João Cadete de Matos já mais do que cumpriu o mandato enquanto presidente do conselho de administração da Anacom, o regulador das comunicações. Nos últimos dias, estava apenas à espera da nomeação da substituta, antes de o Governo entrar em gestão. Aconteceu esta quinta-feira, enquanto estava num almoço com a imprensa.

Enquanto fazia o balanço dos últimos anos, a ministra Mariana Vieira da Silva anunciava na conferência de imprensa após o conselho de ministros a nomeação de Sandra Maximiano para a liderança do conselho de administração da Anacom.

Por ética de trabalho, explica Cadete de Matos, não comenta as palavras da sucessora, que na audição no parlamento disse que existia “desinformação dos dois lados” no tema de preços nas telecomunicações. Numa entrevista ao Eco, a economista chegou a falar em “excesso de zelo” da administração atual.

“Nunca me ouvirão uma palavra sobre os meus antecessores no cargo e não vou dizer uma palavra sobre quem me suceder no cargo”, frisa Cadete de Matos. “A única coisa que desejo é que faça o melhor mandato possível, que sirva o país e cumpra o que são as missões da Anacom”, continua. Opta por “não fazer nenhuma apreciação nem juízo de valor”, até porque diz não conhecer a economista que lhe vai suceder.

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“Quero que, de facto, que seja feliz — acho que é importante sermos felizes nas funções e que a felicidade dela seja a felicidade da Anacom e do país. A Anacom também não existe só por si, o propósito é servir o país”, lembra.

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Não tece comentários, mas tem alguns conselhos para transmitir, se tiver essa oportunidade – aliás, conforme recebeu da antecessora, Fátima Barros, que liderou o regulador de 2012 a 2017. “Algo que aprendi muito cedo nas minhas várias funções de gestão é, antes de me pronunciar sobre qualquer assunto, estudá-lo. Ouvir as pessoas que trabalham nas áreas, isso é algo que sempre fiz em toda a vida.”

Cadete de Matos, que foi do Banco de Portugal para a Anacom, assegura que esse “é um bom princípio para qualquer pessoa que está a gerir uma entidade reguladora”.

Na despedida, faz um balanço de “satisfação” por ter conseguido realizar o seu desejo de cumprir o “mandato até ao fim, até já com mais cinco meses”, reconhece. Assegura que “é possível ser um regulador independente”, embora reconheça que é uma tarefa “exigente”, “em grande parte por causa de todo o enquadramento.”

“O ponto mais exigente é garantir que todos os titulares de cargos públicos, como eu sou, estão bem resilientes nessa independência e no serviço do interesse público, porque também considero natural as pressões que existem do poder económico”, transmite.

Reconhece que gostaria de “ter ido mais longe” nas alterações à lei, conforme propôs a Anacom ao parlamento, para que “respeitassem mais as recomendações do regulador e reforçasse a sua independência”. Referia-se à proposta de alteração à lei, que reunia consenso dos membros da administração da Anacom, sobre os líderes de reguladores serem escolhidos através de concurso público, mas que não foi aprovada pelo parlamento.

“Máscara” das fidelizações vai cair com aumento da concorrência, garante

Os anos de João Cadete de Matos à frente da Anacom ficam marcados por vários momentos de fricção com os líderes dos três principais operadores de telecomunicações. Reafirma que “as empresas desistiram de competir entre elas”, já que “estão bastante confortáveis, cada uma tem um terço do mercado, têm preços altos, têm margens de rendibilidade elevadas, têm muitos lucros para distribuir aos acionistas”.

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Mas prevê que, fruto da entrada de concorrentes como a romena Digi no mercado nacional, os preços vão “fatalmente” baixar, no sentido de que terá mesmo de acontecer. “As empresas que estão no mercado vão ter de fazer aquilo que já vimos em Espanha”, recorrendo ao exemplo da Digi no país vizinho, em que o máximo de fidelização são três meses. “Os outros tiveram de acompanhar essa tendência, estou convencido de que os preços vão ter de acompanhar essa redução, senão os clientes fugiam todos.”

“Se vai haver ofertas sem fidelização, finalmente vai cair a máscara do embuste, como chamei a determinada altura às fidelizações, de que são boas para os clientes. Vai-se demonstrar que não são”, garante Cadete de Matos.