A primeira-ministra britânica, Liz Truss, admitiu este domingo que deveria ter “preparado melhor o terreno” antes de anunciar os cortes maciços de impostos na semana passada, que provocaram o caos nos mercados financeiros, mas defendeu as medidas. “Continuo a apoiar o pacote que anunciámos e continuo a afirmar que o anunciámos rapidamente porque tínhamos de agir, mas reconheço que devíamos ter preparado melhor o terreno”, disse Truss à televisão britânica BBC.
A entrevista à BBC coincide com o início do congresso anual do Partido Conservador, que decorre entre hoje e quarta-feira, em Birmingham.
Eleita líder dos ‘tories’ no início de setembro, no congresso Truss vai enfrentar militantes e deputados irritados com a repercussão do “mini orçamento” de 23 de setembro nos mercados financeiros, afundando o valor da libra esterlina e fazendo disparar os juros da dívida pública.
Investidores reagiram ao pacote de cortes fiscais e congelamento dos preços da energia com desconfiança, devido à falta de projeções económicas e planos detalhados para controlar a crescente dívida pública.
A volatilidade levou o Banco de Inglaterra a identificar “riscos reais para a estabilidade financeira britânica” e a intervir no mercado de dívida, comprando obrigações do Estado. A situação aumentou o risco de uma escalada das taxas de juro que terá impacto nos créditos à habitação, agravando a crise do aumento de custo de vida dos britânicos, já preocupante devido à inflação de quase 10%.
“Receio que haja um problema com as taxas de juro a subir em todo o mundo e temos de lidar com isso. Mas quero dizer às pessoas que compreendo as suas preocupações sobre o que aconteceu na semana passada”, disse Truss, citada pela agência espanhola EFE.
Truss insistiu que a situação geral é “muito difícil” e que “governos de todo o mundo estão a tomar decisões difíceis”. “Este é um problema global”, disse a líder dos conservadores, que aludiu aos problemas causados pela guerra na Ucrânia e o rescaldo da pandemia de covid-19.
“O que está a acontecer em todo o mundo é que as taxas de juro estão a subir, por isso a Reserva Federal [dos Estados Unidos] aumentou-as em 4%”, afirmou. Truss disse ainda que o seu executivo tem “um plano muito claro sobre como proceder este inverno com o plano energético, mas também sobre como lidar com a questão do abrandamento económico”.
Figuras conhecidas, como os antigos ministros das Finanças Rishi Sunak e Sajid Javid, bem como o presidente da Comissão Parlamentar das Finanças, Mel Stride, disseram à estação Sky News que não pretendiam assistir ao congresso, refletindo o descontentamento dentro do partido.
O caos dos últimos dias complicou ainda mais a perceção dos ‘tories’ junto da população, com uma sondagem publicada no jornal ‘The Times’ a dar ao Partido Trabalhista uma vantagem de 33 pontos percentuais, algo inédito e evidência da impopularidade do partido no poder há 12 anos.
Outra sondagem do instituto YouGov mostra que 51% dos britânicos pensam que Liz Truss, no cargo há menos de um mês, devia demitir-se, incluindo 36% dos eleitores Conservadores.
O Congresso, o que deverá encerrar na quarta-feira com o discurso de Truss, terá intervenções dos ministros das Finanças, Kwasi Kwarteng, da Saúde, Therese Coffey, e dos Negócios Estrangeiros, James Cleverly, entre outros. Porém, a participação esperada de 11.000 militantes poderá ser posta em causa pelas greves dos comboios na terça e quarta-feira, convocadas pelos sindicatos de propósito para perturbar o congresso Conservador.