A escolha de Pedro Sánchez para próximo governador do Banco de Espanha está a valer fortes críticas ao chefe do governo espanhol. Em causa está a nomeação de um dos ministros do seu gabinete que, agora, deverá ter passagem direta para a liderança dos organismos independentes mais importantes que existem nos países europeus – de quem se espera que escrutine o governo e não se deixe influenciar pelas prioridades políticas.

A nomeação do (atual) ministro da Transformação Digital, Jose Luis Escrivá, não garante essa independência, defende a oposição a Sánchez. “Não se pode ser ministro de manhã e governador [do banco central] à tarde“, disse o líder do PP, Alberto Núñez Feijóo, na terça-feira.

Cabe ao chefe do Governo indicar o governador do Banco de Espanha, sendo porém habitual uma negociação com o principal partido da oposição, que tradicionalmente aceita o nome para a liderança e escolhe, por sua vez, o vice-governador. Desta vez, porém, o Partido Popular (PP, direita, na oposição) recusou alinhar neste acordo não escrito, por discordar da nomeação de um ministro em funções, considerando que está em causa a independência do banco central do país.

Feijóo acusou Sánchez de querer “controlar e invadir” o Banco de Espanha com uma escolha que não dá “garantias de independência”. Jose Luis Escrivá, funcionário do Banco de Espanha, vai suceder a Pablo Hernández de Cos, cujo mandato terminou há três meses e tem desempenhado o cargo de forma interina.

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Em 2014, Sánchez criticava nomeação de… secretário de Estado

José Luis Escrivá é o primeiro ministro em funções que passa diretamente a governador do Banco de Espanha desde que há democracia no país, embora o mesmo já tenha acontecido com um secretário de Estado, Miguel Ángel Fernández Ordóñez, quando integrava um governo liderado pelo socialista Jose Luis Zapatero.

Nessa altura, em 2014, o mesmo Sánchez considerou que essa escolha era “um erro”, numa tentativa de marcar uma diferença em relação à então liderança dos socialistas.

Em Portugal, António Costa também foi criticado pela nomeação de Mário Centeno para o Banco de Portugal, com a diferença de que Mário Centeno tinha saído do cargo de ministro das Finanças alguns meses antes de ter sido revelada a nomeação.

A primeira vida de Centeno no Banco de Portugal (e o caminho sinuoso que o levou ao topo)

Atualmente ministro da Transformação Digital e Função Pública, José Luis Escrivá foi ministro da Segurança Social na legislatura anterior, sempre com Pedro Sánchez como líder do Governo. No período em que foi ministro, protagonizou alguns confrontos com o governador do Banco de Espanha, por causa de estudos sobre a sustentabilidade do sistema de pensões no país e a necessidade de reformas.

José Luis Escrivá é licenciado em Ciências Económicas e, antes de ser ministro, foi chefe da Divisão de Política Monetária do Banco Central Europeu (1999-2004) e assessor do Instituto Monetário Europeu (1993-1999). No Banco de Espanha, do qual é quadro, foi subdiretor do Departamento de Estudos Monetários e Financeiros e chefe da Unidade de Investigação Monetária.

Já foi também presidente da Rede de Instituições Fiscais Independentes da União Europeia (2015-2019) e da Autoridade Independente de Responsabilidade Fiscal (um supervisor espanhol), assim como economista-chefe e diretor do Serviço de Estudos do banco BBVA (2004-2010).

O Governo espanhol, através do ministro da Economia, Carlos Cuerpo, justificou esta quarta-feira a escolha de Jose Luis Escrivá realçando a sua capacidade e qualificação técnica, experiência e conhecimento das instituições europeias e do próprio Banco de Espanha. O ministro insistiu por diversas vezes que o Governo tem “confiança na idoneidade” de José Luis Escrivá como governador do Banco de Espanha.