A ministra da Coesão reconheceu esta quarta-feira que estão a ser excessivos os pedidos aos municípios de reporte à Direção-Geral das Autarquias Locais (DGAL), no âmbito da descentralização, ressalvando que a intenção é perceber a necessidade de reforço de verbas.

“Em relação aos reportes da DGAL, eles são excessivos. Não poderia deixar de o dizer. Mas, o objetivo não é pedir [devolução de verbas] aos municípios. O nosso objetivo é perceber as áreas de reforço“, explicou Ana Abrunhosa, durante uma audição na comissão de Administração Pública, Ordenamento do Território e Poder Local, na Assembleia da República, em Lisboa.

A governante respondia à deputada comunista Paula Santos, que questionou a legalidade destes reportes.

“Se é uma descentralização para as autarquias. Se os municípios têm autonomia, como fundamenta esta obrigatoriedade de reportes. Qual é a justificação”, questionou a deputada do PCP.

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Em causa está a necessidade de os municípios terem de reportar à DGAL, todos os meses, a informação relativa às receitas arrecadadas e aos encargos relativos às competências que são transferidas no âmbito da descentralização, nomeadamente nas áreas da saúde, educação, segurança social e cultura.

Esta prática está inscrita no diploma que regulamenta o Fundo de Financiamento da Descentralização para os municípios e que foi publicado em outubro.

Ainda a este propósito, Ana Abrunhosa adiantou que o Ministério da Coesão tem já agendada uma reunião com a Associação Nacional de Municípios para discutir o diploma.

No entanto, a governante assegurou que o objetivo da tutela é que este seja um procedimento provisório.

Não faz sentido este reporte permanente e esta fiscalização. Temos é de ter a certeza de que o valor que estamos a transferir cobre estas receitas”, apontou.

Ana Abrunhosa explicou também que o objetivo é no futuro “acabar com o fundo de financiamento da descentralização e com o fundo social municipal” e que este passe a ser “uma receita de direito próprio” dos municípios.

“Relativamente aos pedidos de reforço que os municípios fizeram à DGAL, queria só aqui transmitir algo que eu acho que é muito importante. Nós temos vindo a analisar esses reforços, só que os municípios incluem todos os custos que têm com a educação, mas depois quando incluem as transferências que recebem, incluem o fundo de financiamento para a descentralização, mas não têm incluído o fundo social municipal. Esse fundo também financia competências”, salientou.

O debate sobre a descentralização durante a audição da ministra na comissão parlamentar ficou marcado por muitas críticas ao processo e acusações de que se trata de uma “transferência de encargos” e de um aumento de “tachos e burocracia”.

“Não existe uma descentralização efetiva, mas sim uma transferência de encargos para as autarquias. Não há verbas suficientes”, acusou a deputada Paula Santos.

Já a deputada social-democrata Sofia Matos questionou as vantagens do processo de descentralização, com enfoque na transferência de competências para as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR).

“O que este Governo nos oferece ou parece oferecer é uma mão cheia de nada. Mais cargos e ‘jobs for the boys’, mais burocracia, um estado mais pesado”, afirmou.

Na resposta, Ana Abrunhosa pediu moderação no discurso sobre os processos de descentralização e de regionalização, negando que tenham como objetivo “mais tachos e burocracia”.

“Se queremos a regionalização temos de evitar este discurso de mais tachos, mais burocracia. Não é isso que está em causa”, assegurou a governante.

No mesmo sentido, a deputada socialista Berta Nunes considerou que a descentralização vai promover “maior coesão territorial” e reforçar as regiões periféricas com “mais serviços, competências e pessoas”.

Por seu turno, o secretário de Estado da Administração Local e Ordenamento do Território, Carlos Miguel, reconheceu que “o Governo tem a noção de que com o processo de descentralização será difícil acertar contas [com os municípios] à primeira, ou até à quinta, sexta e à sétima”.

“Ao aprovarmos um Orçamento de Estado em setembro e outubro, que é o inicio do ano escolar, se temos uma previsão, e dou um exemplo, das auxiliares de ação educativa para um determinado agrupamento naquela altura, não sabemos se no final do ano se são mesmo esses ou se serão mais ou serão menos, é preciso fazer esses acertos”, explicou.

O governante adiantou ainda que, em março, estará pronta uma resolução para ressarcir as freguesias das despesas que tiveram no combate à pandemia de covid-19.

“O Orçamento do Estado permitiu e aprovou que cinco milhões de euros que estavam previstos para contrato programa que foram criados para investimentos fosse, desta vez, excecionalmente, investido em despesa”, disse Carlos Miguel, revelando estarem já em diálogo com a Associação Nacional de Freguesias (Anafre) no sentido de acertar os procedimentos.