O “rolo compressor” da maioria absoluta já entrou no léxico desta legislatura. Enquanto a oposição crítica o Governo por impedir a ida de ministros ao Parlamento — oito desde o início do mandato –, o PS defende-se e diz que rejeitou apenas 15% dos requerimentos apresentados. No debate sobre o escrutínio ao Governo (anterior) — quando ainda não existia essa maioria — foram várias as queixas ao “poder absoluto” do PS.
Na manhã desta quarta-feira, a coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, reagiu com veemência ao chumbo do requerimento para ouvir o novo ministro da Saúde, Manuel Pizarro: “A prática era viabilizar a audição de ministros, mas mudou”, escreveu a líder bloquista, acrescentando que “o PS aceitou o pedido de António Costa e deixou de ter vergonha de ser maioria absoluta“. Para o também deputado bloquista, José Soeiro, “Marta Temido não pôde ser chamada porque estava a sair e Pizarro porque está a entrar” e ironizou: é um “dos argumentos injustificáveis” apontados pela maioria socialista.
A prática era viabilizar a audição de ministros, mas mudou. O PS aceitou o pedido de António Costa e deixou de ter vergonha de ser maioria absoluta. Hoje foi na Saúde. Esta sessão legislativa, Marta Temido veio ao parlamento sobre as urgências de obstetrícia. Pizarro não virá.
— Catarina Martins (@catarina_mart) September 28, 2022
O debate era sobre a fiscalização ao executivo anterior, mas o Bloco de Esquerda aproveitou para apontar já à atual legislatura e acusar o PS de “impedir o escrutínio”, apontando “especiais responsabilidades” à ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes. Para o deputado do Bloco de Esquerda, José Soeiro, a ministra dos Assuntos Parlamentares “obriga os deputados do PS a fazerem tristes papeis, porque é constrangedor não terem argumentos para justificar a recusa das audições, só porque a ministra lhe diz para não virem”.
A crítica atravessa o hemiciclo e encontra acolhimento no PSD. O maior partido da oposição diz que as oito recusas “são um insulto à democracia representativa” e aponta o chumbo ao requerimento para ouvir a Ministra da Defesa, ainda que à porta fechada, como o exemplo mais flagrante.
Ministros substituídos por secretários de estado
A par dos chumbos, o deputado do PSD Joaquim Pinto Moreira atira também à falta dos ministros nos debates sobre as áreas que tutelam. “Nas últimas semanas foram vários os que faltaram à chamada. O da Administração Interna e da Agricultura sobre os incêndios, a da Justiça sobre o banco de terras e o das Finanças, da Economia e do Trabalho e Segurança Social sobre os programas de emergência social”, apontou o deputado social-democrata.
A falta de José Luís Carneiro e de Pedro Nuno Santos nos debates pedidos pelo Chega mereceram críticas de André Ventura — que chegou a comparar o ministro à personagem “Wally” –, mas Ana Catarina Mendes até pediu a palavra para esclarecer que, por exemplo, o ministro das Infraestruturas esteve no Porto na manhã desta quarta-feira e por isso não conseguiu estar no Parlamento. André Ventura sacou da calculadora e lembrou que Porto-Lisboa se pode fazer em 2h34, possibilitando assim a presença do ministro no debate.
Para o PSD, oito meses decorridos desde as eleições, a “garantia deixada pelo primeiro-ministro de que maioria absoluta não é poder absoluto não passa de uma figura retórica”.
Entre o rol de queixas sobre os ministros que foram impedidos de vir ao Parlamento com o voto do PS, a Iniciativa Liberal pegou no exemplo de Manuel Heitor, o ex-titular da pasta do Ensino Superior, “o único capaz de fazer o contraditório a João Leão no caso do financiamento do centro de investigação do ISCTE”, disse o líder parlamentar, Rodrigo Saraiva.
O PCP lamenta que os governos “deixem o feito por não feito” no que toca às obrigações para com a oposição e deixa o lembrete de que “responder é um dever” e não uma figura facultativa ao dispor dos governos.
A defesa do executivo começou com Pedro Delgado Alves, que depois de um mea culpa sobre a taxa de 91% de perguntas não respondidas pelo ex-ministro do Ensino Superior, adiantou que a recusa dos oito ministros “representa 15% dos pedidos feitos nesta legislatura” e deixou a garantia de que “existe uma presença assídua” de membros do Governo na Assembleia da República.
Ana Catarina Mendes completou apenas com os dados da anterior legislatura, em que “por 270 vezes os membros do Governo marcaram presença em audições” e criticando os que “preferem falar dos oito que não vieram”.