O plano anunciado no final de 2022 será respeitado: a partir desta terça-feira, a Zona de Emissões Ultra Baixas (ULEZ, na sigla em inglês), medida criada para combater a poluição atmosférica, é ampliada e passa a abranger quase toda a Área Metropolitana de Londres, chegando aos arredores da capital inglesa. O que é que isto significa? Que são mais as zonas em que a Transport for London (TfL), a autoridade de transporte na capital inglesa, vai cobrar uma taxa diária de circulação aos carros mais antigos e considerados poluentes, que não respeitem os critérios de circulação nas áreas abrangidas.
Introduzida em 2019 pelo mayor de Londres, Sadiq Khan, e elaborada pelo mandato anterior de Boris Johnson, então à frente da cidade, a ULEZ começou por abranger apenas o centro de Londres, até que em outubro de 2021, Khan, do partido Trabalhista, estendeu a medida, de forma a que passasse a abranger estradas dentro da circular norte e sul da capital de Londres. Agora, chega a todos os 32 bairros da capital inglesa, o que significa que “mais 5 milhões de pessoas poderão respirar um ar mais limpo e viver vidas mais saudáveis“, declarou o autarca, citado pelo jornal The Guardian.
Na prática, o que é que isto significa mesmo?
Qual é o valor da taxa? Há multas? Quais os carros considerados poluentes? São várias questões. Mas vamos por partes. A ULEZ cobra uma taxa diária de 12,5 libras (o equivalente a 14,58€) aos condutores dos carros que não respeitem as normas estipuladas, cujo objetivo passa combater a toxicidade no ar.
As regras que determinam se um carro é ou não afetado pela ULEZ são ditadas pelos padrões europeus de emissão — os padrões de emissão “Euro” — estabelecidos pela União Europeia. Mas a lógica diz o seguinte: quanto mais antigo o carro, maior a probabilidade de este não respeitar os critérios exigidos e, assim, o seu proprietário ser obrigado a pagar a taxa.
Protestos em Londres contra taxa sobre carros mais poluentes
Assim, detalha o inglês The Guardian, carros e carrinhas a diesel que não respeitem os padrões Euro 6 (os que foram comprados novos, antes de 2015) são forçados a pagar a taxa. No caso da gasolina, o mesmo acontece com os carros e carrinhas que não sejam Euro 4 ou superiores (regra geral, comprados novos, antes de 2006). No campo das motas, aqueles que conduzem veículos que não correspondem aos padrões Euro 3 também devem pagar para entrar na zona ULEZ. Os carros híbridos e elétricos estão, regra geral, salvaguardados das taxas e multas e podem circular livremente. No site da TfL é possível verificar o carro encaixa ou não nos critérios estabelecidos.
Se um veículo que não atende aos padrões de emissão da ULEZ entra na zona sem pagar a taxa exigida, o proprietário do veículo pode receber uma multa de 180 libras (perto de 210€).
Críticas, polémicas e centenas de câmaras vandalizadas pelos “Blade Runners”
A medida tem sido alvo de duras críticas e gerado uma onda de reações negativas, com vários protestos em toda a cidade.
Apesar da autarquia de Londres ter argumentado sempre que apenas uma minoria dos carros seria afetada pela taxa — o porta-voz da Câmara de Londres disse que apenas um em cada dez carros que circulavam nos arredores de Londres não respeitavam as regras —, números apresentados pela imprensa britânica dizem o contrário.
De acordo com o The Guardian, crê-se que cerca de 10% dos carros que estão a ser conduzidos na nova zona ULEZ não correspondam às regras necessárias para não pagar a taxa. Já a RAC, uma empresa automóvel britânica, citada pelo The Independent, indica que mais de 690 mil carros registados em Londres não estão, muito provavelmente, em condições de conduzir sem pagar a nova taxa.
Além disso, o número não considera os cidadãos britânicos que entram em Londres, vindos de outras cidades e condados, aqueles que, de acordo com o The Guardian, serão os grandes prejudicados pela medida, uma vez que são forçados a pagar, sem poder tirar partido das vantagens oferecidas aos moradores na cidade — a TfL investiu, por exemplo, 160 milhões de libras (cerca de 190 milhões de euros) para um esquema de desmantelamento dos carros que não respeitem os requisitos da ULEZ, pagando duas mil libras (cerca de 2300 euros) ao proprietário, desde que residente em Londres, oferecendo-lhe ainda outros benefícios, como um passe de autocarro gratuito.
Se por um lado a ULEZ é criticada pelos que desacreditam as alterações climáticas — houve quem comparasse a medida à política do distanciamento social e das vacinas contra a Covid, alegando que “não há ciência para apoiar a medida”, falando em “ataque à liberdade” —, parte considerável dos críticos acreditam que as medidas para diminuir as emissões não são mais do que uma forma de tirar dinheiro “aos que menos podem pagar” em plena crise de custo de vida. Por serem os carros mais antigos os afetados, argumentam, a medida vai prejudicar os condutores com os rendimentos mais baixos, aqueles que não conseguem substituir os seus carros.
Mas há mais: a expansão da ULEZ levou à criação de um grupo ativista anónimo, os “Blade Runners”, cujo objetivo passa por destruir as 2.750 câmaras instaladas em Londres para controlar os carros que circulam na cidade e garantir que as taxas são pagas. O The Independent estima que 380 câmaras tenham já sido alvo de vandalismo, com as autoridades a relatarem 185 cabos destruídos, 164 câmaras roubadas e 38 obscurecidas. De acordo com o relato de um dos participantes do grupo ao Mail Online, este já conta com 100 membros.
Segundo o tabloide inglês Daily Mail, no último fim de semana foram registadas várias câmaras destruídas, incluindo uma incendiada. No sudeste de Londres, indica o mesmo jornal que cita uma análise obtida por dados de crowdsourcing, uma em cada dez câmaras foram destruídas. Os mesmos dados indicam que 29 das 185 câmaras em Sydenham estão a funcionar, apenas quatro estão intactas em Broley e que apenas uma está a funcionar na A225, uma estrada em Heathrow.
Como tudo começou
Integrada na agenda política verde e com o objetivo de reduzir significativamente as emissões atmosféricas poluentes e melhorar a qualidade do ar em Londres, a ULEZ foi implantada no centro de Londres, em abril de 2019, altura em que começou por abranger a mesma zona onde já era necessário pagar uma taxa de entrada durante alguns períodos do dia, a Congestion Charge. Nessa área, os carros a diesel que não respeitassem os padrões de emissão Euro 6 e a gasolina que não respeitassem os padrões Euro 4 começaram a ser taxados.
Os esforços não se ficaram por aí. Em outubro de 2021, a ULEZ foi expandida para incluir uma área mais abrangente, que se estendeu até à Zona 2 de Londres. As regras de emissões para veículos não alteraram nessa expansão.
A criação da ULEZ — medida que dá continuidade a uma série de políticas anteriores, juntando-se à tal Congestion Charge (pagamento por congestionamento), política que estabelece que é necessário pagar para aceder de carro privado a determinadas zonas do centro da cidade, em certos horários — em Londres foi uma iniciativa levada a cabo pela TfL, sob a liderança do então presidente da câmara de Londres, Sadiq Khan, que assumiu o cargo em maio de 2016, dando continuidade ao trabalho do mandato anterior, então dirigido por Boris Johnson, presidente da câmara de Londres entre 2008 e 2016.
Quando Khan decidiu alargar a ULEZ a quase toda a área da Grande Londres cinco autoridades locais, lideradas por conservadores, alegaram que a decisão era ilegal. A contestação foi, no entanto, rejeitada em tribunal em junho.