Dois em cada dez trabalhadores portugueses dizem ter tido conhecimento no último ano, de casos de abuso de autoridade, bullying e assédio, mas não os reportaram por acreditar não haver consequências ou por medo de retaliações, revela um estudo.

O inquérito “Ethics at Work 2024” do Institute of Business Ethics, efetuado em Portugal com a parceria da Católica Porto Business School, analisou, entre abril e maio de 2024, três grandes áreas: a cultura ética; a identificação de riscos éticos; e o apoio à ética no local de trabalho, num universo de cerca de 12 mil pessoas de 16 países (Reino Unido, os EUA, a Irlanda, a França, a Alemanha, a Itália, a Espanha, a Austrália, a Nova Zelândia, Portugal, a África do Sul, os Países Baixos, Hong Kong, o Brasil, a Índia e o Japão).

Em Portugal, os resultados — que serão apresentados em sessão pública na Conferência anual do Fórum de Ética, em 12 novembro — revelam que dos países inquiridos, os trabalhadores portugueses são dos que têm menos probabilidades de fazer uma denúncia depois de terem conhecimento de má conduta.

Nós continuamos a ser dos piores países a reportar. Em 2019, 49% dos trabalhadores reportavam, depois baixou, em 2021, para 46%, mas teve de ver com a [pandemia de] covid-19, e agora aumentou para 56%. Há aqui uma melhoria no reporte, mais ainda assim são números muito grandes e bastante inferiores aos outros países”, afirmou, em declarações à Lusa, Helena Gonçalves, coordenadora do Fórum de Ética da Católica Porto Business School.

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De acordo com o estudo, cerca de dois em cada dez trabalhadores em Portugal afirmaram ter tido conhecimento de condutas que consideravam violar a lei ou as normas éticas da sua organização no último ano.

Entre os que não comunicaram, cerca de quatro em cada dez apontaram a descrença quanto à tomada de medidas corretivas (41%) e o medo de pôr em risco o emprego (36%) como os principais entraves à denúncia. Já entre os que reportaram, quase metade (51%) afirma ter sofrido uma forma de desvantagem pessoal ou retaliação em resultado disso, número que coloca os trabalhadores portugueses, juntamente com os da Alemanha (53%), França (64%) e Índia (65%), entre os que se sentem mais suscetíveis de sofrer retaliações. Embora maior do que registado em 2021 (42%), este número é semelhante à média global (46%).

O estudo revela também que cerca de um em cada cinco trabalhadores portugueses sentiu-se pressionado a comprometer os padrões éticos de comportamento (22%), à semelhança dos dados recolhidos em 2021 (21%). Este valor é, contudo, superior à média global que se fixa nos 15%.

Ainda segundo o inquérito, cerca de quatro em cada dez trabalhadores que se sentiram pressionados afirmam que “a pressão do tempo/prazos irrealistas (38%) e o cumprimento das ordens do chefe (37%) são as principais fontes de pressão“.

Em linha com as tendências anteriores, o abuso de autoridade é o tipo de má conduta de que os trabalhadores portugueses têm mais probabilidade de ter tido conhecimento (43% dos que tiveram conhecimento de má conduta referiram este aspeto), seguindo-se o bullying e outras formas de assédio (32%).

Este ano, explicou Helena Gonçalves, o assédio sexual passou constar numa categoria autónoma, o que não sucedeu no estudo realizado em 2021, o que permitiu “perceber que em Portugal também há um assédio sexual relativamente grande, mas, do que estamos verdadeiramente a falar é de assédio moral”.

No cômputo global, o estudo revela que um em cada três entrevistados (35%) tem conhecimento de abuso de autoridade, enquanto 32% relataram casos de bullying e assédio. Já 20% dos colaboradores reconheceram ter conhecimento de assédio sexual.

O estudo mostra ainda que, entre os dois terços dos colaboradores que levantaram preocupações (64%), quase metade (46%) enfrentou “desvantagens pessoais ou retaliação por terem falado abertamente, e 28% expressaram insatisfação com o resultado”.