O Governo, na proposta ao PS na derradeira tentativa de ver o Partido  Socialista a viabilizar o Orçamento do Estado para 2025, recua nas pretensões de reduzir até aos 15% as taxas nominais de IRC (Imposto sobre Rendimentos Coletivos). Agora põe em cima da mesa uma taxa nominal de IRC em 2027 de 17%.

E em vez de na legislatura descer 6 pontos percentuais (de 21% para 15%), cortará quatro pontos. No Orçamento do Estado para 2025 avançaria uma taxa de IRC de 20%, em vez dos atuais 21%, mas acima dos 19% que inicialmente pretendia aplicar. O impacto orçamental acontece, apenas, em 2026, com a entrega das declarações de rendimentos por parte das empresas.

Cortar a taxa de IRC em um ponto em vez dos dois pontos permite ao Governo “poupar” 250 milhões nas contas públicas. Isto porque previa um impacto de 500 milhões só por via do corte das taxas nominais de IRC. No conjunto dos três anos o Governo estimava um impacto orçamental de 1.500 milhões de euros com uma descida de seis pontos. Agora com quatro pontos o impacto será de mil milhões (250 milhões por cada ponto, segundo indicou Miranda Sarmento).

No acordo com os parceiros sociais, o Governo tinha optado por colocar apenas o compromisso de reduzir progressivamente o imposto, sem colocar taxas nem período temporal. Agora o Governo diz, na proposta ao PS, que “existe abertura para o diálogo sobre a distribuição no tempo, ao longo dos três anos, da redução percentual prevista”.

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“Ao invés de reduzir até 2027 a taxa nominal de IRC de 21% para 15%, a redução far-se-ia, também ao longo de três anos, mas apenas até aos 17%, (a que se somam as derramas estaduais e a derrama municipal, que podem agravar a taxa marginal em mais 10.5 pontos percentuais)”, lê-se no documento publicado pelo Governo. O FMI ainda esta semana tinha criticado a proposta inicial do Governo para o IRC e dizia que “em vez de reduzir a taxa base, a prioridade devia ser dada à redução das sobretaxas progressivas e locais, o que poderia ajudar a alinhar a média da taxa do IRC com a zona euro, ao mesmo tempo que promoveria o crescimento empresarial”. Existem setores com taxas extraordinárias, mas existe ainda as derramas estaduais e municipais que incidem sobre os lucros das empresas. O Governo chegou a admitir, no programa eleitoral da AD, cortar progressivamente estas derramas, mas entretanto o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, já fez saber que teria um custo muito elevado.

Agora, com esta proposta o Governo diz que “o impacto orçamental incremental anual a partir de 2026 desceria de 500 milhões para uma média anual de cerca de 330 milhões”. 

Só nesta medida o Governo “ganha” 200 milhões de margem face ao que tinha previsto, a que acresce a margem garantida com a modelação do IRS Jovem — que agora prevê ter um impacto de 645 milhões, em vez dos mil milhões inicialmente apresentados.

Ou seja, só com estas duas medidas, o Governo garante uma poupança anual, face ao seu programa, de cerca de 600 milhões de euros, sendo que em 2025 a margem adicional é de quase 400 milhões (porque só conta o IRS Jovem, uma vez que o primeiro impacto do IRC sente-se em 2026).

600 milhões é quase tanto como o excedente a que estará comprometido com Bruxelas. O Governo diz que, com base nas medidas já adotadas (quer pelo Executivo, quer pelo Parlamento), a margem orçamental para políticas discricionárias é diminuta. Seria, nas contas do Governo, de 1.060 milhões de euros e que o Governo queria aplicar na totalidade ao IRS Jovem e à isenção de IMT e imposto de selo na compra de habitação para jovens. O Governo contabiliza em 452 milhões os impactos das medidas que apelida de consensuais — professores, forças de segurança e militares, complemento solidário para idosos, consignação de IRS; e em 740 milhões as aprovadas pelo Parlamento (portagens, IVA eletricidade, IRS).

Isto depois de indicar que a margem total era, conforme definido junto de Bruxelas, de 2.252 milhões de euros.

Sem que se saiba o que o Governo entregará a Bruxelas para o plano de médio prazo, o Governo diz apenas que “na sequência do diálogo técnico com a Comissão Europeia conducente à aprovação do Plano Orçamental e Estrutural de Médio Prazo de Portugal (POEMP), este ligeiro excedente corresponde a um saldo positivo de 0,3% do PIB em 2025, isto é, cerca de 700 milhões de euros”.  No entanto, Bruxelas ainda vai ter de se pronunciar sobre esse plano.

Além do IRC, o Governo diz que aceita o proposto pelo PS para o reforço do incentivo fiscal à valorização salarial — que inclui majoração em IRC de 50% do custo com o aumento salarial de pelo menos 4,7% — e melhorar o regime de capitalização das empresas. Ambas as propostas já constam do acordo de rendimentos que o Governo assinou com os parceiros sociais no início desta semana. Segundo o Governo estas propostas às quais atribui a paternidade ao PS custam, respetivamente, 40 milhões e 60 milhões de euros. Há ainda um custo de 50 milhões com a proposta de reduzir em 20% das tributações autónomas sobre veículos em 2028. Também no acordo de rendimentos o Governo já tinha acordado um corte nestas tributações.

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Os parceiros do lado dos empregadores queriam que o Governo tivesse traçado um objetivo concreto para a taxa de IRC no acordo, o que não aconteceu. Aceitaram, ainda assim, assinar para, segundo disseram, dar um sinal. O Governo tem-se batido pela descida do IRC, argumentando que ao reduzir as taxas conseguirá tornar a economia mais competitiva e, por conseguinte, fazer crescer o bolo da receita pelo aumento da atividade económica.

O IRC e o IRS Jovem têm sido apontadas pelo PS como duas linhas que inviabilizam o voto socialista que permita o Orçamento passar.

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