A Fundação Oriente (FO) apoia quase duas dezenas de professores e 800 alunos em Goa e defende que a língua portuguesa, que tem gerado menos interesse naquele estado da Índia, pode ser “cada vez mais valorizada”.

A FO em Goa não tem dados sobre o número de falantes de português na região, mas admite que, apesar de o ensino da língua estar a perder expressão localmente, o interesse ainda “é grande”.

Com o objetivo “de manter o português vivo” na educação em Goa, o organismo auxilia financeiramente “todos os professores goeses” que ensinam o idioma nas escolas secundárias, quer públicas quer privadas. São 19 profissionais, 20 instituições de ensino e perto de 800 alunos, de acordo com o delegado da fundação em Goa.

“A procura tem vindo a diminuir ligeiramente, mas tem vindo a diminuir porque o português não é uma língua obrigatória, mas opcional”, explica Paulo Gomes, em entrevista à Lusa.

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“Quem opta pelo português são filhos ou jovens que têm familiares – os país ou os avós – portugueses ou com ligações a Portugal”, continua o responsável, à frente da delegação da FO desde junho do ano passado.

A promoção da língua portuguesa, uma das principais áreas de atuação do organismo, levou Paulo Gomes a reunir-se pouco tempo depois de assumir funções como delegado, com docentes locais para perceber “o que sentem”, quais as “dificuldades nas escolas” e o que “poderia ser melhorado”.

Do encontro nasceu, numa parceria com o Centro de Língua Portuguesa – Camões, um curso de especialização para docentes de português como língua estrangeira (PLE), em “áreas mais de gestão curricular, gestão educativa, métodos e técnicas pedagógicas”, e que contou com a participação de 12 professores da Universidade de Goa e do ensino secundário.

“Entendemos que se queremos ter bons alunos, temos de ter bons recursos, bons professores”, aponta o responsável, notando que, no domínio da promoção da língua portuguesa, a delegação está presente em várias outras frentes, nomeadamente no financiamento de atividades como exposições e palestras.

Goa, colónia de Portugal ao longo de 451 anos, foi anexada pela União Indiana em dezembro de 1961. É hoje um dos 28 estados da República da Índia e, apesar da sobrevivência do português, a língua oficial da região é o concanim.

Paulo Gomes admite que “existe um grande carinho pela língua portuguesa”, assumindo, porém, que “há quem tenha opinião diferente”.

“Existem outras correntes que apontam para que a questão política é contra os portugueses… não direi que sim, nem direi que não, mas não tenho opinião sobre isso. Ou pelo menos posso até tê-la, mas como preciso de dados não gosto de falar de cor”, refere.

O responsável admite que prefere “olhar para o aspeto positivo”, como a forte adesão às iniciativas da FO. “Há uma grande comunidade, ao contrário daquilo que por vezes se quer [fazer] passar, de falantes de português, ainda há”, reforça.

Em 2016, o jornal Indian Express escreveu que o então líder da oposição indiana e antigo ministro-chefe de Goa Pratapsinh Rane sugeriu que o português se tornasse na segunda língua de ensino do estado.

“Não devemos ter problema nenhum com esta língua, eu aprendi português porque os nossos próprios documentos estão na língua portuguesa”, disse, então.

“Se uma pessoa quiser conhecer a história deste estado, deveria conhecer a língua”, defendeu, declarando que este é um assunto em debate “há mais de quatro anos e meio”.

Sobre a questão, Paulo Gomes salienta que “o trabalho que deve e pode ser feito não só pela Fundação Oriente, mas também pelas instituições portuguesas” em Goa, “é tentar perceber o que pode ser feito para, mesmo que não seja obrigatória, seja uma língua que pode ser cada vez mais valorizada”.

No que diz respeito a Damão, onde no passado, a fundação “apoiou muito” a docência da língua portuguesa, o interesse “já não é uma realidade”.

“Damão tem pouca atração, nesta altura, de captação de jovens. Estes não ficam em Damão, vão para Goa e para outros locais”, analisa.

Restauro da capela erguida por portugueses em Goa nas mãos da Fundação Oriente

A Fundação Oriente juntou-se ao Governo de Goa para restaurar, naquele estado indiano, a capela da Nossa Senhora do Monte, construída no século XVI pelos portugueses, e que implica “um investimento avultadíssimo”, disse à Lusa o organismo.

“Este ano vamos fazer um forte investimento novamente na recuperação da capela, juntamente com o Governo local”, apontou o delegado da Fundação Oriente (FO) em Goa, Paulo Gomes.

A história da FO em Goa, que celebra este ano o 28.º aniversário da delegação na região, não pode ser contada sem mencionar a Capela de Nossa Senhora do Monte. Além de ter sido responsável, em 2001, pela recuperação integral da estrutura religiosa, o organismo português lançou naquele espaço, no ano seguinte, o festival de Música do Monte, “um dos cartazes culturais ou musicais mais importantes de Goa”, que já completou 21 edições de sons indianos e internacionais.

“Os períodos das monções aqui são bastante significativos para determinado património. As monções acontecem desde junho até setembro, quando chove ininterruptamente, e estes edifícios mais antigos carecem de uma manutenção diária”, disse Paulo Gomes, referindo que, ao longo das duas últimas décadas, o trabalho “para evitar que a capela chegasse a este estado não foi feito”.

Com a responsabilidade da intervenção no interior do edifício, a fundação trouxe a Goa, no ano passado, dois restauradores-conservadores portugueses. “É um investimento avultadíssimo, e o nosso compromisso é colaborar na recuperação do interior da capela que também é um investimento avultado, desde murais, eletrificação, desde os altares”, explicou o responsável, estimando que até ao final do ano, “a capela possa estar operacional”.

Questionado sobre o valor do investimento da Fundação Oriente neste projeto, o delegado preferiu não responder. A Lusa também entrou em contacto com o departamento de Arqueologia do Governo de Goa, mas até ao momento não recebeu qualquer resposta.

A recuperação do património é, segundo Paulo Gomes, “uma das apostas da Fundação Oriente” no estado indiano de Goa. Mas o apoio, assume o responsável, vai além da tradição portuguesa: “Estamos sempre disponíveis, quer seja património cristão, quer seja património hindu, para receber propostas e analisar dentro daquilo que são as nossas possibilidades”, salientou.

No que diz respeito à intenção, recentemente noticiada pela Lusa, de deitar abaixo a Capela de Nossa Senhora das Angústias, em Damão, Paulo Gomes disse não estar na posse “dos elementos necessários” para falar sobre o caso, declarando, no entanto, que “ainda não existem certezas sobre a sua demolição”.

A comunidade católica damanense está a tentar impedir a demolição do edifício religioso com mais de 400 anos, que o administrador provincial, Praful Kodhabai Pratel, membro do Bharatiya Janata Party (BJP, Partido do Povo Indiano, nacionalista conservador hindu, no poder desde 2014), quer transformar num campo de futebol.

“Estamos a preparar-nos para a eventualidade de levarmos o caso até à decisão do Supremo Tribunal em Bombaim”, disse à Lusa o padre Brian Rodrigues, que presta os serviços religiosos naquele lugar de culto ainda ativo.

Ainda no que diz respeito ao património, a FO em Goa recebeu, em fevereiro, o 7.º Colóquio Internacional Casas Senhoriais, um projeto com mais de duas décadas que até recentemente se debruçava sobre o estudo deste tipo de mansões em Portugal e no Brasil. Um “espaço de reflexão” que chegou este ano, pela primeira vez, à Índia.

“Um seminário muito bonito e com cerca de 20 investigadores, arquitetos, quer do Brasil, quer de Portugal, aos quais se juntaram arquitetos de referência de Goa”, explicou o representante da FO, notando que a própria sede do organismo em Goa é uma casa senhorial, adquirida em 1993, e que foi alvo, no início do ano, de obras de manutenção “também avultadas” na galeria de arte.

Em 2004, foi doada à FO parte da coleção de trabalhos de António Xavier Trindade (1870-1935), “pintor maior da Índia”, nascido em Goa e de origem portuguesa. Dessa herança artística, mais de três dezenas de obras estiveram expostas, entre novembro de 2022 e janeiro de 2023, na Galeria Nacional de Arte Moderna, em Nova Deli.

“Foi uma das ações em que levámos também Goa, a Fundação Oriente e Portugal à capital”, disse, explicando que “a Índia, já no próximo mês, vai tornar-se no país mais populoso do mundo”, pelo que “as distâncias são enormes e nem sempre é fácil desenvolver atividades fora de Goa”.