A neta do capitão Barros Basto apresentou uma queixa contra Portugal no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH), exigindo a sua reintegração póstuma no Exército, foi esta quarta-feira divulgado.
Em comunicado, a Comunidade Judaica do Porto revelou que a queixa foi apresentada em setembro por Isabel Barros Lopes, neta do capitão de infantaria Arthur Barros Basto, conhecido como o “Dreyfus português”.
A história remonta a 1937 quando o Conselho Superior de Disciplina do Exército decidiu pela “separação do serviço” do capitão Arthur Carlos Barros Basto por considerar que não possuía “capacidade moral para prestígio da sua função e decoro da sua farda”.
Em causa estava a realização de operações de circuncisão a alunos do Instituto Teológico do Porto, que havia fundado, e a saudação com um beijo dos mesmos alunos, à maneira dos judeus sefarditas de Marrocos.
Ao longo dos anos, Barros Basto tem sido comparado por historiadores ao general francês Alfred Dreyfus, por serem contemporâneos, judeus e capitães e ambos terem sido separados do serviço em processos instruídos a partir de denúncias anónimas caluniosas, destaca a Comunidade Judaica do Porto.
“Isabel Barros Lopes, que viveu com o avô até aos sete anos de idade, acompanhou durante décadas os esforços infrutíferos da sua mãe Miriam Azancot e da sua avó Lea Azancot para tentarem obter justiça para o seu ente querido. Este faleceu em 1961, tendo exclamado no leito da morte: ‘Ainda um dia me farão justiça!’, sublinha a comunidade, na nota de imprensa.
Desde 2011 que Isabel Barros Lopes tem “encetado esforços para levar o assunto a bom termo” e, em 2012 e 2013, obteve “duas decisões amplamente favoráveis: a recomendação do parlamento ao governo para reintegrar Barros Basto e a proposta do exército para reintegração do oficial como coronel”.
“Ambas as decisões deram por assente que o oficial foi vítima de segregação político-religiosa. No entanto, nunca até hoje houve uma decisão final”, sublinha ainda.
“O caso tornou-se ainda mais complexo por via da Lei n.º 28/2018, da iniciativa do Bloco de Esquerda, que visava reintegrar militares injustamente despedidos. Apesar de os proponentes da lei terem escrito a Isabel Barros Lopes informando-a de que o caso do seu avô poderia finalmente ser resolvido, uma vez que no espírito da lei estavam previstas reintegrações póstumas, o assunto continuou sem uma decisão até hoje”, acrescenta.
Na queixa, a neta do “Dreyfus português”, atualmente vice-presidente da Comunidade Judaica do Porto, fundada pelo seu avô, defende que “foi violado o artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, que a todos garante o direito a um processo equitativo e que seja decidido num prazo razoável, quanto à determinação e justa aplicação dos seus direitos”.
“A peticionante alega que é vítima direta da violação dos direitos e garantias previstos na Convenção e que os atos e omissões contestados emanam das mais altas autoridades da administração pública portuguesa. Argumenta ainda que não existe nenhum recurso eficaz num tal caso e que, na sua interação com o Estado, esgotou todos os meios passíveis de remediar a situação num tempo razoável, tendo suportado atrasos inconcebíveis à luz do direito internacional”, salienta ainda a Comunidade Judaica do Porto.
Por estas razões, o TEDH é instado a atribuir à parte lesada uma “reparação razoável” e para instar o Estado português a “reintegrar postumamente o ‘Dreyfus português’ como coronel”.