Indo um pouco mais além das respostas habituais sobre a independência da Justiça, José Luís Carneiro pediu, esta quarta-feira, “rigor” e “celeridade” ao poder judicial na investigação que levou à demissão de António Costa e admitiu que pode ser útil contar com explicações da procuradora-geral da República. O candidato à liderança do PS quer, de resto, avançar com uma proposta de “debate alargado” que leve a uma reforma da Justiça.
Em entrevista à TVI e à CNN, o atual ministro da Administração Interna foi questionado sobre se Lucília Gago deve dar explicações sobre este processo e respondeu: “Tudo o que possa ser feito para esclarecer e tranquilizar a sociedade” em relação à sua confiança nas instituições, e tendo em conta o “impacto” que um caso destes tem nessa confiança, será “adequado”.
Precisamente por causa desse impacto e pela “sensibilidade” do caso, Carneiro acrescentou alguns avisos à Justiça, que deve poder manter a sua independência mas também ser “célere”: “Deve merecer das autoridades judiciais toda a ponderação e cuidado no que diz respeito ao rigor de procedimentos”. E juntou a isto mais um alerta dirigido ao Ministério Público: “As pessoas não podem ter a sua vida suspensa indefinidamente sem que a Justiça se faça. Não podemos aceitar isso”.
Numa altura em que se ouvem várias vozes no espetro político lembrando que os partidos também têm responsabilidade por não ter feito as alterações que agora dizem ser necessárias no sistema judicial, o candidato avançou que vai incluir uma proposta para um “debate alargado” entre os partidos democráticos, o poder judicial e o MP sobre a reforma da Justiça, e que inclua aspetos como a rapidez dos processos, os obstáculos colocados pelos megaprocessos, a transparência e a “cultura de prestação de contas” a que os órgãos de soberania devem estar sujeitos.
A entrevista de Carneiro foi também marcada por um recuo: depois de ter dito, na primeira entrevista que concedeu enquanto candidato, que não seria por si que o Chega chegaria ao poder — dando a entender que viabilizaria um governo minoritário do PSD –, Carneiro fez marcha atrás de várias formas: primeiro, garantindo que vai às eleições para as ganhar, pelo que o cenário não se coloca; depois, que conseguirá uma ampla maioria; e por fim, que seguirá o exemplo de António Costa na fase pré-geringonça e reunirá os órgãos do partido após as eleições para tomar uma decisão, pelo que acabou por não se comprometer com nenhum cenário pós-eleitoral.
Quanto ao adversário, garantiu por várias vezes que não se candidata apenas “em oposição” a Pedro Nuno Santos e que tem “carisma” que baste para vencer — esse carisma também o ajudou a ganhar três eleições autárquicas sucessivas em Baião, argumentou — mas acabou por disparar diretamente contra o oponente, ao dizer que o que os “separa” é que Carneiro “não demoniza” o centro político e o seu eleitorado.
No seu entender, é precisamente essa capacidade de “disputar” o centro que o torna um melhor candidato a primeiro-ministro, assim como a “previsibilidade e segurança” que conseguirá oferecer ao eleitorado em tempos conturbados.
O ministro da Administração Interna, ali na qualidade de candidato, ainda teve tempo de explicar algumas das suas propostas e posições em relação aos temas quentes da atualidade. Na Saúde, disse ter “vontade” de incluir na sua moção um acordo com as misericórdias e instituições particulares de solidariedade para que trabalhem em articulação com o SNS, assim como que haja uma contratualização de cuidados de saúde nessas instituições e um reforço das unidades de saúde familiar modelo B e das unidades locais de saúde.
Quanto à privatização da TAP, frisou que as decisões tomadas pelo Conselho de Ministros são “para respeitar” e que é preciso garantir que o hub de Lisboa é salvaguardado no caderno de encargos, bem como as ligações com a diáspora. A privatização, “como tem dito o primeiro-ministro”, deve ser feita “sem pressa”, “quando seja possível sem colocar em causa o seu valor”.
O candidato à liderança do PS rematou garantindo estar disponível para debater com os dois oponentes nesta corrida interna: Pedro Nuno Santos e Daniel Adrião. Resta saber se a disponibilidade é mútua.