O chá produzido na ilha de São Miguel tem uma considerável bibliografia histórica e económica, compatível com a sua relevância local e regional, mas conta a partir de  agora com este pequeno livro dirigido aos jovens que visitem a ilha e queiram saber algo mais sobre como foi que, tal como a laranja, o ananás e o tabaco, o chá se tornou um produto tão distintivo dos Açores.

Cruzando os desenhos de Mariana Rio, que nos habituámos a admirar em publicações da Pato Lógico, do Circo de Ideais e de outros editores, com a hábil narrativa de Maria Emanuel Albergaria, uma micaelense que se estreia na subtil arte de contar para crianças, este novo projeto da Araucária beneficia igualmente da mestria visual de José Albergaria como designer gráfico e da colaboração de certa forma prestigiante do fotógrafo Daniel Blaufuks (sugerida, creio, por trabalhos seus na antiga Guimarães industrial), além do arquivo da própria Gorreana e da dinastia dos seus proprietários.

É sem dúvida um objeto sedutor dirigido a quem visita a fábrica museu-loja envolvida por plantações listradas a perder de vista (23 hectares), mas vai muito além disso, como evidência da admirável ação visionária da aristocracia micaelense, que dá a quem a ignore por completo o pretexto ideal para saber mais e surpreender-se de facto (lendo, por exemplo, Os Cantos. A tragédia de uma família açoriana de Maria Filomena Mónica, 2018, 432 pp.).


Título: “Chá nos Açores. Uma tarde na Gorreana”
Texto: Maria Emanuel Albergaria 
Ilustração: Mariana Rio 
Fotografia: Daniel Blaufuks 
Design: José Albergaria 
Editora: Araucária 
Páginas: 76 

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Maria Emanuel Albergaria trabalha no edifício da Biblioteca Nacional de Portugal e parece ter-se inspirado em Luísa Ducla Soares, que publicou com Mariana Rio um livro sobre a instituição no qual a figura de Francisco Ribeiro Sanches, seu primeiro diretor, salta do respetivo quadro de parede para se tornar o cicerone da visita (Imprensa  Nacional e Pato Lógico, 2019), fazendo do sonho da pequena Rita de 9 anos a ocasião para o surgimento de Lau-a-Pan, o mestre manipulador das folhas do chazeiro que em 1878 foi contratado em Macau para vir ensinar a sua arte nos Açores.

Ele e o açoriano Armando, um primo de José do Canto e membro da Sociedade Promotora da Agricultura Micaelense, que aparece e desaparece em nuvens de vapor de chá, tudo explicam à curiosa menina, antes da visita à fábrica que produz três tipos de chá preto e depois duma viagem até Ponta Delgada, onde a Granja da Gorreana lhe é apresentada como quinta experimental por intervenção de Jaime Hintze, de 1914 a 1945, que ali planta amoreiras para a produção de seda, cria abelhas para se faz mel e até gansos para a  produção de fouxel para almofadas e estolas. A grande vaga de emigração açoriana dos anos 1960-70 e os desmandos de 1974-75 fizeram estremecer a Gorreana, que ao contrário de outras fábricas de chá (como de tabaco) em São Miguel soube aguentar-se e hoje manifesta um claro renascimento comercial — uma marca bem instituída, com  embalagens modernizadas e novos produtos.

Acompanhando o crescente interesse turístico pelos Açores, talvez um dia possa surgir uma edição em língua inglesa deste muito simpático e reconfortante livrinho.