A esteticista de 24 anos que foi julgada pelo homicídio do rapper David Mota já depois de ter sido condenada por roubo só soube da morte da vítima três dias depois do assassinato, a 17 de março de 2020. Esta foi uma das informações, prestadas pela antiga namorada de David, que o Tribunal de Sintra valorizou e verteu para o acórdão lido esta terça-feira no Tribunal de Sintra — e que absolveu Catarina. “Não ficou demonstrado que a arguida Catarina tenha agido em prévio acordo e em comunhão de esforços e intentos com João Pedro Luizo, Édi Barreiros e Fábio Martins com o propósito de tirar a vida a David Mota”, lê-se no acórdão a que o Observador teve acesso.
Catarina foi condenada por roubo em co-autoria com Luizo, Édi e Fábio, que foram também condenados em maio por homicídio. Mas o tribunal da Relação de Lisboa, em resposta ao recurso do Ministério Público, acabaria por determinar que a arguida fosse também julgada pelo homicídio. Segundo o despacho de acusação, todos eles combinaram assaltar o rapper David Mota, muito conhecido nas redes sociais e que usualmente exibia joias, dinheiro e outros objetos de valor nas suas publicações nas redes e em videoclips.
À data do crime, Luizo namorava com Vera, que por seu turno era a antiga namorada de David Mota. Em declarações ao tribunal, Vera explicou como Catarina era amiga de Luizo e que ele tinha uma grande ascendente sobre ela. Explicou que a 17 de março, três dias depois do desaparecimento de Mota, telefonou a Catarina para se encontrarem e contou-lhe o ocorrido. A arguida terá ficado chocada e dito que o plano era ser apenas um assalto.
Vera, que nos tempos livres é fadista, descreveu o antigo namorado Luizo como “ladrão”, que vivia no mundo dos videojogos, mas houve algumas explicações que deu ao tribunal que não foram consideradas totalmente “credíveis”.
Para corroborar que Catarina não tinha planeado a morte de David, o tribunal teve também em conta que quando ela viu dois encapuzados (que eram amigos dela) a entrarem no prédio do David para o assaltar, não fugiu para muito longe. Ficou nas imediações a chamar um Uber num ponto da rua em que foi vista por um vizinho de David e em que há dúvidas que tenha conseguido ouvir gritos ou ver David a ser levado e espancado. O tribunal lembra que em caso de dúvida, não se condena.
Nessa noite, Catarina ainda telefonou para o telemóvel de David e atendeu a irmã. Ela explicou que ele tinha sido assaltado por dois rapazes que a mandaram sair do prédio de David e que não regressou ao local porque sofria de ansiedade e tinha tomado um comprimido. Horas depois, Catarina ainda mandou mensagens a David a perguntar se ele estava bem.
Da prova “não resulta que fizesse parte do plano engendrado por João Luizo, a que Catarina aderiu, a possibilidade de provocarem a morte de David Mota, como veio a suceder”, lê-se. “Dos factos apurados não resulta que a arguida Catarina tenha estabelecido com os demais uma resolução (ainda que tácita) de molestar fisicamente David Mota e por essa via causar-lhe a morte”, decidiu o coletivo de juízes.
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Catarina foi uma adolescente problemática e teve mesmo que ser medicada
Pelo relatório social que foi feito à arguida para o processo percebe-se que Catarina mantém agora um relacionamento amoroso com Luizo, que está preso. E que quer manter essa relação e, depois de cumprida a pena, ir para o estrangeiro.
Catarina cresceu com os avós, porque os pais eram toxicodependentes. A mãe acabou por morrer tinha ela 7 anos, enquanto o pai emigrou para a Alemanha, onde se fixou.
Na pré-adolescência, a agora esteticista começou a manifestar-se uma jovem problemática, começou a faltar às aulas, passava noites fora de casa até que os avós a levaram a consultas de pedopsiquiatria. Chegou mesmo a ser sinalizada pela Comissão de Proteção de Menores e colocada num colégio interno privado na zona de Amarante, onde este dos 14 aos 17 anos. Com esta idade, começou a consumir pontualmente algumas drogas. Aos 19 foi trabalhar, sempre em estabelecimentos comerciais, até tornar-se esteticista — atividade que parou durante a pandemia.
Neste momento cumpre pena de quatro anos e seis meses por roubo agravado. Por ter sido absolvida pelo crime de homicídio, também não terá que pagar a indemnização de 80 mil euros que a mãe de David lhe pediu.