No primeiro dia enquanto primeiro-ministro de um Governo em gestão, António Costa diz-se “magoado” com o processo que deu origem à sua demissão no dia 7 de novembro e que levou à queda do Governo.

Em declarações à CNN na manhã desta segunda-feira, o primeiro-ministro diz que não se arrepende de se ter demitido do cargo. Questionado diretamente se tomaria igual decisão hoje, Costa respondeu: “Sem a menor das dúvidas”. E logo a seguir devolveu a pergunta à procuradora-geral da República, Lucília Gago, e ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, pelo papel que desempenharam na queda do Governo.

“Hoje faria exatamente o mesmo que fiz no dia 7. O que pode é perguntar a quem fez o comunicado e a quem tomou a decisão posterior de dissolver a Assembleia da República se fariam o mesmo perante aquilo que sabem hoje”, atirou.

O primeiro-ministro confirmou que só tomou a decisão de se demitir depois de a  procuradora-geral da República ter “enxertado um parágrafo final onde anunciou” haver um processo a seu respeito, no âmbito da Operação Influencer. “Aquele parágrafo foi determinante”, frisou. “Já me perguntaram muitas vezes ‘e se não tivesse havido o parágrafo?’. Eu estava a ponderar. Eu tinha pedido ao Presidente da República nessa manhã uma reunião às 9h30 da manhã. Provavelmente aguardaria pela conclusão da avaliação pelo juiz de instrução pelos indícios que existiam.”

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Depois de o comunicado ter-se tornado público, ficou sem alternativa. “Não creio que ninguém ache normal que quem é primeiro-ministro possa estar sob suspeição oficial”, afirmou. Costa acrescentou que sabe “exatamente” o mesmo que sabia antes sobre este processo. “Não sei, em bom rigor, qual a suspeita que levou à existência desse processo”.

“Posso estar magoado, mas não sou rancoroso”

O líder da maioria agora dissolvida garantiu “estar de consciência tranquila” com todo o processo, mas não deixou de sublinhar estar “magoado”. “Se me pergunta se estou magoado? Estou. Se me deixa frustrado pela segunda vez consecutiva ver interrompido o meu trabalho? Sim, porque eu gosto de fazer coisas.”

Repetindo diversas vezes a palavra “magoado”, António Costa aludiu ainda à forma como lida com as emoções. “No lado paterno da minha família fomos ensinados a não exteriorizar os sentimentos. A minha mulher acha muito negativo e acha que eu devia superar isso. Tenho pena de às vezes não conseguir, gosto de deixar os sentimentos comigo. Agora, se me pergunta se estou magoado, estou”.

“Quem não se sente não é filho de boa gente. Nunca ninguém pôs em causa a minha integridade, a minha honestidade. Ninguém ao fim de uma vida inteira gosta de ser colocado nesta posição”, afirmou.

Já em jeito de remate final, o primeiro-ministro disse ainda: “Posso estar magoado, mas não sou rancoroso. E, como sou otimista, estou confiante e vou continuar a ser”. “Se há convicção muito firme que tenho é no sistema de justiça, que é muito original, que não tem paralelo, mas onde os cidadãos podem ter a garantia e uma confiança: é que ninguém está acima da lei. Se me perguntam se eu acho normal que seja publicitada, sem que sejam praticados atos idoneidade de uma pessoa, é algo que a justiça deve refletir. Não tenho dúvidas qual é o final da história. Sei que não tive nenhum benefício, nenhum benefício indevido, para além do salário que me é pago”, frisou.

“No final, o sistema [de justiça] funciona corretamente”, acredita, lembrando os casos que envolveram o ex-ministro da Defesa, Azeredo Lopes (“a quem andaram a enxovalhar com o assalto ao quartel de Tancos”), e da Administração Interna, Eduardo Cabrita (que “até de homicídio foi acusado”), ambos absolvidos.