“Na qualidade de presidente do Governo, movido e empenhado pela estabilidade, ao contrário de outros que vivem em instabilidade, indigitarei o dr. Luís Rodrigues, atual presidente do conselho de administração, para futuro presidente da holding”. A declaração do presidente do Governo Regional dos Açores, José Manuel Bolieiro, foi proferida em dezembro de 2022, nomeando o gestor para a presidência da SATA Holding em janeiro deste ano. Agora o Governo deixa os Açores com um problema por resolver, tirando o que Bolieiro considerou ser um ponto de estabilidade para a SATA, na perspetiva de dar estabilidade à TAP.

Luís Rodrigues vem da SATA com a experiência de gerir um plano de reestruturação e de preparar uma privatização. Aliás, ainda há poucos dias, a 3 de março, o gestor assumia, em entrevista ao DN, que a privatização da Azores Airlines estava pronta para avançar. O plano de reestruturação da transportadora açoreana vai até 2025, o mesmo ano em que o da TAP se concluirá. E é com o plano já aprovado pela Comissão Europeia e que o Governo elogiava Christine Ourmières-Widener de estar a cumprir, até acima das expectativas, que Luís Rodrigues vai ter de liderar a TAP, que ainda está em negociações com os sindicatos para um novo acordo de empresa, já que neste momento, estando em reestruturação, só existem acordos temporários de emergência.

Ouça aqui o episódio do podcast “A História do Dia” sobre o relatório da IGF.

Ficou tudo esclarecido no caso Alexandra Reis?

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É em ambiente de conflitualidade laboral que chega Luís Rodrigues que já teve de enfrentar os sindicatos da aviação na SATA, onde chegou em 2020, pouco tempo antes da pandemia ter deitado o setor da aviação para o pior ano desde que há registos. Chegou à SATA pelas mãos do socialista Vasco Cordeiro. Colocou as receitas da SATA acima dos 200 milhões de euros e a caminho da privatização, o que lhe valeria a recondução por parte do governo agora de direita da região. Mas dizia à Publituris, em novembro do ano passado, que fundamentalmente “queremos um grupo onde as pessoas sejam felizes a trabalhar. Sem colaboradores felizes não conseguimos servir bem os clientes, já que não gerimos para a folha de excel, gerimos para as pessoas”. É também no seu perfil do Linkedin que assume que o seu fio condutor é ajudar as pessoas a alcançarem e a excederem os seus objetivos. “Ao longo de mais de 15 anos conduzi a implementação de políticas de governação e garanti que o conselho estabelece e mantém boas práticas de governação”. Um problema apontado por Manuel Beja, chairman despedido da TAP, no caso da transportadora. No comunicado divulgado após ser conhecida a sua exoneração, Manuel Beja não deixada dúvidas: “Esta saída [de Alexandra Reis], que tentei sem sucesso evitar, reflete problemas de governança na empresa”.

Presidente não executivo Manuel Beja, que foi despedido, atira à tutela e aos conselheiros jurídicos

Luís Rodrigues substituirá não apenas Christine Ourmières-Widener como também o próprio Manuel Beja, demitidos por parte do acionista Estado. Christine Ourmières-Widener foi escolhida para a TAP, em 2021, por uma empresa de recrutamento quando Pedro Nuno Santos era ministro. O mesmo processo que levou à demissão de Pedro Nuno Santos levou à saída da gestora que tinha entrado pela sua mão e por causa da indemnização a Alexandra Reis, com quem Luís Rodrigues se cruzou na Portugal Telecom e por pouco não se cruzaram na TAP. Quando Alexandra Reis entrou, como diretora de compra, em 2017, Luís Rodrigues já tinha saído há cerca de três anos. O gestor, que agora volta à TAP, esteve entre 2009 e 2014 na transportadora como administrador financeiro, altura em que era Fernando Pinto o líder da empresa. Entrou na TAP de José Sócrates saiu da TAP de Passos Coelho, no ano anterior à sua venda a David Neeleman.

Na história da TAP há um antes e um depois de Fernando Pinto

Não apanhou, por isso, a TAP privada, e cujo processo de venda está agora sob escrutínio do Ministério Público e do Parlamento.

Houve também, sob a sua batuta na TAP, um plano de redução de custos. “Como administrador executivo da TAP liderou a gestão de escalas em mais de 90 destinos para onde a companhia voava, criou e implementou um programa de redução global de custos da companhia e, em abril de 2014, assumiu as funções de ‘chief financial officer’ [CFO, responsável financeiro], tendo liderado, igualmente, as áreas de Recursos Humanos, Relações Laborais, Tecnologias e informação, Compras, Legal, Auditoria e Serviços de Saúde”, salientava a nota do Governo dos Açores em 2019 quando escolheu o gestor para a companhia de aviação insular. No seu curriculum, e na sua passagem pela TAP, presidiu ao conselho de administração da deficitária TAP Manutenção e Engenharia Brasil (que acabou dissolvida no âmbito do atual plano de reestruturação) e administrador executivo na SPdH — Serviços Portugueses de Handling, uma empresa que agora dá pelo nome de Groundforce e que também teve um desfecho de insolvência e reestruturação.

TAP encerra operação de manutenção no Brasil

A compra da VEM, manutenção no Brasil, colocou-se à pele de Fernando Pinto que acabou por sair da TAP em 2018, deixando o cargo para Antonoaldo Neves que acabou substituído por Christine Ourmières-Widener, que agora deixa a cadeira, de forma forçada, para Luís Rodrigues se sentar.

Luís Rodrigues assumirá a presidência executiva e não executiva, acumulando o cargo que estava repartido entre Christine Ourmières-Widener e Manuel Beja, ambos despedidos no rescaldo do caso Alexandra Reis. Fernando Medina, ministro das Finanças, garante que o gestor não terá direito a qualquer bónus no final do plano de reestruturação, tal como tinha sido prometido a Christine Ourmières-Widener.

Bónus da CEO da TAP é de 3 milhões de euros mas ainda não terá sido ratificado

Luís Rodrigues, na mesma entrevista ao DN esta semana, dizia não ter ficado surpreendido com o bónus noticiado a que a CEO da TAP teria direito, mas assumia que na SATA não teria qualquer prémio pelo sucesso do plano de reestruturação. “Sinto que sou um mau negociador, mais nada”, ironizou o gestor que, no entanto, assumiu: “Não me surpreendeu o bónus que foi anunciado, é assim que a indústria opera, é altamente competitiva”. Luís Rodrigues declarou, em 2021, uma remuneração mensal de 13.000 euros, já que o ordenado continha ainda um corte de 5%.

Mas nessa mesma entrevista recusou comentar o caso específico de Alexandra Reis, como também não fez declarações sobre a privatização da TAP.

“Acho que não seria correto fazer qualquer comentário sobre a TAP.”

Agora segue-se o seu regresso à TAP, de onde saiu em 2014 para a Academia. Foi membro da Comissão Executiva da Nova School of Business and Economics entre 2014 e 2019, onde lecionou Business Strategy and Practice nas áreas de mestrado. Daí rumou à SATA. Mas o seu percurso profissional passou por outros setores. Segundo o seu perfil no Linkedin, começou na Procter & Gamble em 1990, onde esteve mais de oito anos, até ser chamado para assumir funções, como diretor de marketing, na Media Capital/TVI. E daqui saltou para a Portugal Telecom, em 2003, onde já estava Alexandra Reis, ainda que em subsidiárias diferentes. Luís Rodrigues iria manter-se na PT até agosto de 2008, passando em Picoas pela OPA da Sonae sobre a empresa.

Antes de entrar na TAP, em 2009, passou ainda menos de um ano pela Fischer Portugal, após ter saída de uma Portugal Telecom já sem a PT Multimédia, alvo de cisão e que deu origem à que é hoje Nos, depois dessa oferta pública de aquisição e que resultou da estratégia da defesa da PT para os acionistas não aceitarem vender à Sonae.

É licenciado em Economia e tem um MBA na Universidade Nova de Lisboa e com formação executiva em Harvard EUA, e Cranfield School of Engineering, Inglaterra.

Foi pela voz de João Galamba, ministro das Infraestruturas, que o nome de Luís Rodrigues foi anunciado como futuro presidente da TAP, considerando-o um quadro português com todas as condições para poder enfrentar os desafios da TAP e que o Governo acredita que poderá devolver a confiança na TAP e na paz social na empresa e continuar a implementar o plano de reestruturação.

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Luís Rodrigues será o senhor que segue. Ainda há três dias, recusava comentar a TAP, mas, “enquanto cidadão, espero que a vida lhes corra bem, que resolvam os problemas todos e que se tudo correr bem para a TAP, então corre bem para todos”. Um desejo que terá agora de ser o próprio a cumprir.