Em outubro do ano passado o CEO da Jerónimo Martins não acreditava que o grupo chegasse ao fim de 2022 com mais de 25 mil milhões de euros em vendas. Mas o número foi alcançado, em parte devido à inflação. “Não posso negar que a inflação ajudou, mas não é deste crescimento que a Jerónimo Martins gosta“, afirmou o líder do grupo que detém o Pingo Doce.

Para Pedro Soares dos Santos, a inflação é “um imposto perigosíssimo” que “só destrói as sociedades e as empresas a médio prazo”. O gestor sublinhou que a inflação não permite nem às empresas “ter crescimentos saudáveis”, além de ser “o maior imposto que afeta sobretudo as pessoas pobres e retira competitividade às companhias”.

A inflação representou cerca de 10 pontos percentuais do aumento das vendas. Mas o valor, disse a administradora financeira do grupo, “não é sustentável porque tem um impacto brutal nas famílias e nos fornecedores, pode levar a constrangimentos. A certa altura, é impossível produzir com um determinado nível de preços”, sustentou Ana Luísa Virgínia.

A Jerónimo Martins apresentou esta quarta-feira os resultados de 2022. A dona do Pingo Doce registou um resultado líquido de 590 milhões de euros, mais 27,5% face ao ano anterior. As vendas avançaram 21,5%.

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Soares dos Santos ressalvou que a Polónia e a Colômbia valem mais de 80% da Jerónimo Martins, e que a empresa continua a investir em Portugal “por sermos portugueses, por gostarmos do nosso país”.

“Somos cada vez mais questionados pelos investidores sobre as razões de investirmos em Portugal e porque mantemos as operações em Portugal. Que é um país cada vez mais consumido pelo envelhecimento da população, que não cresce e onde enfrentamos quezílias internas”. A razão, adiantou, passa pela “competitividade entre os operadores de retalho” que “continua e vai continuar a acontecer”. Uma “população mais envelhecida e cada vez mais pobre procura melhor oferta e melhor negócio”, destacou.

Jerónimo Martins. Lucro sobe 27,5% em 2022 e alcança cerca de 600 milhões de euros

JM deverá pagar 700 mil euros de taxa sobre lucros extra

Os resultados de 2022 já vão ser alvo da taxa sobre os lucros extraordinários que o Governo instituiu no ano passado. Ana Luísa Virgínia revelou que a JM deverá pagar, no total, perto de 700 mil euros, segundo as estimativas já feitas, sendo que a maior parte diz respeito à empresa do grupo na Madeira. Ao Pingo Doce dizem respeito menos de 200 mil euros. A taxa vai ser contestada.

“A maior parte do valor vai ser pago pela nossa empresa na Madeira porque teve prejuízos durante a Covid-19 e lucro de 2022, que vai ser tributado a 60%”, explicou a administradora financeira do grupo. A empresa vai contestar judicialmente a taxa por considerar “extemporâneo penalizar empresas que sofreram com a Covid”.

Ana Luís Virgínia considera que o setor da distribuição “esteve sob ataque, com discussões sobre se seria responsável pela inflação alimentar, o que levou a empresa a querer mostrar “com mais detalhe” os números do Pingo Doce. A empresa teve 33 milhões de euros de lucros em 2022, menos 20 milhões do que em 2019, antes da Covid-19. “O Pingo Doce perdeu e sofreu na sua rentabilidade durante os anos da Covid” devido às “imensas restrições”, precisou. “Reduziu para metade os lucros em 2020 face a 2019 e ainda não recuperou para níveis de 2019”. O ano passado “continuou a ser um ano muito duro”, na visão da administradora. “Se calhar, para Portugal, 33 milhões de euros de lucro é muito, mas no cômputo do grupo não é assim tanto”, considerou.

Segundo a responsável, o Pingo Doce “tem menos de um cêntimo de lucro por cada euro de vendas, o que põe pressão nos volumes”. “Não há aqui nem lucros excedentários nem excessivos nem especulativos” concluiu.

A empresa detalhou que no ano passado pagou um total de 845 milhões de euros em impostos, dos quais 679 milhões na Polónia, 148 milhões em Portugal e 18 milhões na Colômbia. Em Portugal, “os clientes do Pingo Doce entregaram mais 58 milhões de euros em IVA ao Estado do que em 2021”, adiantou Ana Luísa Virgínia.

Eslováquia no radar e Minipreço fora dos planos

Nos últimos três anos, “com covid e guerra”, o grupo abriu mais de mil lojas, criou 15 500 novos postos de trabalho e investiu dois mil milhões de euros nas três geografias onde marca presença. E promete continuar a investir. “Somos fanáticos por investimento”, ressalvou Soares dos Santos. Nos próximos três anos, o grupo planeia investir mil milhões de euros em Portugal, mil milhões na Colômbia e 2,5 mil milhões na Polónia. “Sem lucros nunca poderíamos investir como investimos orgulhosamente”, notou Soares dos Santos. “A maior parte não o quis fazer porque tinham medo da crise, nós não tivemos, tivemos coragem e investimos”.

A expansão para outros mercados continua a ser uma das metas do grupo. Mas a Roménia deixou de ser o objetivo principal, apesar de se manter com um “potencial importante”. Agora, a mira está apontada à Eslováquia. “É uma oportunidade interessante para a internacionalização da Biedronka”, adiantou o CEO da marca da joaninha, Luís Araújo, ressallvando que estão “preparados para agarrar a oportunidade num tempo muito curto”.

Fora dos planos da JM está a compra do Minipreço, como foi apontado pela imprensa espanhola. Na conferência de imprensa, Soares dos Santos garantiu não estar interessados a empresa dona dos supermercados espanhóis, “e se estivesse seria só em alguns ativos”.