Marcelo Rebelo de Sousa falou por quatro vezes antes da hora em que era previsto juntar-se às comemorações do 10 de junho em solo nacional e, antes da chegada de António Costa a Peso da Régua, fez um aviso ao primeiro-ministro: está a tempo de mudar. Leia-se, remodelar. “Em política é sempre possível quem está nas oposições como no Governo, ir sempre percebendo que há novos desafios, que mudanças é preciso fazer, muitas vezes de pessoas, outras de ideias, outras de projetos”, avisou o Presidente da República.

O chefe de Estado exortou quase António Costa (embora também refira as “oposições”) a fazer uma reflexão introspetiva, das que se fazem em frente ao espelho: “O que posso fazer para que seja melhor?” Para Marcelo passa pela tal mudança de “pessoas”: a remodelação governamental. E, se de manhã atirava qualquer posição para julho, o chefe de Estado acabou por voltar a justificar a decisão de dia 4: de dar um aperto ao Governo, mas não avançar para a dissolução da Assembleia da República.

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“Quero ser muito sincero: havia muitos comentadores que queriam que eu dissolvesse. E eu tinha a noção que o povo não queria que eu dissolvesse. [O povo] queria que eu realmente chamasse à atenção do Governo para dizer aquilo que disse no dia 4″, disse Marcelo, já respaldado pelos resultados das sondagens que mostram que os portugueses apoiam as decisões que mudou. Mas, aproveitando a validação e capital político desses estudos de opinião, manteve o grau de ameaça e a sugestão de que haja remodelação: “Às vezes é preciso mudar o que não está bem, antes que seja depois muito tarde. Foi isso que eu quis dizer. Foi uma prevenção.”

[Ouça aqui a reportagem da Rádio Observador]

Marcelo, ex-comentador, deixa recados a Costa

Marcelo avisa ainda de forma velada Costa que é o primeiro-ministro que deve pensar em mudar, até porque ele, que é mais velho, tem mais dificuldade em recuar numa posição: “Eu sei que é difícil, tenho a ideia que aos 74 é mais difícil mudar do que aos 64 [Costa tem 61 anos], aos 54, aos 34.”

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Já no confronto direto com os comentadores que exigiam do chefe de Estado uma posição mais forte, o Presidente puxou dos galões da sua maturidade e da sua experiência política e pessoal, lembrando que já viu “o salazarismo cair, o marcelismo cair, vários governos caírem, Presidentes que passaram, já vi primeiros-ministros que passaram”. E acrescentou: “Vi dos dois lados: vi tendo responsabilidades políticas e vi estando na televisão e na rádio a comentar”.

Ao mesmo tempo, lembra assim que ele próprio já foi comentador. “Sei o que é estar do lado dos comentadores e do lado dos comentados. Portanto, eu não me irrito se do lado dos comentadores disserem de mim o que eu disse muitas vezes do que comentavam. Eu também dizia, mas sei relativizar tudo”, comentou. Mas deixou um outro aviso para quem desvaloriza esses comentadores que lhe pediam a dissolução: “Também não é verdade que digam aos que comentam ‘isso não tem importância nenhuma’, que eles estão lá para isso e que estão no mundo à parte.”

Marcelo Rebelo de Sousa, que vai passar as comemorações do 10 de junho em Peso da Régua, fez antes uma ‘sondagem Santini’ pela cidade capital do Douro Vinhateiro. E, na sondagem popular, fez uma distinção. Sugeriu que “os casos e casinhos” de Lisboa nem sempre interessam às pessoas do interior. Diz que um “casinho”, se significar má aplicação de dinheiro público, pode ser um “casão”. Porém, outros casos — vividos de forma muito intensa pela “bolha política” — fazem parte da “política que é mais de debate político que, por vezes, apaixona mais quem vive nas grandes cidades, nas grandes metrópoles, ou quem está mais metido na vida política, mas chega menos às preocupações das pessoas [das zonas menos populosas].”

António Costa vai juntar-se em breve às comemorações e irá assistir com Marcelo Rebelo de Sousa a um concerto e ao lançamento de fogo de artifício que estão inseridos nas comemorações do 10 de junho.