Um fundo de capital de risco ligado à Fosun está a angariar investidores na Ásia, sobretudo na China, para investir no BCP e na Fidelidade, detidos pela própria Fosun, podendo com esse investimento aceder ao Visto Gold em Portugal.

Na apresentação aos investidores a que a Lusa teve acesso, que está a ser feita na China mas também a investidores de outras regiões asiáticas (como Coreia do Sul e Singapura), o Aster Golden Future Portugal Fund refere que os investidores têm de investir no mínimo 500 mil euros e cumprir os requisitos para acederem ao Visto Gold (esta autorização de residência deixou de ser emitida por meio de compra de casa, mas mantém-se para outras atividades de investimento, como subscrição de unidades de participação em fundos de investimento).

A apresentação dá ainda informações sobre Portugal, como serviços públicos, custos de escolas privadas e vantagens fiscais e indica que há facilidade em imigrantes chineses se integrarem.

Segundo o documento a que a Lusa teve acesso, o fundo Aster Golden Future Portugal é gerido pela STAG Fund Management e tem como consultor de investimentos a Fosun International Assets Management (empresa do Grupo Fosun). O banco depositário dos fundos é o BCP, o consultor jurídico a CMS e o auditor a Deloitte.

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O fundo indica que investe em produtos financeiros estáveis e de baixo risco, como obrigações que permitem reforçar capital.

A apresentação aos investidores explicita o plano de alocação do capital, que passa sobretudo por investir na Fidelidade (60% do valor) e no BCP (30% do valor) e a perspetiva de altas taxas de rentabilidade (cerca de 9 e 8%, respetivamente).

Os custos de administração são de 3,5% ao ano.

Por fim, como é habitual nestes fundos de risco, a apresentação diz que não há garantia que a estratégia de investimento funcione eficazmente e que cada investidor deve avaliar a sua capacidade de investir.

A Lusa contactou o regulador dos mercados financeiros, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), questionando se antevê conflitos de interesse por um fundo ligado à Fosun investir em ativos detidos pela própria Fosun e ter como depositário um banco em que a Fosun é o principal acionista.

Em resposta, a CMVM disse que este é um fundo de capital de risco e que está registado (o registo público pode ser consultado) e que à CMVM cabe supervisionar, entre outros aspetos, o “cumprimento dos requisitos prudenciais e comportamentais aplicáveis às entidades gestoras e aos fundos sob gestão”.

A CMVM cita ainda o Regime da Gestão de Ativos em que é dito que se considera “investimento em capital de risco a aquisição de instrumentos de capital próprio e de instrumentos de capital alheio em sociedades com elevado potencial de desenvolvimento, como forma de beneficiar da respetiva valorização”.

Referiu ainda o regulador que, segundo o Regime da Gestão de Ativos, cabe à sociedade gestora do fundo “evitar, identificar, gerir e acompanhar, a todo o tempo, eventuais conflitos de interesses e assegurar que os participantes são tratados equitativamente, sem prejuízo das correspondentes competências de supervisão da CMVM”.

Já a sociedade gestora STAG disse à Lusa que a gestão do fundo e as decisões de investimento lhe cabem “exclusivamente” e que “atua de forma independente” no “melhor interesse dos seus investidores e em cumprimento com a legislação e normas vigentes”. Acrescentou que analisa os temas de conflitos de interesse zelando “pelo melhor interesse dos investidores”.

Sobre a Fosun, a STAG afirmou que esta “atua exclusivamente na qualidade de consultor (investment advisor) do fundo”.

“Mais se informa que a STAG cumpre com todas as matérias relativas à identificação, mitigação e ‘disclosure’ de potenciais conflitos de interesse, agindo sempre no melhor interesse dos seus participantes, dessa forma dando escrupuloso cumprimento aos seus deveres fiduciários”, acrescentou a sociedade gestora.

A Lusa também contactou a Fosun (questionando sobre conflitos de interesse e se tem a intenção de diminuir as suas participações no BCP e na Fidelidade), mas esta remeteu explicações para a STAG pois – indicou – só atua como consultor do fundo.

Já o BCP disse que não comenta temas relacionados com clientes e que o seu serviço como banco depositário “observa cabalmente todos os normativos em vigor, nomeadamente no que se refere à identificação e prevenção e, sendo o caso, reforço da supervisão dos processos relativos a situações que de alguma forma possam indiciar potenciais conflitos de interesses.”

O grupo chinês Fosun detém em Portugal a Fidelidade (85% do capital), a Luz Saúde (detida pela Fidelidade) e 5% da REN (através da Fidelidade). É o maior acionista do BCP, com cerca de 20%.

A Fosun tinha cerca de 25% do capital do BCP, mas no início do ano vendeu parte das ações detidas e desde então os mercados têm especulado que o grupo chinês pondera reduzir mais a participação no banco.

Nos últimos anos, o grupo Fosun acelerou a venda de ativos para reforçar a liquidez devido à elevada dívida que tem (no início do ano o conglomerado somava uma dívida de 40 mil milhões de dólares, cerca de 36 mil milhões de euros à taxa de câmbio atual) e à pressão que tem sentido do mercado obrigacionista.

Fonte próxima do grupo chinês disse à Lusa que este se quer manter como investidor de referência no BCP e que também na Fidelidade mantém o compromisso para com o mercado português.