Isabella foi uma das primeiras vítimas mortais, de entre as 62 confirmadas, a ser identificada enquanto passageira do voo que saiu de Cascavel às 11h46 e que iria aterrar em Guarulhos, cidade próxima de São Paulo, no Brasil. Momentos antes de embarcar na aeronave da Voepass Linhas Aéreas, a jovem de 30 anos, que o Estadão identifica como formada em educação física e treinadora de vólei de praia, filmou a sua mala e o avião que viria a despenhar-se menos de duas horas depois em Vinhedo.
Aos poucos, e depois de todos os corpos — 34 homens e 28 mulheres — terem sido recuperados do local do acidente aéreo desta sexta-feira, no estado de São Paulo, começam a ser reveladas as histórias de quem perdeu a vida no acidente aéreo, classificado como o pior do Brasil desde 2007, quando um avião caiu e pegou fogo no aeroporto de Congonhas, também em São Paulo, matando 199 pessoas.
Entre as vítimas do acidente desta sexta-feira foram identificadas duas médicas do Hospital Oncológico Uopeccan de Cascavel. Mariana Belim e Ariane Risso, estavam entre os passageiros que morreram. No voo seguiam mais seis médicos que se dirigiam para participar num congresso em São Paulo.
A unidade hospitalar onde as duas médicas trabalhavam emitiu uma nota de condolências nas redes sociais a lamentar a perda das duas profissionais “que atendiam todos os pacientes com muita dedicação, carinho e respeito”. “Não é à toa que eram recorrentes os elogios às duas. Era muito nítido o amor que ambas tinham pela profissão”, lê-se na nota no Facebook.
A família venezuelana que voava a caminho de uma vida melhor na Colômbia
Três das vítimas do acidente eram uma família venezuelana que tinha acabado de ver frustrados os seus sonhos de uma nova vida no Brasil. Josgleidys Gonzalez viajava com sua mãe, Maria Gladys Parra Holguin, e seu filho pequeno, Joslan Perez, a segunda vítima mais nova.
Segundo o Estadão, que cita um amigo da família e uma vizinha brasileira, os três emigraram para fugir às dificuldades económicas e mudaram-se para Cascavel, mas não conseguiram regularizar Joslan, que cresceu no Brasil, mas tinha nascido na Venezuela.
[Já saiu o segundo episódio de “Um rei na boca do Inferno”, o novo podcast Plus do Observador que conta a história de como os nazis tinham um plano para raptar em Portugal, em julho de 1940, o rei inglês que abdicou do trono por amor. Pode ouvir aqui, no Observador, e também na Apple Podcasts, no Spotify e no YouTube. Também pode ouvir aqui o primeiro episódio. ]
A viagem da família não terminaria em Guarulhos, o destino do voo em que seguiam. Seguiam para Boa Vista, de onde partiam de autocarro para Pacaraima e de lá continuavam em mais uma viagem de doze horas de autocarro para chegar na cidade natal dos três. Iam para a Venezuela para regularizar a documentação de Joslan e depois seguiriam para a Colômbia, onde tinham amigos que os ajudariam a estabelecer-se no país.
Maria Parra (avó), Josgleidys Gonzalez (mãe) e Joslan Perez (filho)
Família venezuelana viajava com a cachorrinha Luna e sonhava com um futuro na Colômbia https://t.co/OQfA1H9Qs4
???? Reprodução/Redes Sociais pic.twitter.com/UBrhm2sphY
— Estadão ????️ (@Estadao) August 11, 2024
A companhia aérea Voepass confirmou que Josgleidys, a sua mãe e o seu filho estavam entre as vítimas do avião que caiu em Vinhedo, bem como a cadela de pequeno porte que tinham adotado no Brasil. Segundo os relatos dos amigos, a cadela da família, Luna, embarcou no avião com eles, porque a mãe de Joslan não suportava vê-lo separado do seu animal de estimação. A família vacinou a cadela e preencheu a documentação, conforme exigido pela companhia aérea para que pudesse viajar com eles.
Liz, de três anos, é a vítima mais nova do acidente aéreo
Viajava com o pai, Rafael Fernando dos Santos, um programador de 41 anos de Florianópolis. Liz Ibba dos Santos, de 3 anos, estava na aeronave que se despenhou em Vinhedo, no interior de São Paulo. É vítima mais jovem do desastre aéreo.
Segundo familiares, em declarações à Globo, Rafael tinha ido a Cascavel, de onde partiu o avião, para buscar a menina. Iam comemorar o Dia do Pai, que no Brasil se celebra a 11 de agosto. Os pais tinham guarda partilhada da criança. Segundo a BBC, a mãe de Liz é jornalista.
O pai trabalhava no Ministério Público de Santa Catarina, no Brasil. O órgão decretou luto oficial de três dias. “O servidor Rafael iniciou sua trajetória no Ministério Público de Santa Catarina em 2009, como programador informático. Desde então fazia parte da equipe da Gerência de Sistemas de Informação, da Coordenadoria de Tecnologia da Informação (COTEC). Recebeu diversos elogios pelo seu desempenho e comprometimento, sendo considerado rápido, eficiente e com alto grau técnico”, lê-se na nota de pesar emitida pelo órgão judicial brasileiro.
A advogada que defendia consumidores das manobras jurídicas das companhias aéreas
Uma das 62 vítimas do avião da Voepass era advogada especialista em ações judiciais contra companhias aéreas. Laiana Vasatta tinha 34 anos e ao longo da sua carreira intentou cerca de 90 ações contra companhias aéreas nacionais e internacionais, segundo o jornal brasileiro UOL.
No Instagram, produzia conteúdo sobre esta área jurídica e dava dica a passageiros de como reivindicar os seus direitos enquanto consumidor, desde reclamar indemnizações por atrasos e overbooking de voos até à recuperação de bagagem.
No Instagram, Laiana respondia com frequência às perguntas dos seguidores sobre a carreira de advogada. Partilhou as suas vivências e dificuldades por ser mulher. Relatou que teve de lidar com colegas de profissão homens, e mais velhos, que a trataram de forma inadequada. “Mas sempre procurei impor-me, estudar e qualificar-me para não passar por esse tipo de situação”, disse.
A vítima portuguesa pré-candidata a vereadora em Toledo, com família na Nazaré
Gracinda Marina Castelo da Silva é outra das vítimas do acidente aéreo de sexta-feira. Na lista de passageiros está também o marido, Nélvio José Hubner, com quem tinha três filhos, de 26, 20 e 11 anos.
Com 48 anos, a portuguesa de dupla nacionalidade tinha família na Nazaré e era pré-candidata a vereadora em Toledo, no Paraná, pelo partido Movimento Democrático Brasileiro. Tinha um doutoramento em engenharia química e era professora daquela área na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR).
No início de 2022, passou por Portugal, tendo partilhado nas redes sociais alguns dos restaurantes que visitou em Lisboa. A professora partilhava frequentemente as suas viagens de mota com o marido assim como o trabalho que tem vindo a desenvolver com a Prefeitura de Toledo.
No Facebook, o prefeito do município de Toledo, Beto Lunitti, deixou uma nota de pesar pela morte do casal, expressando a sua solidariedade à família e amigos de Gracinda e Nélvio, procurador municipal e funcionário da prefeitura casado com a portuguesa há 25 anos.
Num comunicado na rede social X, o Ministério dos Negócios Estrangeiros já apresentou as condolências a Gracinda Marina Castelo da Silva assim como o primeiro-ministro, Luís Montenegro, que em nome pessoal expressou as “mais sinceras condolências à família da Senhora Gracinda Castelo Silva, pelo trágico falecimento no acidente aéreo em São Paulo”, depois de na sexta-feira ter endereçado uma mensagem de condolências a Lula da Silva.
Neste momento de profunda dor e consternação, expresso, em meu nome pessoal, do Governo e do Povo português, as mais sinceras condolências à família da Senhora Gracinda Castelo Silva, pelo trágico falecimento no acidente aéreo em São Paulo.
— Luís Montenegro (@LMontenegropm) August 10, 2024