A ONU decidiu esta sexta-feira usar 100 milhões de dólares de um fundo especial destinado a financiar a ajuda no que considera serem as crises humanitárias mais negligenciadas do mundo, incluindo Moçambique, para “salvar vidas”.

Os fundos, equivalentes a 90,2 milhões de euros, serão atribuídos a dez países, sendo um terço destinado a apoiar operações de socorro no Iémen e na Etiópia, onde as pessoas lutam para sobreviver no meio dos efeitos combinados da escassez de alimentos, das deslocações forçadas, das doenças e das catástrofes climáticas.

Serão também apoiadas atividades humanitárias essenciais em Myanmar, Mali, Burkina Faso, Haiti, Camarões e em Moçambique, um grupo de países enfraquecidos por anos de conflitos armados e deslocações internas.

No contexto das secas e inundações causadas pelo fenómeno El Niño, a ONU decidiu ajudar o Burundi e o Malaui, também.

“Em demasiadas situações de emergência humanitária, a falta de financiamento impede as agências de ajuda de chegarem às pessoas que precisam de assistência para se manterem vivas, o que é desolador”, afirmou a subsecretária-geral interina da ONU para os Assuntos Humanitários, Joyce Msuya.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Este tipo de financiamento “é uma injeção de dinheiro de emergência de último recurso para evitar o pior e salvar vidas quando outros financiamentos humanitários são insuficientes”, afirmou.

Este ano, a comunidade internacional solicitou 49 mil milhões de dólares (44,2 mil milhões de euros) para ajudar 187 milhões de pessoas desalojadas e consideradas as mais vulneráveis do planeta, mas até agora, ao entrarmos no nono mês do ano, apenas 29% desses fundos foram recebidos e o défice é de 35 mil milhões de dólares (31,6 mil milhões de euros).

Mais de 1,5 milhão de pessoas de três províncias moçambicanas do norte estavam, em junho, em situação de crise ou emergência de insegurança alimentar, segundo o Grupo de Segurança Alimentar, que reconheceu não ter recursos.

De acordo com o grupo, criado em 2011 e liderado conjuntamente pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura e pelo Programa Alimentar Mundial, a situação verifica-se nas províncias de Niassa, Nampula e Cabo Delgado, esta última com 879 mil pessoas nesta situação.

Cabo Delgado enfrenta desde outubro de 2017 uma rebelião armada com ataques reclamados por movimentos associados ao grupo extremista Estado Islâmico.

Nos últimos meses, “a situação de segurança em Cabo Delgado deteriorou-se acentuadamente”. Entre 26 de dezembro de 2023 e o final de maio de 2024, os ataques perpetrados por grupos armados “deslocaram aproximadamente 189.000 pessoas”, na “maior deslocação desde 2017”, apontou o documento.

“Esta violência espalhou-se por vários distritos, incluindo Ancuabe, Chiúre, Macomia, Mecufi, Metuge, Mocímboa da Praia, Muidumbe e Quissanga, com repercussões nos distritos de Erati e Memba, na província de Nampula. Estes ataques expandiram-se para áreas anteriormente não afetadas, levando a uma distribuição geográfica mais ampla das operações”, admitiu o Grupo de Segurança Alimentar.

Além disso, acrescentou que o ataque no distrito de Macomia, em maio, “resultou na suspensão da assistência a 89 mil pessoas, agravando ainda mais a crise”.

“A vulnerabilidade dos deslocados internos e dos repatriados, que continuam a depender da assistência humanitária para sobreviver, é significativa. Os regressos ocorrem frequentemente em áreas remotas onde as redes tradicionais de proteção comunitárias ainda não recuperaram”, reconheceu.