Os povos caçadores-recoletores que dominaram a Europa há 30 mil anos procuraram refúgio da última Idade do Gelo em locais mais quentes, mas apenas aqueles que se abrigaram no que é hoje Espanha e Portugal parecem ter sobrevivido.
Utilizando uma nova análise genética de restos humanos pré-históricos, os cientistas foram capazes de traçar o destino da cultura Gravetiana, um termo usado para descrever as pessoas que uma vaguearam pela Europa e produziram ferramentas e arte distintas, como as voluptuosas estatuetas ‘Vénus’ encontradas em locais antigos em todo o continente.
A investigação, publicada esta quarta-feira na revista Nature, destaca o impacto que as alterações climáticas e a migração tiveram sobre os primeiros habitantes da Europa.
A análise sugere que aqueles que viviam no que é atualmente a Itália, quando o gelo se expandiu para o sul há cerca de 25.000 anos, parecem ter encontrado um beco sem saída, em comparação com seus parentes que viviam na região que agora cobre partes do sul da França, Espanha e Portugal.
Aqueles que se deslocaram para oeste, sobreviveram à pior fase da Idade do Gelo, conhecido pelos cientistas como o último máximo glacial, sublinhou Cosimo Posth, investigador da Universidade de Tuebingen, que liderou o estudo.
“Para nossa grande surpresa, em Itália a população que estava presente antes do último máximo glacial desaparece completamente. Não sobreviveram”, realçou Posth.
A análise genética de indivíduos da Itália após a última Idade do Gelo mostra que a população Gravetiana de pele e olhos escuros foi substituída por recém-chegados dos Balcãs, que trouxeram olhos azuis e um toque de ancestralidade do Oriente.
Os investigadores analisaram 116 novas amostras genéticas que adicionaram a 240 espécimes antigos já conhecidos, cobrindo um período de há cerca de 45.000 a 5.000 anos.
Os gravetianos que sobreviveram à Idade do Gelo em Espanha misturaram-se com migrantes do leste quando a Europa aqueceu novamente há quase 15.000 anos e rapidamente repovoou o continente da Península Ibérica à Polónia e às ilhas britânicas, dominando-o por milhares de anos.
A pegada genética dos gravetianos pode ser encontrada nas últimas populações de caçadores-recoletores espanhóis até a chegada dos primeiros agricultores, que migraram da Anatólia (Turquia) para a Europa há cerca de 8.000 anos, realçou Posth.
Num comentário publicado pela Nature, Ludovic Orlando, do Centro de Antropobiologia e Genómica em Toulouse, França, frisou que o estudo mostrou como a alteração climática afetou as populações na Europa e que as antigas culturas humanas nem sempre foram etnicamente homogéneas.
Orlando, que não participou do estudo, destacou que as descobertas também demonstram como a história genética da Europa é fluida.
“Nenhuma população moderna pode reivindicar uma única origem dos grupos humanos que primeiro se estabeleceram no continente”, salientou.
Já Posth pretende aprofundar a história da migração antiga na Europa, particularmente as pessoas misteriosas que chegaram dos Balcãs na época do último máximo glacial.