para uma contabilidade alegadamente incorreta do número de títulos do conjunto verde e branco e de muitos outros clubes. Esta quarta-feira, esse assunto ficará em definitivo encerrado.

Sporting festejou último Campeonato como se fossem cinco mas vai perder a guerra: os dois pareceres entregues à Federação

Das críticas do então líder leonino à Federação até à petição assinada por quase 4.500 proponentes que levou o tema ao Parlamento, passando pela criação da Comissão Independente para a Análise dos Títulos Nacionais (CIATN) ou pelo parecer entregue pela formação de Alvalade então já presidida por Frederico Varandas à Federação, foram-se sucedendo os capítulos que mantinham toda a discussão a um nível meramente opinativo ou académico. Agora, em Assembleia Geral Extraordinária da FPF, são os próprios associados da Federação a votar os pareceres que serão levados a sufrágio, inicialmente dois que entretanto passaram a três e que no final podem abrir espaço ainda a uma quarta via: ficar tudo na mesma.

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Parlamento avalia petição que pede reconhecimento de mais títulos para o Sporting

No entanto, e sendo verdade que foi o Sporting a dar o tiro de saída nessa discussão dos primórdios do que é o futebol nacional como hoje o conhecemos ainda em 2015, os leões correram o risco de ver em votação dois pareceres que defendiam realidades distintas daquela que foi apresentada por mais do que uma vez à Federação e que apontava para mais quatro Campeonatos para o clube. Ainda assim, e nos dias antes da reunião magna, os leões deram entrada com um novo parecer (ou “velho”, tendo em conta que foi aquele que chegou às mãos de Fernando Gomes, líder da Federação, em 2020) que irá igualmente a sufrágio. 

Há uma terceira via na definição das contas dos títulos: parecer do Sporting também vai ser discutido na AG da Federação

“A ideia de que o Campeonato Nacional da I Divisão e a Taça de Portugal são a continuação, sob outra designação, das Ligas e do Campeonato de Portugal é falsa e tem origem num equívoco lamentável da direção da Federação, que é ilegal de um ponto de vista procedimental, contrário às decisões do Congresso Extraordinário de Agosto-Dezembro de 1938 e insustentável de uma perspetiva histórica atenta à evolução dos sentimentos, das atitudes e dos comportamentos, bem como à reconstituição das formas concretas de imaginar a nação. Depois desse congresso, completou-se a viragem final que vinha sendo preparada desde 1934 – a hierarquia das provas mudou. Até 1938, o título máximo era o Campeonato de Portugal”, sustenta o “documento idóneo e independente” de 74 páginas que tinha sido entregue há ano e meio.

Não são 18, são 22: Sporting entrega parecer à Federação para reivindicar mais quatro títulos no Campeonato Nacional

Em 2016, perante o rebranding unilateral feito pelo Sporting a esse nível, passando a contabilizar 22 e não 18 Campeonatos em todos os meios oficiais, a Federação tomou uma posição e esclareceu que, de facto, o Campeonato de Portugal é o antecessor da Taça da Portugal – ou seja, os troféus conquistados nessa prova não devem ser considerados títulos de campeão nacional. Mais tarde, e para terminar de vez com o tema, criou a CIATN para colocar um ponto final na discussão a nível oficial, tendo marcado uma Assembleia Geral Extraordinária para votação dos pareceres por especialistas indicados pela Universidade de Lisboa, do Porto e de Coimbra e que entretanto foram entregues aos responsáveis federativos.

Federação confirma: Sporting tem 18 e não 22 títulos de campeão

E a discussão pode começar ainda antes da votação que irá decorrer esta quarta-feira, com o Sporting a demonstrar a sua incompreensão perante a colocação do “seu” parecer, designado como parecer 3 sobre o tema, no oitavo ponto da ordem de trabalhos quando os outros dois se encontram… no ponto quatro.

Parecer 1: até 1934 são Campeonatos, durante a Liga experimental são Taças

O primeiro parecer, feito por três elementos indicados pela Universidade do Porto (Amândio Barros, Manuel Janeira e Ricardo Pereira) e um da Universidade de Lisboa (Sílvia Alves), defende que as equipas vencedoras do Campeonato de Portugal entre 1921/22 e 1933/34 devem ser consideradas campeãs nacionais tal como as que ganharam também o Campeonato da Liga (considerada então como uma Liga experimental) entre 1934/35 e 1937/38, ao passo que os vencedores do Campeonato de Portugal entre 1934/35 e 1937/38 ficam com esses títulos revertidos em Taças de Portugal e não Campeonatos Nacionais.

  • Campeonatos Nacionais: 39 do Benfica (mais dois), 33 do FC Porto (mais três), 21 do Sporting (mais dois), quatro do Belenenses (mais três), um do Boavista, um do Carcavelinhos (mais um), um do Olhanense (mais um) e um do Marítimo (mais um);
  • Taças de Portugal: 27 do Benfica (mais uma), 19 do Sporting (mais duas), 19 do FC Porto (mais uma), cinco do Boavista, três do Sp. Braga, três do V. Setúbal, três do Belenenses, duas da Académica, uma do Beira-Mar, uma do Leixões, uma do V. Guimarães, uma do Estrela e uma do Desp. Aves.

Parecer 2: todos os Campeonatos de Portugal devem ser Taças de Portugal

O segundo parecer, feito por Francisco Pinheiro que foi nomeado pela Universidade de Coimbra, tem um cariz mais conservador sem deixar de colocar mais títulos no palmarés. Aqui, o entendimento é que o Campeonato da Liga foi o antecessor do Campeonato Nacional e que o Campeonato de Portugal foi o antecessor da Taça de Portugal, colocando assim os títulos entre 1921/22 e 1937/38 na Taça de Portugal.

  • Campeonatos Nacionais: 37 do Benfica, 30 do FC Porto, 19 do Sporting, um do Belenenses e um do Boavista;
  • Taças de Portugal: 29 do Benfica (mais três), 22 do FC Porto (mais quatro), 21 do Sporting (mais quatro), seis do Belenenses (mais três), cinco do Boavista, três do Sp. Braga, três do V. Setúbal, duas da Académica, uma do Beira-Mar, uma do Leixões, uma do V. Guimarães, uma do Estrela, uma do Desp. Aves, uma do Carcavelinhos (mais uma), uma do Olhanense (mais uma) e uma do Marítimo (mais uma).

Parecer 3: todos os Campeonatos de Portugal devem ser Campeonatos Nacionais

O terceiro parecer submetido pelo Sporting é assinado por Diogo Ramada Curto e Bernardo Pinto da Cruz, investigadores do Instituto Português de Relações Internacionais. Neste caso, e como os leões assumem desde 2015, é defendido que os Campeonatos de Portugal devem ser considerados Campeonatos Nacionais do início da sua existência até 1938, sendo considerados também os quatro anos em que, de forma paralela, houve um Campeonato da Liga descrito como uma versão experimental para a principal competição do calendário português que existe nos dias que correm. Além de os jornais da época fazerem uma descrição desses triunfos como “campeões nacionais”, o parecer defende que o facto de ser uma prova realizada por eliminatórias não apaga o facto de haver apurados das regiões do país a nível nacional. Com isso, o Benfica ganharia três Campeonatos de Portugal mas perderia três do Campeonato da Liga.

  • Campeonatos Nacionais: 37 do Benfica, 33 do FC Porto (mais três), 23 do Sporting (mais quatro), quatro do Belenenses (mais três), um do Boavista, um do Carcavelinhos (mais um), um do Olhanense (mais um) e um do Marítimo (mais um);
  • Taças de Portugal: 26 do Benfica, 18 do FC Porto, 17 do Sporting, cinco do Boavista, três do Sp. Braga, três do V. Setúbal, três do Belenenses, duas da Académica, uma do Beira-Mar, uma do Leixões, uma do V. Guimarães, uma do Estrela e uma do Desp. Aves.