Jon Fosse é o vencedor do Prémio Nobel da Literatura 2023, “pelas suas peças de teatro e prosas inovadoras que dão voz ao indizível”, anunciou a Academia Sueca esta quinta-feira, a partir de Estocolmo. Fosse sucede a Annie Ernaux, distinguida no ano passado, pela “coragem e acuidade clínica com que desvenda as raízes, os estranhamentos e os constrangimentos coletivos da memória pessoal”.
O romancista, dramaturgo e poeta norueguês era há vários anos um nome apontado nas apostas para o Nobel da literatura, mas a Academia Sueca tem optado por premiar fora das listas de favoritos. Por altura do anúncio, a Academia informou que tinha já contactado Fosse por telefone e que já teriam falado de questões práticas, como a entrega do galardão numa cerimónia que acontecerá em Dezembro.
“Estou emocionado e grato. Vejo isto como um prémio à literatura que, acima de tudo, pretende ser literatura, sem outras considerações”, reagiu Jon Fosse à notícia do Nobel, num comunicado divulgado pela sua editora, Samlaget, e citado pela Time.
Em Portugal, a ficção de Jon Fosse tem sido publicada em pela chancela Cavalo de Ferro, que além de Trilogia (2014) e Septologia (2009-2021), editou ainda Manhã e Noite (2015). O seu trabalho enquanto dramaturgo também está disponível em português através da coleção que a editora Cotovia (extinta em 2020) tinha com a companhia de teatro Artistas Unidos, que várias vezes levou à cena peças do autor norueguês. Jorge Silva Melo, histórico encenador e fundador da companhia, que morreu no ano passado, era inclusivamente amigo do escritor. Antes da sua morte, Silva Melo estava a planear a encenação de Vento Forte — acabaria por ser António Simão a dirigir a peça, que se estreou em janeiro no Teatro da Politécnica. O texto foi editado em conjunto com a peça Foi Assim, também de Fosse, em mais um título da coleção Livrinhos de Teatro, desta feita através da editora Snob.
Nascido em 29 de setembro de 1959, em Haugesund, Noruega, Fosse é uma figura proeminente da literatura internacional e um dos dramaturgos europeus mais encenados no mundo. As suas obras exploram frequentemente temas como o existencialismo e as relações humanas, sob um estilo minimalista.
Jon Fosse entre os demónios da criação: “Escrever sobre o que já conheço não me interessa”
Fosse escreveu o seu primeiro romance aos 20 anos, publicado em 1983, Raudt, svart, um livro que aborda o tema do suicídio e que acabaria por estabelecer o tom para o trabalho posterior. Escreveu mais de uma dezena de livros — de romance, poesia, ensaio e até literatura infantil. A partir da década de 90, virou-se para a escrita teatral e escreveu “cerca de 30 peças”, recorda ao Observador. “Depois achei que já chegava. Quis acalmar a minha escrita, a minha vida, tudo. Deixei de escrever para teatro e voltei aonde tinha começado: aos romances, à prosa.” Na última década e meia tem-se dedicado de novo a este registo.
O mais recente livro, O eu é um outro — Septologia III-V (Cavalo de Ferro), chega às livrarias portuguesas a a 6 de novembro. É a história de um pintor que observa como, não sendo detentor de grande talento, consegue subsistir do seu ofício divide-se em sete capítulos reunidos em três livros. O primeiro título da saga chegou a Portugal no final de 2022, O Outro Nome – SeptologiaI-II (Cavalo de Ferro), com o segundo agora editado fica em falta apenas o derradeiro.
“Quando consigo escrever bem, sinto-me conectado com algo que não sou eu de certeza”, disse em entrevista ao Observador em dezembro. “Escrever é, para mim, um ato de escuta. O que escrevo vem do que já escrevi antes, no mesmo texto, e de algo mais. Não é a minha imaginação, é algo que, de alguma forma, me é dado. É uma dádiva.”
O Nobel da Literatura é entregue desde 1901, ano em que a distinção foi atribuída ao poeta francês Sully Prudhomme. De acordo com Alfred Nobel, que criou o galardão, este deve ser entregue a autores de qualquer nacionalidade que tenha “produzido o mais extraordinário trabalho de forma idealista” no campo da literatura. Esta é a 116.ª vez que é entregue, a 120 pessoas: 103 homens e 17 mulheres. Tem um valor monetário de 11 milhões de coroas suecas, perto de 950 mil euros.