A Cruz Vermelha e a Organização Mundial de Saúde (OMS) apelaram esta terça-feira às partes beligerantes no Sudão para assegurarem o acesso humanitário às pessoas necessitadas.
“Milhares de voluntários estão prontos, aptos e treinados para prestar serviços humanitários. Infelizmente, devido à situação atual, eles não são capazes de se deslocar”, disse o chefe da delegação da Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho (IFRC), Farid Aiyywar, durante uma videoconferência desde Nairobi.
“Temos ambulâncias, temos pessoas que podem prestar primeiros socorros e apoio psicossocial, mas isto só será possível quando os corredores humanitários forem garantidos por todas as partes“, insistiu, sublinhando que “as organizações humanitárias estão muito frustradas” por não poderem fazer o seu trabalho.
O pessoal das Nações Unidas também não pode trabalhar. “Temos cerca de 4.000 funcionários a trabalhar no país, [incluindo] 800 funcionários internacionais. Estamos evidentemente preocupados com a sua segurança”, disse a porta-voz da ONU Alessandra Vellucci em Genebra.
Apesar dos apelos da reunião de ministros dos Negócios Estrangeiros do G7 no Japão, da ONU e dos Estados Unidos “para pôr fim imediato à violência”, os combates continuam no Sudão, onde está em curso uma luta de poder entre dois generais. As recentes hostilidades já provocaram cerca de 200 mortos, segundo a ONU.
Sudão: combates já provocaram pelo menos 185 mortos e 1.800 feridos, revela a ONU
Os residentes permanecem fechados nas suas casas sem eletricidade ou água corrente e veem as suas reservas alimentares diminuir.
“Estamos a receber chamadas de todos os lados, de pessoas que querem coisas básicas, comida para as suas famílias, reunir as crianças com os seus pais, e, mesmo assim, não nos podemos mudar, não podemos fornecer-lhes serviços básicos como uma garrafa de água ou uma refeição para uma criança”, disse Aiywar.
O sistema de saúde está gravemente perturbado e, “se isto continuar, pode entrar em colapso”, advertiu.
“Muitos dos nove hospitais de Cartum que estão a receber civis feridos estão a ficar sem tudo… sangue, material transfusional, soluções intravenosas, equipamento médico e outras necessidades básicas”, disse uma porta-voz da OMS em Genebra, Margaret Harris.
A OMS denunciou também os ataques às infraestruturas de saúde. Três ataques foram até agora registados pela OMS, “mas sabemos que há muitos mais”, disse Margaret Harris.
“As partes devem assegurar que os cuidados possam ser prestados, o que não é possível se o pessoal, as ambulâncias e os abastecimentos não puderem deslocar-se em segurança”, insistiu.
Os confrontos, que começaram no sábado, entre as forças armadas, lideradas pelo líder de facto do país desde o golpe de Estado de 2021, o general Abdel Fattah al-Burhan, e o grupo paramilitar Forças de Apoio Rápido (RSF), chefiado pelo general Mohamed Hamdane Daglo, conhecido como “Hemedti”, que orquestrou em conjunto o golpe de 2021, mas que se tornou entretanto inimigo.
Apesar dos apelos da reunião dos ministros dos Negócios Estrangeiros do G7 no Japão, da ONU e dos EUA “para pôr fim imediato à violência”, os combates continuam na capital sudanesa.
O surto de violência surgiu no fim de semana entre os dois principais generais sudaneses, cada um deles apoiado por dezenas de milhares de combatentes fortemente armados, levando milhares de pessoas a permanecerem desde então nas suas casas ou em outros abrigos, com os mantimentos a esgotarem e vários hospitais a serem forçados a encerrar os serviços.
Face à tragédia em curso, diplomatas de diferentes países tentaram sem êxito negociar uma trégua, e o Conselho de Segurança da Nações Unidas foi convocado para discutir a crise.
A luta pelo poder colocou o general Abdel Fattah al-Burhan, comandante das forças armadas, contra o general Mohammed Hamdan Dagalo, numa reviravolta face à organização conjunta de um golpe militar em outubro de 2021.
Agora, a violência trouxe o espectro da guerra civil, numa altura em que os sudaneses estavam a tentar incrementar um governo democrático e civil, após décadas de governo militar.
Sob pressão internacional, Al-Burhan e Dagalo tinham recentemente acordado num acordo-quadro com partidos políticos e grupos pró-democracia, mas a assinatura foi repetidamente adiada à medida que as tensões aumentavam entre as duas fações em resultado da integração das RSF nas Forças Armadas e da definição da futura cadeia de comando.
Apenas há quatro anos, o Sudão inspirou esperança após uma revolta popular, ajudando a depor o líder autocrático de longa data Omar al-Bashir, mas a agitação desde então, especialmente o golpe de 2021, frustrou o impulso democrático e arruinou a economia.