A administração da Transtejo apresentou esta quarta-feira demissão aos ministérios das Finanças e do Ambiente. O anúncio foi feito pela presidente da empresa, Marina Ferreira, na sequência de uma recusa de visto prévio do Tribunal de Contas ao contrato para a aquisição de baterias para navios elétricos.
“Não nos revemos minimamente no que o Tribunal de Contas diz e achamos que o que fizemos foi bem feito, e razoável do ponto de vista da gestão e promoveu o interesse público. Mas assumimos na totalidade a responsabilidade das decisões que tomamos, apresentámos hoje de manhã o nosso pedido de exoneração”, afirmou a presidente da Transtejo numa conferência de imprensa realizada na sede da empresa rodeada dos outros dois membros do conselho de administração, Luís Maia e Ricardo Figueirola.
O Ministério do Ambiente esclareceu entretanto que o pedido foi aceite e que em breve será anunciada a nova administração da empresa. E indica que constituiu uma equipa dedicada a apoiar a empresa na decisão que garanta a aquisição de baterias, em data aproximada à que estava prevista para a chegada dos barcos. O objetivo é permitir a disponibilidade das baterias nos prazos adequados, de modo a não impactar na operação da nova frota cujos primeiros navios deviam chegar no final deste ano.
Primeiros navios elétricos só vão chegar ao Tejo no final do ano e custam 85 milhões
No acórdão, o Tribunal de Contas ataca os fundamentos da decisão da Transtejo, chegando ao ponto de considerar que a empresa faltou à verdade nas respostas que deu, tendo enviado a decisão de recusa de visto para o Ministério Público para o apuramento de eventuais responsabilidades financeiras e criminais.
A gestora contesta estas conclusões e defende a legalidade e a fundamentação económica das decisões que foi tomando desde 2019, sublinhando que não há prejuízo para o erário público porque o contrato não produziu efeitos. No entanto, admite que para nove dos dez navios encomendados ficarem operacional será necessário novo concurso público para comprar as baterias cujo fornecedor será provavelmente o mesmo, dada a especificidade das unidades que foram concebidas pelos Astilleros Góndan para responder aos requisitos definidos pela cliente Transtejo.
Marina Ferreira refere que a empresa recebeu a orientação acionista para avançar com este projeto de renovação de frota e que houve autorização do Ministério das Finanças para a realização da despesa. Mas sublinha, “a responsabilidade é nossa, de acordo com o estatuto do gestor público.
Ser gestor público é isto mesmo. Ponderar o que se faz e assumir a responsabilidade. Os nossos atos são escrutinados permanentemente”.
A presidente da Transtejo lamenta ainda as afirmações “muito ofensivas e ultrajantes” feitas no acórdão do Tribunal de Contas e afirma-se disponível para prestar todos os esclarecimentos. E considera ainda que este caso mostra como é muito “difícil fazer inovação na administração pública”. Os 10 navios elétricos para o transporte fluvial de passageiros no Tejo foram concebidos em resposta aos requisitos pedidos pela Transtejo, sendo por isso um protótipo.
Marina Ferreira defende o projeto de renovação de frota com navios elétricos que considera ser um projeto revolucionário para a área metropolitana de Lisboa. Mas reconhece que não foi um projeto fácil porque “há um histórico difícil de construção de navios em Portugal”, referindo que a empresa ouviu toda a gente.
A gestora que está à frente da Transtejo desde 2017, tendo terminado o terceiro mandato no final do ano, reconhece contudo se “se soubéssemos em 2019 o que sabemos hoje não teria feito tudo igual.” Marina Ferreira justifica a opção de comprar apenas os navios no concurso público internacional lançado em 2019, deixando para mais tarde as baterias que descreve como sendo um consumível. O preço das baterias estava então em queda e as unidades iriam desvalorizar se fossem adquiridas no contrato inicial. Este contrato inicial foi autorizado pelo Tribunal de Contas que agora veio recusar o visto à compra das baterias através de um contrato de ajuste direto com o fornecedor dos navios, uma empresa das Astúrias, a Astilleros Góndan.
Em causa estava um contrato no valor de 15,5 milhões de euros, a somar aos 52 milhões de euros da adjudicação dos 10 navios, dos quais apenas um tem já as baterias asseguradas. O Tribunal de Contas comparou este procedimento à compra de um carro sem motor.
Marina Ferreira justifica a mudança de estratégia da Transtejo com a constatação, após abertura das propostas para o fornecimento de navios, de que o mercado de baterias para estes veículos era mais restrito do que o inicialmente previsto. E invocou ainda o aumento do custo de baterias que resultou do período da pandemia, o que tornou inviável as tentativas feitas pela empresa para encomendar, através de ajustes direto, as baterias junto do fornecedor, uma empresa canadiana que só aceita contratos em dólares. A alternativa encontrada pela empresa foi contratar essas baterias através do fabricante dos navios, num aditamento ao contrato inicial, cujo Tribunal de Contas considerou seria ilegal, pondo em causa a intenção da Transtejo em colocar um intermediário nesta transação, o que só iria fazer subir os preços.