A Entidade Reguladora da Saúde (ERS) considerou que o Hospital de Santa Maria, em Lisboa, não garantiu os recursos humanos “aptos” no caso da grávida que morreu após transferência para o São Francisco Xavier em agosto do ano passado. Ao Observador, o Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN) refere que respeita as recomendações das entidades inspetivas e que as recomendações, que tinham sido feitas pela Inspeção Geral das Atividades em Saúde — sobre o mesmo caso –, foram implementadas.

Numa deliberação à qual a Lusa teve acesso, a ERS faz recomendações ao Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, do qual faz parte o Hospital de Santa Maria, apontando que não foi garantida “a adequação de recursos humanos aptos a assegurar a integração, qualidade e continuidade do nível de cuidados de saúde prestados à utente”.

“Além de configurar uma violação do direito à prestação de cuidados de saúde de qualidade e com segurança, constitui contraordenação (…) pelo que foi determinada a abertura dos competentes processos contraordenacionais”, lê-se na deliberação.

Ainda de acordo com a deliberação, o chefe de equipa quando determinou a composição de equipa de transporte alocou um “interno de formação específica de Ginecologia/Obstetrícia do primeiro ano que, “sem o acompanhamento por um elemento médico sénior, não garantiu a supervisão da atividade deste interno, durante a transferência, o que lhe é censurável, atenta a gravidade da situação clínica”.

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Ao Observador, o CHULN garante que “respeita as recomendações das entidades inspetivas” e adianta que “as recomendações da IGAS sobre este caso foram levadas em linha de conta em alterações de processos internos nos últimos meses”.

O Observador sabe que o chefe de equipa, que decidiu a transferência da grávida apenas com o acompanhamento de um médico interno, foi um dos profissionais que rescindiu contrato nos últimos meses, num total de seis médicos.

O caso remonta ao final de agosto de 2022, quando uma grávida com 31 semanas, durante a viagem de transferência entre hospitais, sofreu uma paragem cardiorrespiratória, tendo sido realizados trabalhos de reanimação no transporte.

O jornal Público publicou no dia 30 de agosto de 2022 que a mulher, de 34 anos, morreu e o caso gerou a abertura de vários inquéritos em várias entidades ligadas à saúde.

No dia 8 de junho, a TVI noticiou que um relatório da Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) apontava “três erros fatais” na assistência prestada no Santa Maria, nomeadamente que não foi seguida a orientação da Direção-Geral da Saúde, de julho de 2022, sobre o acompanhamento de mulheres grávidas durante a transferência inter-hospitalar.

A Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) dizia, igualmente, que o transporte não teria de ser equacionado porque, afinal, havia cama para o recém-nascido no Santa Maria.

“Tendo o relatório da IGAS sido enviado para o Ministério Público, o CHULN respeitará os trâmites judiciais e não comentará nesta fase as suas conclusões, que, como expresso no documento, foram alvo de devido contraditório nos prazos previstos no processo”, adiantou o CHULN em comunicado.

Já no Hospital São Francisco Xavier a grávida foi “submetida a uma cesariana urgente”, tendo o recém-nascido ido para a unidade de cuidados intensivos neonatais, enquanto a mãe “ficou internada nos cuidados intensivos, vindo a falecer”, segundo um comunicado do CHULN.

Este caso levou à demissão da anterior ministra da Saúde, Marta Temido, que justificou a sua saída com “a circunstância de ter acontecido um episódio que, não tendo direta relação com o desempenho assistencial do SNS, era um episódio de uma gravidade tal que era necessário que houvesse uma responsabilização”.

Na deliberação da ERS conhecida nesta quinta-feira, esta entidade emite uma instrução à CHULN para que este garanta “em permanência, que na prestação de cuidados de saúde são respeitados os direitos e interesses legítimos dos utentes, nomeadamente o direito aos cuidados adequados e tecnicamente mais corretos, os quais devem ser prestados humanamente, com respeito pelo utente, com prontidão e num período de tempo clinicamente aceitável”.

É também exigido que seja garantido “em permanência, que os procedimentos e/ou as normas são do conhecimento dos seus profissionais, logrando assim a divulgação de padrões de qualidade dos cuidados, de recomendações e de boas práticas, com vista à formação e informação dos profissionais de saúde intervenientes”.