O alerta terá chegado ao Ministério Público a partir da Caixa Geral de Depósitos, depois de, na conta que tem há vários anos naquele banco, José Sócrates ter recebido várias transferências com valores avultados, mais concretamente de 12.500 euros mensais, justificadas com um contrato de consultoria com uma empresa de Adélio Machado, empresário e ex-piloto de automóveis.

Por ter sido primeiro-ministro, o ex-governante é considerado pessoa politicamente exposta (PEP), o que significa que as instituições financeiras têm deveres especiais de comunicação, por causa do combate ao crime de branqueamento de capitais. A informação saiu, assim, do banco para a Procuradoria Geral da República.

De acordo com a investigação da SIC, emitida esta quinta-feira, as transferências terão tido origem em duas empresas: uma no Luxemburgo (a ETZ Global Telecom), outra em Espanha (AMATECH Consulting). Ambas estavam ligadas a Adélio Machado, que tinha outras empresas de limpezas, imobiliário e construção, sediadas em Paris, agora em insolvência.

Segundo a SIC, a 23 de janeiro de 2020 — quando a Operação Marquês estava ainda em fase de instrução — José Sócrates terá assinado um contrato de prestação de serviços com a ETZ Global Telecom, onde assumiu funções de presidente do Conselho Consultivo Estratégico, prestando serviços de consultoria técnica e de gestão, com foco nos mercados da América Latina e em países lusófonos. O contrato teria a duração de um ano e, além dos 12.500 euros, incluiria  despesas de deslocação, estadias, representação e ainda um prémio por resultados.

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Segundo apurou a SIC, porém, o pagamento não vinha dessa empresa sediada no Luxemburgo, mas antes da sociedade espanhola, que também já declarou insolvência.

Contactado pela SIC, o empresário Adélio Machado — dono das empresas — garantiu saber pouco sobre a contratação de José Sócrates, responsabilizando um diretor-geral que, entretanto, terá saído da empresa. Da mesma forma, o ex-primeiro-ministro recusou a falar sobre o contrato, considerando que as questões representavam uma devassa da vida privada. 

Sem conseguir apurar a quantia total recebida pelo ex-primeiro ministro e durante quanto tempo, a SIC indica que José Sócrates, segundo informações da Caixa Geral de Aposentações, suspendeu durante alguns meses a subvenção vitalícia de 2.400 euros que recebe pelos anos em que exerceu cargos políticos e que é obrigado a interromper sempre que tenha outros rendimentos. Essa subvenção foi suspensa de fevereiro de 2020 — um mês depois de assinar o contrato — até outubro de 2021. Se foi durante esse tempo que vigorou o contrato com a empresa de Adélio Machado, Sócrates poderá ter recebido 250 mil euros.

Quanto à PGR, não respondeu se, na sequência da comunicação da Caixa, abriu um novo inquérito crime.