Os lançamentos sucederam-se. Em três meses, três projetos novos. Em março, abriu a Casa Nossa, uma vila de férias no Alqueva. Em abril, inaugurou o Maré, restaurante focado no produto de mar, de olhos postos no Atlântico, a partir do Guincho. Em maio, o Mesa, projeto inserido no The Karl Lagerfeld Macau, no Grand Lisboa Palace, apresentou-se oficialmente ao resto do mundo.
Não é que tenham sido todos fruto de uma vontade repentina — não havia sequer tempo para isso, se pensarmos num chef e empresário com uma carteira que inclui já dez marcas próprias. Entre projetos embargados pela pandemia e obstáculos de licenciamento, a coisa já estava em andamento desde os tempos pré-covid. “O Maré está pronto desde 2019. O Mesa também já começou a ser trabalhado nessa altura. A Casa Nossa é que teve o percurso normal”, conta ao Observador José Avillez, chef detentor de três estrelas Michelin (duas no Belcanto, uma na Tasca do Dubai, que acaba de ser renovada).
Entre a parceria de trabalho com a mulher, Sofia Ulrich, para a edificação da casa de férias de sonho, um regresso aos ares do Guincho, onde cresceu, e uma nova aventura do outro lado do mundo, fomos saber pormenores sobre cada uma das novas casas com assinatura de Avillez.
Portugal e Macau no prato, no Mesa by José Avillez
“Foi um parto difícil”, já tinha desabafado o chef acerca do arranque do Mesa by José Avillez, restaurante no hotel The Karl Lagerfeld Macau, no Grand Lisboa Palace. É que o restaurante já estava a funcionar desde 2021, mas apenas para os residentes de Macau. Isto porque as duras regras associadas à política Covid-Zero implementada na China (que só em janeiro deste ano foram levantadas) colocaram enormes entraves nas entradas no país — daí que José Avillez tenha tido a oportunidade de visitar apenas duas vezes o espaço, projetado desde 2019. A inauguração oficial aconteceu apenas este mês de maio.
“Está a correr muito bem, o feedback tem sido muito bom”, resume o chef. Um espaço que recorda a “relação histórica Portugal — Macau — China”, mas cuja operação é outro dos desafios. Não é fácil abrir um restaurante à distância, mais ainda quando se trata do lado do mundo. “São 24 horas, porta a porta. Temos uma equipa quase toda chinesa, o que também traz os seus obstáculos — com alguns elementos precisamos até de um tradutor para conseguirmos comunicar”.
O Mesa by José Avillez, inserido num espaço “muito bonito” que faz parte da unidade projetada pelo antigo e icónico diretor criativo da Chanel, leva a mais uma zona do globo a cozinha contemporânea portuguesa — incluindo também alguns dos clássicos do receituário português — sendo expectável que a longo prazo haja a introdução de elementos típicos das gastronomias macaense e cantonesa, tão esquecidas, considera José Avillez. Para já, da carta fazem parte o bacalhau à Brás, o arroz de carabineiro, os bolinhos de bacalhau em tempura, tudo coisas “bem portuguesas, algumas feitas exatamente como são, outras com um toque mais contemporâneo.”
Aos comandos da cozinha do Mesa estará André Lai, de ascendência chinesa, que já está estabelecido em Macau há vários anos e que conheceu José Avillez numa temporada passada em Portugal.
O regresso a casa num restaurante onde o peixe é rei. Bem-vindo ao Maré
“O Maré é como voltar a casa”, começa logo por dizer o chef. José Avillez cresceu em Cascais e encontrou no antigo Raio Verde o sítio certo para consolidar o nostálgico regresso. “Este era um dos últimos espaços à beira-mar onde se poderia fazer alguma coisa.”
Na Avenida Nossa Senhora do Cabo, famosa Estrada do Guincho, o destaque vai, claro, para o produto vindo do mar. Não é a primeira vez que José Avillez destaca esta matéria-prima, mas é, concerteza, aquela em que essa vontade surte os melhores resultados. A geografia ajuda: “O Páteo no Bairro [do Avillez] tinha essa direção [dar protagonismo ao produto do mar], mas o que notamos é que na cidade, sem vista para o mar, a tendência para a carne é muito maior. Continuamos a ter peixe e marisco, mas não tem a mesma adesão do Maré, que é de 90%.”
Tudo estava a postos desde 2019, mas questões de licenciamento e ligadas, novamente, à pandemia, atrasaram a abertura. A funcionar desde abril, com 180 lugares repartidos entre duas salas e duas esplanadas, o Maré é descrito como um restaurante em “ambiente descontraído”, “decoração inspirada nos oceanos”, com assinatura do atelier AnahoryAlmeida, e “localização privilegiada”, não desembocasse quase diretamente no mar do Guincho.
Localizado junto à vila piscatória de generosa oferta no que respeita ao peixe, a intenção, lembra o chef, não é a de competir com os espaços vizinhos. “Temos aqui uma cozinha de mar, mas mais contemporânea. Não quis fazer igual ao que já se faz na zona, quis, antes, criar uma alternativa. Até porque gosto muito dos restaurantes de peixe que existem em Cascais, portanto não queria competir diretamente com eles.”
Assim, além do marisco e peixe nas brasas — aqui com recurso às técnicas nipónicas, que foram depuradas numa viagem ao Japão, onde o chef e a sua equipa estudaram bem o uso da robata — conte com corvina marinada com cebola roxa e abacate; com arroz de carabineiros, caranguejo e amêijoas, ou com carabineiro escalado com molho maré. Já o capítulo “Na Frigideira” é dedicado aos apreciadores da carne e, assim, inclui desde bife de lombo, molho à café e batata frita ou bifinhos de vitela branca, molho de mostarda e alcaparras.
O Maré fica na Avenida Nossa Senhora do Cabo 9000, em Cascais. O número é o 916 001 527. Está aberto de quarta-feira a domingo para almoço e jantar.
O sonho de uma casa de férias que virou vila: a Casa Nossa
A Casa Nossa – The Lake Farmhouse é a primeira aventura do chef e empresário no universo da hotelaria. Ao lado da mulher, Sofia Ulrich, José Avillez comprou em 2019 um terreno de 65 hectares. A história arranca com a vontade em construir uma casa de férias.
“Isto começou com a possibilidade de fazer um projeto pessoal, algo para a família, para descansar de vez em quando. Começámos a ver uma série de locais no Alentejo — tirávamos as segundas-feiras para irmos visitar”, conta. E foi em Campino, no Alqueva, que esta incursão parou e, simultaneamente, mudou de rumo “Um dia chegámos a esta propriedade, muito acima do valor que tínhamos pensado pagar, e apaixonámo-nos completamente”.
Na altura, existia apenas uma ruína no espaço que é agora ocupado pela Casa Nossa, cujos alicerces se inspiram na arquitetura alentejana. Uma vila com capacidade para 20 pessoas, com um grande lago, desenhada para ser alugada por inteiro, com pensão completa e serviço que promete ser idêntico ao de um hotel de cinco estrelas. “A ideia foi nunca transformar num hotel, é suposto os hóspedes terem uma vivência de casa.”
Inaugurada a 7 de março, tem 10 suites, duas piscinas, garrafeira, sala de provas de vinhos, ginásio, padel, sala de espetáculos, cinema, campo de ténis e serviços como massagens, aulas de ioga e passeios de barco pelo lago.
A cozinha segue o modelo “farm to table”, não se abastecesse, em parte, na horta da Casa. A cozinha é “menos gastronómica, no sentido da alta cozinha” e mais próxima de um registo familiar. “É muito o que eu gosto de comer em casa — ou gostaria, se tivesse mais tempo.”
Apesar de só poder alugada por inteiro (4.500€ pelo mínimo de seis pessoas, com pensão completa), acontecem pontualmente as open weeks, em que se disponibilizam bilhetes por quarto. “A ideia será fazer quatro a cinco vezes por ano”.
E outros projetos? “Agora, mais nada. É cuidar dos que já tenho.”
A Casa Nossa fica em Campinho, em Reguengos de Monsaraz, no Alqueva. As reservas devem ser feitas para casanossa@joseavillez.pt. A partir de 4.500 euros por noite para o aluguer integral da casa.