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Prisioneiros palestinianos libertados contam como viveram nas prisões israelitas

Este artigo tem mais de 1 ano

Eram alvo de violência, ficavam privados de comida e de água. Israel proibiu palestinianos de celebrar libertação de prisioneiros e de falar com a imprensa, mas muitos contaram as suas histórias.

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Mohammed Al-Awar reencontra o pai depois de libertado de uma cadeia israelita

AFP via Getty Images

Mohammed Al-Awar reencontra o pai depois de libertado de uma cadeia israelita

AFP via Getty Images

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As comemorações foram proibidas por Israel e alguns prisioneiros chegaram a ser avisados de que se celebrassem a sua libertação voltariam para a prisão. Apesar disso, e de alguns deles relatarem que a polícia israelita visitou as suas casas e impediu familiares e amigos de receberam os prisioneiros libertados (em troca dos reféns feitos pelo Hamas a 7 de outubro), as ruas de Jerusalém encheram-se de palestinianos em cada uma das três vezes que os prisioneiros regressaram a casa.

Os relatos das mulheres e dos rapazes, todos menores de idade, são em tudo semelhantes: nas prisões, a violência era habitual, as condições desumanas e muitas vezes faltava comida e bebida.

“Os guardas prisionais israelitas torturaram as mulheres presas, espancando-as, pulverizando-as com gás e enviando-as para a solitária”, afirmou Maysoon Musa Al-Jabali, apresentada pela imprensa local e internacional como a mais velha das mulheres detidas nas cadeias israelitas. “Os guardas disseram-nos que tinham luz verde para fazer qualquer coisa”, contou a mulher, libertada ao fim de oito anos de detenção.

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Malak Salman: “Os últimos 48 dias foram piores do que os outros 8 anos”

“Mãe, mãe, mãe.” No vídeo em que Malak Salman se reencontra com a mãe, nada mais se ouve, a não ser aquelas palavras. Quando foi detida em Jerusalém, em 2016, Malak Salman tinha 16 anos. As alegações para deter a jovem palestiniana eram graves: tinha uma faca escondida na mala da escola — descoberta quando foi revistada pela polícia fronteiriça — e terá tentado esfaquear um agente israelita. Malak, que sempre negou as acusações, foi detida sem sofrer quaisquer ferimentos e, um ano mais tarde, em 2017, foi condenada a pena de prisão por tentativa de homicídio e posse de arma.

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Malak Salman (terceira a contar da esquerda) esteve detida durante 8 anos

Anadolu via Getty Images

Oito anos depois de cumprir uma pena de 9, saiu da prisão durante a primeira libertação de prisioneiros palestinianos das prisões israelitas em troca dos reféns do Hamas. “Prenderam-me aos 16 anos, privando-me da minha mãe, da minha família, da minha escola”, disse Malak à TRT World, emissora pública turca. “Eles levaram-me quando era uma criança e volto como uma jovem mulher. Tive de viver a minha infância sem a minha mãe.”

Ao longo desses oito anos, Malak conta que passou por situações muito desafiantes, que estava constantemente sujeita a pressão embora, ao mesmo tempo, ela e as outras prisioneiras tentassem manter-se fortes.

“A opressão escalou depois do ataque de Aqsa de 7 de outubro. Eles queriam vingar-se em nós. Apesar de sermos mulheres, não mostraram qualquer piedade. Atacavam-nos violentamente com armas, mesmo em sítios onde havia homens presentes”, conta a jovem que relata que na cadeia israelita também lhes era negada comida e água para beber. “A prisão em que estive não era indicada nem para mulheres, homens ou animais.”

A situação das prisioneiras era “terrível”, conta Malak, frisando que, por muito que tente descrever, não consegue transmitir o que passou. “Não nos deixavam partilhar as refeições entre nós. Às vezes, racionávamos as nossas próprias refeições para partilhar com as amigas, mas tinha de ser em segredo”, recorda Malak, que acusa os guardas de descarregarem as suas frustrações políticas nas prisioneiras. “Passei 8 anos na prisão, mas os últimos 48 dias foram muito piores do que os outros 8 anos.”

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Israa Jaabis: “A minha dor é visível”

A história de Israa Jaabis serve os dois lados do conflito: para Israel, é uma bombista suicida; para a família, uma inocente detida por engano.

“A minha dor é visível, não há necessidade de falar sobre isso”, Israa Jaabis falava aos jornalistas no dia em que foi libertada. Referia-se às queimaduras que lhe desfiguram a cara, que deixaram marcas em mais de 60% do seu corpo e que a fizeram perder oito dedos. “Também senti dor a nível emocional, e senti falta dos meus familiares, mas esse é o preço que um prisioneiro paga”, disse a mulher de 38 anos, abraçada ao filho Mutasem.

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Israa Jaabis, com flores no cabelo, ao lado do filho Matusem. A última vez que o viu, o rapaz tinha 7 anos

AFP via Getty Images

Israa, uma das mais conhecidas prisioneiras palestinianas, cumpriu 8 anos da pena de prisão de 11 anos a que foi condenada por tentativa de homicídio, e a última vez que viu o filho, Mutasem tinha 7 anos. A sua cara desfigurada foi usada diversas vezes em cartazes do lado palestiniano para ilustrar os maus-tratos das cadeias israelitas. Agora, diz ter “vergonha em celebrar quando toda a Palestina está ferida”.

Em 2015, Israa Jaabis mudava-se para Jerusalém, segundo os relatos da família. Dentro do carro, levava uma botija de gás, já que era um bem demasiado caro para ser descartado e que a mulher, então com 31 anos, não queria comprar de novo quando chegasse à nova casa. Durante a viagem, o carro parou várias vezes e, de cada vez que falhava, Israa sentia cheiro a queimado. Apesar dos avisos de alguns palestinianos para que abandonasse o carro, a mulher decidiu seguir. Perto de um colonato na Cisjordânia, o carro incendiou-se e pegou fogo à botija, enquanto Israa estava no interior. Ficou com queimaduras em 60% do corpo.

Nos tribunais israelitas, Israa Jaabis foi acusada e condenada por tentativa de homicídio. Foi tratada como bombista suicida, e acusada de detonar um carro-bomba quando foi intercetada por um agente israelita.

A sua família alega que o agente que a deteve, e que também sofreu queimaduras, impediu-a de sair do carro e assistiu enquanto Israa era consumida pelo fogo. Já na cadeia, Israa — que acusa Israel de ter negligenciado as suas queimaduras — exigiu uma operação plástica, que lhe foi negada.

Do tempo que passou na cadeia, Israa Jaabis — um dos 39 prisioneiros libertados a 25 de novembro — recordou como foram os últimos dias na prisão, depois da escalada de violência, que começou a 7 de outubro, com o ataque do Hamas que terminou com mais de 240 reféns nas mãos da organização terrorista.

“Eles começaram a tratar pior os prisioneiros a partir de 7 de outubro”, contou Israa Jaabis. “As raparigas experienciaram coisas na prisão que são insuportáveis de ver. No primeiro dia da escalada da violência levaram Marah Bakr [outra prisioneira libertada] para outra cela e, a partir daí, começaram a levar cada vez mais mulheres para solitárias.” Nesse mesmo dia, segundo Israa Jaabis, os guardas também atiraram gás lacrimogéneo para as celas que estavam à sua volta. “Tive uma pneumonia, os meus pulmões só começaram na melhorar a semana passada.”

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Hanan al Barghouti: “São sádicos”

“Estavámos dentro da prisão a comer amargura”, começou por dizer Hanan al Barghouti, citada pela France 24, no dia da sua libertação, 24 de novembro. A mulher de 58 anos esteve dois meses sob prisão administrativa, uma figura que permite que palestinianos sejam detidos sem ser presentes a tribunal. “Eles são sádicos. Insultam-nos e humilham-nos, mas o nosso orgulho e dignidade são altos, graças à resistência.”

Hanan al Barghouti foi detida depois de a polícia israelita ter feito uma rusga a sua casa, na Cisjordânia. A mulher é mãe de quatro palestinianos que estão detidos e é irmã de dois históricos da resistência palestiniana. Nael al-Barghouthi foi detido em 1978 e é considerado o mais velho preso político do mundo, e está condenado a prisão perpétua. Omar al-Barghouthi, que morreu em 2021, foi detido por diversas vezes e passou um total de 30 anos na prisão.

Perante as câmaras dos jornalistas, Hanan agradeceu ao Hamas pela sua libertação. “Somos os donos desta terra. Os israelitas são terroristas, são eles que nos tiraram a nossa terra. Perseguem-nos e é assim que criam a resistência dentro de nós. As nossas crianças, quando crescerem, vão tornar-se parte da resistência. Até as crianças que não nasceram vão tornar-se Hamas, quer Israel goste ou não.”

Marah Bakr: “Precisava do amor da minha mãe”

“Eu disse que Marah era linda.” Sawsan, mãe da jovem de 24 anos, cobre a filha de beijos, enquanto a recém-libertada vai repetindo que está bem. Marah Bakr, detida aos 16 anos, passou os últimos oito numa prisão israelita. Antes disso, era aluna do secundário na escola al-Maimouna, no bairro de Sheikh Jarrah, Jerusalém Ocidental.

Em outubro de 2015, Marah foi detida por ter esfaqueado um guarda fronteiriço israelita — acusação que sempre negou. Nesse dia, quando foi levada pelas autoridades, Marah foi atingida com 12 tiros, no braço e na mão, que lhe deixaram marcas para sempre. A sua pena de prisão foi de 8 anos e seis meses e aproximava-se do fim. Marah é a prisioneira de que Israa Jaabis falou, lembrando-se de a terem levado para a solitária.

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Marah Bakr, à esquerda, abraça a mãe. A jovem de 24 anos foi detida quando tinha 16 anos

Anadolu via Getty Images

“A prisão foi especialmente difícil para mim porque eu era nova e precisava do amor da minha mãe e do apoio da minha família”, contou a mulher à Al-Jazeera. “Apesar de haver muitas prisioneiras que cuidavam de mim, e que me ajudavam-me, nada pode substituir o amor de uma mãe.”

Sobre a sua libertação, Marah tem sentimentos contraditórios. “Estou muito feliz, claro, mas sinto-me devastada pela forma como o acordo foi conseguido, com o custo do sangue dos nossos irmãos e irmãs que vivem em Gaza.”

De resto, Marah contou que estava afastada das outras prisioneiras e, nos últimos tempos, não sabia o que se estava a passar. “Houve muitos tempos difíceis na prisão, mas como tudo o resto na vida, eles passaram.”

Yaser Zaamiyeh: “Algumas pessoas morreram nas mãos dos guardas”

Além das várias mulheres libertadas, também saíram das prisões israelitas vários rapazes, todos menores de idade. Um deles foi Yaser Zaamiyeh, de 17 anos, detido aos 16 anos e que, à Al Jazeera, relatou ter vivido e assistido a cenas de enorme violência.

“Trataram-nos com violência. Espancaram muitas pessoas, algumas delas morreram às suas mãos [dos guardas israelitas]”, contou Zaamiyeh. “No nosso setor da prisão, algumas pessoas abriram a cabeça. Há crianças pequenas — de 10 e 12 anos — que estão a ser tratadas com extrema violência.” Além disso, Yaser contou que os prisioneiros são alimentados com arroz seco e mantidos na cadeia a temperaturas geladas que os impedem de dormir.

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