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As negociações entre a comitiva de “peso” que João Lourenço enviou para Barcelona e parte da família de José Eduardo dos Santos não resultaram num acordo. Num cenário de quase rutura total, a Presidência angolana vai recorrer ao governo espanhol, adianta ao Observador fonte do executivo angolano em Luanda. Mas “só depois de esgotadas as questões jurídicas”.

Se o o impasse continuar “em terras espanholas, o centro da decisão e atuação muda de Barcelona para Luanda”, refere a mesma fonte. Para já não haverá mais negociações até ao relatório final da autópsia que Tchizé, uma das filhas de José Eduardo dos Santos, pediu. “Esta situação não se pode arrastar indefinidamente”, acrescentou, “pelo que está na altura de entrarem em cena novos atores”. Ou seja, o governo de Espanha.

Ontem, o embaixador de Espanha em Angola foi chamado ao Ministério das Relações Exteriores, e informado do que se está a passar, bem como das diligências que o governo de João Lourenço pretende realizar junto do congénere espanhol.

“José Eduardo dos Santos não andava fugido da justiça. Estava em Espanha, a tratamento médico, protegido pelo seu estatuto de ex-Chefe de Estado”, continua esta fonte.  “Com o esgotar das questões jurídicas, o governo angolano vai pedir ao seu congénere em Madrid para enviar o corpo para Angola”.

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As questões judiciais só terminam com o resultado definitivo da autópsia e a decisão do tribunal sobre o pedido de investigação às causas da morte de José Eduardo dos Santos, ambos pedidos por Tchizé, uma das filhas do ex-Presidente de Angola.

Na segunda-feira foi apresentado o relatório preliminar da autópsia que concluía não haver irregularidades na morte do ex-estadista e a imprensa angolana avançava que as conclusões finais estariam prontas dentro de três dias, citando fonte da delegação governamental em Barcelona.

E fonte ligada ao processo interposto por Tchizé dos Santos revelou já esta terça-feira à agência Lusa que a decisão judicial sobre a quem será entregue o corpo será tomada ainda esta semana, depois de comunicado à família o resultado da autópsia. No entanto, não excluía que ainda fossem feitas novas audições à família.

Mas esta terça-feira o Procurador-Geral da República, que chefia o comité enviado por Luanda para conversar com a família de José Eduardo dos Santos, disse que o relatório final da autópsia só estaria pronto num prazo que pode ir das três às seis semanas, como pode ler aqui no nosso liveblog onde estamos a acompanhar este braço-de-ferro entre a família e o governo de Angola.

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Uma coisa é certa, garante a mesma fonte de Luanda: primeiro há que esperar pela decisão dos tribunais; “ainda não se sabe se o Ministério Público aceitou investigar a denúncia feita por Tchizé”, sublinhou.  Só depois poderá haver intervenção do governo de Espanha nesta disputa se, entretanto, ela não se resolver.

O local do funeral de José Eduardo dos Santos tem estado a dividir a família próxima do antigo Presidente de Angola. Enquanto Tchizé faz uma oposição pública e notória ao enterro do pai em território angolano, não fazendo sequer parte das conversações com o governo, Isabel, a filha mais velha, tem-se mantido calada enquanto negoceia as condições de entrada em Luanda. Com vários processos judiciais sobre si, receia ser detida pelas autoridades enquanto estiver em Angola.

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A lei angolana proíbe que alguém seja detido durante um funeral e nos três dias seguintes, mas Isabel estará a procurar obter outras garantias, daí que a comitiva seja presidida pelo PGR. A negociação não tem sido simples, sabe o Observador, até porque Isabel participa por vídeo-conferência e através dos seus advogados.

Isabel nunca disse publicamente que não queria ir ao funeral do pai e na segunda-feira, numa entrevista dada à CNN, Tchizé, que admitiu ter sido apenas ela a interpor ações judiciais, não perdeu a oportunidade para dizer que se a irmã for, será uma “grande traidora”.

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Os outros meio-irmãos (com excepção dos três filhos de Ana Paula) estarão solidários com Isabel: se a primogénita não tiver as condições necessárias para ir a Angola, serão contra a trasladação do corpo.

Não havendo acordo entre todos os familiares, terá de ser o tribunal a dizer quantos dos oito filhos oficialmente conhecidos são necessários para uma decisão positiva e se Ana Paula, como mulher de José Eduardo dos Santos, tem primazia ou não sobre os restantes familiares.

Juristas angolanos têm-se dividido: uns dizem que sim, porque está casada e nunca houve um divórcio ou formalmente separada, outros aproximam-se da leitura feita pela advogada de Tchizé. Isto é, como há mais de quatro anos que Ana Paula não vivia com José Eduardo dos Santos, está separada de facto, pelo que, segundo a lei espanhola, não tem voto na matéria.

Ora, segundo o que a fonte do governo de Luanda disse ao Observador, o que o executivo de João Lourenço quer do governo espanhol, é que, havendo uma decisão do tribunal, e sendo ela no sentido da trasladação, o processo seja imediato, sem mais demoras.