A Direção Executiva (DE) do SNS proibiu, na passada sexta-feira, os gabinetes de comunicação e os respetivos assessores dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde de responderem diretamente a questões e de prestarem esclarecimentos aos meios de comunicação social sem antes se articularem com o organismo liderado por Fernando Araújo. Os hospitais receberam indicações para encaminharem as questões dos jornalistas para a DE, de modo a “controlar a informação” que é transmitida, diz um assessor de imprensa ao Observador. “É a lei da rolha. Estou chocada”, critica uma outra assessora de imprensa ouvida pelo Observador.
A indicação, que foi transmitida aos assessores num “tom desagradável”, terá surgido na sequência de uma entrevista concedida por um presidente de um hospital, em que foi abordado o plano para as maternidades e as urgências de obstetrícia — é precisamente a DE que tem assumido a reorganização das urgências em todo o país.
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Na troca de mensagens entre a DE e os assessores hospitalares, que aconteceu num grupo de Whatsapp, e a que o Observador teve acesso, um dos membros da DE, o médico Francisco Goiana da Silva, escreve:
“Não acontecem depoimentos, nem declarações, nem comunicados, nem respostas à comunicação social sem articulação prévia com a assessoria de imprensa da DE do SNS ou comigo próprio. Agradeço articulação de todos no sentido de garantir alinhamento com os OCS [órgãos de comunicação sociais] nas respostas do SNS”.
De seguida, um assessor questiona:
_ “Estão a falar em termos gerais, de temas que envolvem vários hospitais, ou de pedidos específicos que envolvem a instituição, nomeadamente de OCS regionais?”
— “Estou a falar de tudo”, responde o mesmo responsável da DE.
Nos gabinetes de comunicação de muitas unidades hospitalares sente-se o desconforto. As restrições de comunicação passam agora a incluir qualquer tema e qualquer órgão de comunicação, até os regionais.
Com décadas de trabalho na área da assessoria, um dos assessores contactados pelo Observador considera a situação “surreal e inédita”. “Disseram-nos: ‘Temos de falar a uma só voz’. Os presidentes dos conselhos de administração estão proibidos de falar.”
Ouça aqui o Direto ao Assunto com Xavier Barreto, presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares
“Os hospitais não têm autonomia para comunicar?”, questionam assessores
Esta proibição “vai destruir a comunicação dos hospitais”, alerta a assessora de um grande hospital. “Já no tempo da ministra Marta Temido era assim. Tentavam o silêncio comunicacional. Mas não chegaram a este ponto”. Sob anonimato, esta responsável questiona: “Os hospitais não têm autonomia para comunicar? Isto é muito grave.”
“Como é que vamos fazer comunicação de crise assim?“, pergunta a mesma assessora, sublinhando a demora excessiva que o gabinete de imprensa da DE demonstra quando tem de responder aos assessores hospitalares. Segundo o Observador apurou, a assessoria de imprensa da DE conta com apenas três elementos, o que “torna impossível” responder a todos os pedidos, a que se juntam os que vêm diretamente dos órgãos de comunicação e não passam pelos hospitais.
Os assessores hospitalares contactados pelo Observador sublinham ainda outro ponto: a DE não tem, garantem, “base legal” para impôr estas restrições, uma vez que esta entidade não tem sequer estatutos aprovados, apesar de ter sido criada há mais de nove meses. Questionado sobre a demora na elaboração dos estatutos, o Ministério da Saúde prevê que “estejam aprovados até ao final do primeiro semestre de 2023”. A tutela justifica o atraso com o facto de se tratar “de um novo instituto, que envolve cuidadosa articulação com alterações a introduzir na orgânica de outras instituições do SNS”.
Questionada pelo Observador sobre as razões que levaram à imposição destas restrições na comunicação dos hospitais, a DE diz que “a linha de atuação da DE-SNS tem sido de profunda proximidade e articulação com todas as Unidades que compõem o SNS” e que “é uma prática importante e natural que essa articulação aconteça no plano da relação com a comunicação social”. “Trata-se de um exercício de articulação tendo em vista a transmissão de informação correta e objetiva à população. As unidades de saúde mantêm naturalmente a sua autonomia e relação direta com a comunicação social”, garante a DE.