Os fãs de Indiana Jones conhecem bem o seu medo de cobras (ofidiofobia, é o nome técnico), mas Harrison Ford, o ator que encarnou o arqueólogo aventureiro, não receia estes animais e agora até tem uma com o seu nome.

Tachymenoides harrisonfordi é o nome da espécie recém-descoberta no Peru. Ford sente-se lisonjeado, mas interroga-se porque é que escolhem dar o seu nome a animais que assustam as crianças — antes tinha sido a aranha californiana Calponia harrisonfordi e a formiga Pheidole harrisonfordi.

Estes cientistas continuam a batizar criaturas com meu nome, mas são sempre as que aterrorizam as crianças. Não entendo. Passo meu tempo livre a fazer ponto cruz. Canto canções de embalar para os meus pés de manjericão, para que não tenham medo da noite”, disse Ford à Conservation International, organização ambientalista sem fins lucrativos da qual é vice-presidente.

A serpente de riscas cobre e pretas ao longo do corpo e olhos cor de âmbar media apenas 40 centímetros e não é perigosa para os humanos. Mas a sua camuflagem é perfeita para caçar lagartos e sapos no meio da vegetação das zonas húmidas de altitude, no sul dos Andes. A descrição da nova espécie aparece na revista científica Salamandra.

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Uma expedição que se cruzou com a rota do narcotráfico

Harrison Ford não participou na expedição, mas o enredo real era digno de uma aventura do Indiana Jones, como conta a Conservation International em comunicado de imprensa: inclui locais remotos e narcotraficantes.

O primeiro desafio era chegar ao Parque Nacional de Otishi, uma das paisagens de pastagem menos exploradas do planeta onde praticamente só se consegue chegar de helicóptero. Depois, percorrer a região que tem o sugestivo nome de “vale da cocaína do Peru”. Depois de tudo isso, acabaram por montar acampamento junto a uma pista clandestina usada por um cartel.

Um dia, o biólogo Edgar Lehr, líder da expedição que juntou investigadores do Peru e dos Estados Unidos, ouviu vozes desconhecidas no walkie-talkie — alguém estava a usar a mesma frequência de rádio que a equipa de investigadores. Noutro, ouviu um ruído sobre a tenda, que pensou ser de um beija-flor, mas que era de um drone a espiá-los. Mais tarde, encontrou pegadas à volta do acampamento. Quando ouviram o som de um avião por perto ao 11.º dia, decidiram que era melhor terminar a expedição mais cedo — mas o helicóptero de resgate só chegou quatro dias depois.

Map of Peru with the Otishi National Park outlined in blue, the Asháninka Communal Reserve on its west side, and the Machiguenga Communal Reserve on its east side outlined in red.

Localização do Parque Nacional de Otishi (assinalado a azul, a linha de dentro), a este de Lima, na Cordilheira dos Andes — Lehr et al. (2023) Salamandra

Mesmo com os narcotraficantes no seu encalço, a expedição teve os seus pontos positivos: encontraram um macho de Tachymenoides harrisonfordi enroscado ao sol e deram nome a uma cascata, a um pântano e a uma nova espécie de lagarto, Proctoporus titans. “Há tanto por descobrir aqui. Receio que não seja possível fazer mais investigação aqui”, lamentou o investigador da Universidade Wesleyan, de Illinois.

Harrison Ford que há décadas é um ativo defensor da natureza destacou que a descoberta da nova espécie que agora tem o seu nome “é um lembrete de que ainda há muito a aprender sobre nosso mundo selvagem – e que os humanos são uma pequena parte de uma biosfera incrivelmente vasta”.

Estima-se que existam cerca de 8,7 milhões de espécies no planeta, ainda que só cerca de 1,2 milhões tenham sido já encontradas e descritas. Muitas das espécies serão extintas antes sequer de terem sido encontradas pelos cientistas.