A população em situação de sem-abrigo tem conhecido um aumento “rápido” e “exponencial”, bem como mudanças no perfil, que obrigam a “afinar” a estratégia nacional, considerou esta quinta-feira a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.

“Este fenómeno dos sem-abrigo (…) muito rapidamente ganhou uma dimensão, em termos quantitativos, que não tinha”, assinalou Rosário Palma Ramalho, no final de uma visita à Unidade de Atendimento à Pessoa em Situação de Sem-Abrigo (UAPSA) da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML), onde visitou os espaços e conversou com as equipas.

Sabendo que “é muito difícil ter informação sobre estas pessoas”, a ministra ouviu do provedor da SCML, Paulo Alexandre de Sousa, que só no primeiro semestre deste ano “houve um aumento de quase 30%” no número de pessoas que procuram aquela unidade de atendimento.

Por isso, reconhece a governante, é preciso “afinar as coisas para fazer face a um aumento tão rápido e tão exponencial”.

Os dados nacionais mais recentes remontam a dezembro de 2022, registando 10.700 pessoas na condição de sem-abrigo, mas os técnicos são unânimes em considerar que o número aumentou.

A UAPSA realizou em 2023 cerca de 15.500 atendimentos, correspondentes a quase 3.900 pessoas diferentes, e abriu 1.035 novos processos de acompanhamento.

Além disso, o perfil das pessoas em situação de sem-abrigo tem-se alterado, incluindo agora mais migrantes.

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“Neste momento, cerca de 40% das pessoas que nos procuram nesta unidade de apoio (…) são estrangeiros e isso marca uma mudança significativa face àquilo que era a realidade desta unidade”, destacou o provedor da SCML.

Paulo Alexandre de Sousa referiu “situações que hoje já são relevantes” em que “pessoas que chegam a Portugal, muitas delas com visto de turismo e que não têm assegurados os seus meios normais de subsistência (…) procuram de imediato [a unidade], em situação já de emergência, para tentar ter uma resposta”.

O Governo “está apostado em rever” a Estratégia Nacional para a Integração das Pessoas em Situação de Sem-Abrigo, que termina este ano, e a ideia, adiantou, é “alinhar” as políticas com a “mudança que existe nesta população”, nomeadamente a maior presença de estrangeiros.

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Três quartos dos migrantes que recorrem à UAPSA são homens, trabalhadores sazonais e precários, que exigem outro tipo apoio, desde logo linguístico. Perante este cenário, a ministra defende “uma resposta de proximidade”.

“Não nos interessam planos macro que sejam impostos ou que sejam iguais em todo o país, porque as situações são diferentes e são as entidades de proximidade que melhor sabem quais são as respostas que podem dar naquela situação específica com que trabalham”, considera.

A UAPSA, a funcionar desde 2015, “atende, em média, por dia, mais de 100 pessoas”, contabiliza o provedor, que acompanhou a ministra na visita guiada à unidade.

Replicando o percurso que uma pessoa em situação de sem-abrigo fará se recorrer à UAPSA, a ministra parou primeiro na zona de higiene (o banho é a primeira oferta) e foi conversando com as distintas equipas, dedicadas à saúde mental, ao envelhecimento, à empregabilidade.

Ficou a saber que, atualmente, aparecem “algumas” crianças, elementos de famílias em situação de emergência, por exemplo provocadas por despejos, e dos técnicos que lidam com as dependências ouviu pedidos de maior celeridade no encaminhamento para comunidades terapêuticas, que têm atualmente um “prazo médio seis meses para a primeira consulta”.

Na quarta-feira, o coordenador da estratégia nacional pediu um reforço orçamental, dos oito milhões de euros deste ano para dez ou onze milhões.

“A primeira coisa que nós estamos a fazer é avaliar, juntamente com o coordenador, a estratégia que estava em marcha”, realçou a ministra, recusando-se a antecipar “sobre novas estratégias sem analisar o que se passa com aquela que esteve em execução até agora”.

Sobre o relacionamento com a Câmara Municipal de Lisboa — zona onde se concentra a maioria das pessoas sem-abrigo —, a governante garante que já está a mudar.

“Estamos a trabalhar em conjunto e já reunimos várias vezes”, assegurou, reconhecendo que a autarquia da capital acabou “extravasando as suas competências”, porque nem a Santa Casa da Misericórdia nem o Governo davam a resposta necessária.