A Alpine anunciou este fim-de-semana, em que se disputou a 100.ª edição das 24 Horas de Le Mans, que em 2024 vai trocar a sua presença no Campeonato do Mundo de Resistência (WEC) na categoria LMP2, a segunda mais competitiva, pelos Hypercar, a categoria principal que engloba os modelos que se batem pela vitória. Os novos Alpine A424 irão assim enfrentar Ferrari, Toyota, Cadillac, Peugeot e Porsche, as seis marcas que disputam entre si as primeiras posições, com a Glickenhaus e a Vanwall a fazerem-se representar por Hypercars não híbridos e, por isso mesmo, impossibilitados de lutar pela vitória.
À frente da direcção técnica da equipa da Alpine para o WEC está o engenheiro Bruno Famin, o francês que já desempenha funções similares na equipa da marca que milita na F1, tendo alcançado a 4.ª posição, atrás da Red Bull, Ferrari e Mercedes. Por muito mais complexa que seja a F1, o WEC obriga as equipas a enfrentar desafios diferentes, mas não menos exigentes, associados à resistência, uma vez que mecânicas, chassi e pilotos têm de disputar corridas de 24 horas como se tratassem de provas de sprint com apenas 60 minutos.
Ainda antes do A424 ver a primeira bandeira de partida, Famin já teve de tomar decisões difíceis, como por exemplo escolher o tipo de veículo a utilizar. O actual regulamento dos Hypercars, na ânsia de reunir um maior número de marcas interessadas em participar, junta os LMH (Le Mans Hypercar) concebidos para o WEC aos LMDh (Le Mans Daytona hybrid) destinados ao IMSA, a norte-americana International Motor Sports Association. A primeira questão que colocámos a Bruno Famin visou tentar perceber o motivo que levou a Alpine a optar por construir um LMDh, se no WEC são os LMH os mais rápidos, como os inscritos pela Toyota e Ferrari. O director executivo da Alpine recordou que “ambos os regulamentos prevêem mecânicas híbridas, mas os LMDh permitem recorrer a um ecossistema já existente, contratar um fornecedor de chassi e de um sistema híbrido que é igual para todos”. Ora, “isto diminui o investimento e permitiu-nos [Alpine] ser competitivos mais rapidamente”, disse ao Observador o director executivo da Alpine Racing nas provas de resistência.
Bruno Famin admite que, “teoricamente, os LMH poderiam ter vantagem, mas a organização tem recorrido ao BOP (Balance of Performance) para manter equilibrada a performance de todos os carros”, como aliás ficou bem patente nas 24 Horas de Le Mans deste ano, onde além da Ferrari e Toyota, com os LMH, também a Peugeot e a Porsche passaram pelo comando, ambas com os LMDh. Contudo, Famin não menospreza as grandes diferenças que existem entre ambas as fórmulas para as corridas de resistência, com “os LMH a permitirem um desenho livre para o chassi e para o sistema híbrido, com um esquema mecânico que garante tracção integral, uma vez que o motor de combustão transmite a potência atrás e o eléctrico ao eixo dianteiro” (mas que o regulamento apenas permite que funcione a partir dos 120 km/h para limitar a vantagem). O director técnico recorda, por outro lado, que os “LMDh partilham o chassi e o sistema híbrido, o que reduz em muito os custos e o tempo de desenvolvimento, com o motor de combustão e o eléctrico a transmitirem a potência ao eixo traseiro”.
Alpine revela Hypercar híbrido para as 24 Horas Le Mans de 2024
A meio desta troca de palavras com Bruno Famin, ocorreu-nos questioná-lo igualmente sobre a razão que levou a Alpine/Renault a preferir não desenvolver o seu próprio sistema híbrido, pois conceber um LMH permitir-lhe-ia aproveitar a experiência acumulada ao longo dos últimos sete anos na F1 com mecânicas híbridas. Famin explicou que “a convergência dos regulamentos LMH e LMDh tornou estes últimos mais baratos, mais interessantes e mais rápidos de desenvolver”. E a necessidade de igualar a rapidez em pista de ambos foi conseguida à custa de sacrificar as vantagens dos LMH, que passaram a só poder recorrer ao motor eléctrico montado no eixo dianteiro a partir de 120 km/h, valor que sobe para 140 km/h em piso molhado, onde teriam mais vantagens.
A opção por um chassi Oreca é justificada por Famin com a longa parceria que mantêm com este fabricante francês, tendo o homem forte da Alpine chamado a atenção para o facto do chassi que vão utilizar “não ser uma base do actual LMP2, mas sim um chassi diferente, idêntico ao utilizado pela Acura (Honda) no IMSA e que poderá vir a originar os próximos LMP2″, categoria que entretanto se deverá tornar independente, uma vez que deixa de integrar o WEC a partir de 2024. Para o motor de combustão, Bruno Famin avança que a decisão foi “optar por o 3.4 V6 da Mecachrome, que depois foi melhorado pela Alpine, recorrendo aos ensinamentos retirados da F1, para incrementar a resistência e a eficiência”.