O cinema português foi novamente premiado além-fronteiras. O filme “A Flor do Buriti”, assinado pelo realizador português João Salaviza, em parceria com a cineasta brasileira Renée Nader Messora, foi galardoado no Festival de Cinema de Cannes com o Prémio de Elenco.

A obra, que retrata o último século de história dos Krahô, um povo indígena brasileiro, fazia parte da seleção oficial do festival, integrando a secção Un Certain Regard, que se destina à exibição de filmes com estilos e narrativas não-convencionais.

Filmado ao longo de mais de quinze meses, com um elenco e equipa técnica que mistura indígenas e não-indígenas, o filme é a segunda colaboração entre Salaviza e Nader Messora; em 2018, já tinham levado a Cannes “Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos”, obra entre o documentário e a ficção focada na mesma tribo.

Em nota de imprensa antes da estreia, os realizadores sublinharam o passado de luta entre os povos originários e o Estado brasileiro, que o filme foca:

O filme inicia-se em 1940, onde duas crianças do povo indígena Krahô encontram na escuridão da floresta um boi perigosamente perto da sua aldeia. Era o prenúncio de um violento massacre, perpetuado pelos fazendeiros da região. Em 1969, durante a Ditadura Militar, o Estado Brasileiro incita muitos dos sobreviventes a integrarem uma unidade militar. Hoje, diante de velhas e novas ameaças, os Krahô seguem caminhando sobre a sua ‘terra sangrada’, reinventando diariamente as infinitas formas de resistência”, pode ler-se.

A estreia do filme no mais prestigiado festival de cinema mundial ficou marcada por um protesto, protagonizado pela delegação do filme, na qual os realizadores, ladeados pelo elenco vestido com trajes tradicionais, ergueram uma tarja na passadeira vermelha onde se podia ler: “Não ao Marco Temporal: The Future of Indigenous Lands in Brazil is Under Threat” (em português, “o futuro das terras indígenas no Brasil está sob ameaça”).

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O protesto da delegação de “A Flor do Buriti” na passadeira vermelha de Cannes

João Salaviza não é estranho ao reconhecimento em Cannes. O realizador português de 39 anos já foi por duas vezes distinguido na Riviera francesa: em 2009, a sua curta metragem “Arena” venceu o principal prémio da categoria, a Palma de Ouro; o já referido “Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos” também foi galardoado, em 2018, com o Prémio do Júri da secção Un Certain Regard.

O Prémio de Elenco em Cannes é, assim, o mais recente reconhecimento do cinema português nos maiores festivais internacionais, algo que começa a ser cada vez mais comum. Ainda este ano, o filme duplo “Mal Viver/Viver Mal”, de João Canijo, foi reconhecido com o Urso de Prata no Festival de Berlim.

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Pedro Adão e Silva, saudou o marco, referindo ter sido “um privilégio assistir esta semana à estreia mundial do filme e testemunhar a emoção que ele provocou na sala inteira”. No Twitter, o ministro da Cultura salientou o “olhar cuidadoso, a partir de dentro, que a obra constrói sobre a comunidade indígena Krahô, no Estado de Tocantins, no norte do Brasil”.

Na sua mensagem, Adão e Silva frisa que o prémio “é mais um reconhecimento da atual pujança e criatividade dos cineastas portugueses, cuja participação em Cannes foi este ano particularmente diversificada e feliz”.