Os veículos com mecânicas híbridas plug-in (PHEV), que associam ao motor de combustão tradicional um outro motor eléctrico para reduzir o consumo e emissões, sendo que esta unidade eléctrica é alimentada por uma bateria recarregável capaz de garantir uma autonomia em modo exclusivamente eléctrico de no mínimo 50 km, estão, desde há alguns anos, sob a mira do legislador europeu. Anunciam consumos pouco superiores a 1 litro/100 km e emissões a partir de 25g de CO2/km, que são impossíveis de alcançar mesmo com a bateria recarregada e inverosímeis numa curta viagem de 200 a 300 km, especialmente porque há estudos que provam que os condutores, sobretudo dos veículos PHEV maiores e mais caros, raramente recarregam a bateria.

É a má utilização dos PHEV pelos condutores que levou países como a Alemanha a ter retirado os incentivos à compra deste tipo de veículos, uma vez que se os acumuladores não são recarregados, então não há a redução de consumos e emissões que justifique a atribuição de ajudas dos Estados. E até a própria União Europeia está apostada em assegurar que os apoios a este tipo de mecânicas sejam retirados. Mas existe igualmente a vontade de corrigir em alta os valores de homologação desta classe de veículos segundo o método europeu WLTP, que já ninguém tem dúvidas de serem excessivamente optimistas. E o mais recente estudo sobre este tipo de mecânicas pretende acelerar a correcção deste erro.

O estudo foi encomendado pela organização não governamental European Federation for Transport and Environment, habitualmente denominada Transport & Environment (T&E), à Universidade de Tecnologia em Graz, na Áustria, que escolheu três modelos PHEV que considerou representativos dos segmentos compacto e médio, respectivamente o Peugeot 308 e o Renault Mégane, por um lado, e o BMW Série 3, por outro. Este estudo visa ainda complementar o primeiro, realizado dois anos antes, em que os modelos seleccionados eram maiores e mais pesados, precisamente os BMW X5, Volvo XC90 e Mitsubishi Outlander.

O 308 e o Mégane recorrem a diferentes soluções para as suas soluções PHEV, com o Renault a abrir mão de potência em troco de uma maior eficiência (motor atmosférico e a funcionar segundo o ciclo Atkinson, além de uma caixa menos virada para a performance e mais para a economia) e o Peugeot a adoptar uma solução mais convencional com motor sobrealimentado para oferecer mais potência. O BMW adopta uma mecânica similar à Peugeot, mas com um motor maior (2.0 em vez de 1.6).

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Emissões de CO2 sobem mesmo com bateria recarregada

O primeiro teste da universidade austríaca visou avaliar os três modelos em condições reais, circulando em cidade e meio semi-urbano, partindo sempre com a bateria recarregada, ou seja, nas condições ideais para um PHEV e aconselhada pelos construtores. Todos os veículos foram utilizados em modo híbrido, sem que a universidade especifique o número de quilómetros percorrido.

Apesar das opções mecânicas, não é o Renault Mégane o melhor nas emissões de CO2, tendo atingido 50g de CO2/km, anunciando em WLTP 30g, ou seja, um desvio de 67%. O Peugeot 308 é quem emite menos CO2 nestas condições, anunciando 27g/km e registando 33g, uma diferença de somente 22%. O BMW Série 3 teve a pior performance nestas condições, anunciando 36g/km e emitindo 112g, um aumento de 311%.

Autonomia em modo eléctrico muito abaixo do anunciado

O segundo teste mais interessante dos austríacos pretendia comparar a autonomia anunciada em modo 100% eléctrico com a avaliada em condições reais de utilização. Para optimizar as vantagens dos PHEV, foi decidido que as medições seriam realizadas em ambiente urbano, onde os PHEV têm mais vantagens, o que se traduz por anúncios de autonomia superiores. Ainda assim, os três modelos estiveram abaixo das expectativas, mas uns mais do que outros.

Entre os três veículos em ensaio, o que menor autonomia revelou foi o Peugeot, modelo que anuncia uma autonomia eléctrica média de 63 km, valor que sobe para 69 km em cidade. Mas, de acordo com os testes da Universidade de Graz, o 308 híbrido plug-in percorreu apenas 33,6 km em cidade, uma redução de 51,3%. O BMW Série 3, que reivindica em WLTP 56 km de autonomia em ciclo combinado e 59 km em cidade, acabou por registar somente 41,2 km em condições reais em meio urbano, uma perda de 30,2%, para o Renault Mégane, com 48 km em ciclo combinado e 62 km em cidade, percorrer 49,1 km nas condições do teste, perdendo apenas 20,8% face ao valor anunciado.

Os testes incluíram ainda medições de CO2 em modo de conservação da bateria, em que o veículo se desloca apenas à custa do motor de combustão, para guardar a carga do acumulador para, por exemplo, circular em zonas da cidade em que os motores de combustão possam estar interditados. Nestas condições, todos os PHEV se portaram mal – o Renault registou 138g, o Peugeot 197g e o BMW 204g –, com emissões de CO2 cinco a sete vezes superiores ao anunciado, sendo que esta é uma situação pouco (ou nada) representativa para a eficiência desta tecnologia.

Bem mais interessante é o ganho para cada construtor que esta sobrevalorização das emissões dos PHEV permitiu. É bom recordar que não era expectável que a maioria dos construtores conseguisse cumprir o limite de 95g de CO2 imposto por Bruxelas em 2020 e, para evitar multas milionárias, foi necessário avançar com algum facilitismo. Sem tempo para conceber e produzir os eléctricos que necessitavam para reduzir as emissões elevadas, devido ao excesso de modelos exclusivamente a combustão, Bruxelas permitiu aos construtores uma subavaliação das emissões dos PHEV. Só que se muitas marcas abandonaram esta “muleta”, outras há que ainda hoje dependem excessivamente dela. Daí que a BMW recorra aos PHEV para reduzir 18g de CO2/km à média da marca, a Stellantis (grupo a que pertence a Peugeot) utilizou-os para cortar 13g e a Aliança Renault-Nissan-Mitsubishi para retirar apenas 2g.

Após as conclusões do estudo solicitado à universidade austríaca, a T&E propõe ao poder político que não se considerem os PHEV como veículos zero emissões e que os seus benefícios fiscais sejam calculados exclusivamente com base nos valores de emissões determinados em RDE (real driving emissions) para cada unidade. Defende ainda esta organização que os PHEV só sejam considerados para usufruir de incentivos caso a bateria assegure mais de 80 km de autonomia em modo EV e que a potência do motor de combustão não ultrapasse a da unidade eléctrica, entre outros requisitos menos significantes.