Um mês e meio depois de ter sido tornado público que a Direção Executiva do SNS tinha afastado o conselho de administração da Unidade Local de Saúde Almada-Seixal (uma das maiores do país), a presidente da ULS — que abarca o Hospital Garcia de Orta — revela que o diretor-executivo, António Gandra D’Almeida, lhe pediu, num telefonema de menos de três minutos, para que os membros da administração apresentassem a demissão. A partir daí, nada aconteceu e Teresa Luciano garante que não se vai demitir.
“No início de setembro, recebemos um telefonema de menos de 3 minutos do diretor-executivo a pedir se poderíamos fazer cartas de rescisão. Até ao momento, e passados dois meses, nada mais sabemos sobre o assunto“, lamentou a presidente da ULS Almada-Seixal, criticando a abordagem de António Gandra D’Almeida, que, garante, não explicou as razões pelas quais pediu que o conselho de administração se demitisse. “As decisões têm de ser fundamentadas, o que não aconteceu. Não me foram dadas durante estes dois meses quaisquer explicações”, sublinhou Teresa Luciano, que foi ouvida esta manhã na Comissão de Saúde da Assembleia da República, a pedido do Bloco de Esquerda.
“A quem serviu esta nossa possível demissão? É uma decisão tomada sem fundamentação, em praça pública e sem salvaguarda do meu nome e minha equipa”, disse a responsável, garantindo que o conselho de administração da ULS não vai apresentar a demissão, por considerar que fez o possível com os recursos disponíveis, nomeadamente na área da Ginecologia-Obstetrícia.
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Tal como o Observador avançou, a Direção Executiva do SNS ficou desagradada com o facto de o Hospital Garcia de Orta não ter cumprido o esquema de rotatividade acordado antes do início do verão entre as três urgência de Obstetrícia da Península de Setúbal, e que previa que um dos três serviços da região (nos hospitais Garcia de Orta, do Barreiro e de Setúbal) teria de estar aberto, à vez, para garantir a resposta às grávidas e evitar encaminhamentos para Lisboa. Em julho e agosto, o Garcia de Orta não cumpriu o acordo, por falta de médicos obstetras para preencher as escalas.
Teresa Luciano explicou aos deputados que o “plano de verão começou a ser discutido partir de 15 de maio, com um grupo criado pela tutela, que reuniu com um grupo de Obstetrícia [da Península de Setúbal] mas não chegaram a nenhuma conclusão”. “Depois, definiu-se uma semana aberta e duas fechadas para os três hospitais. Foi logo dito pela diretora de serviço [de Obstetrícia da ULS Almada-Seixal] que seria muito difícil cumprir a escala com os recursos existentes”, sublinhou a presidente do Garcia de Orta, explicando que tem apenas dois especialistas disponíveis (auxiliados por dois internos) para assegurar as escalas da urgência, quando deveriam ser, no mínimo, quatro. Pelo menos sete médicas estão, neste momento, a gozar licença de maternidade e outros tantos não fazem urgência por terem mais de 55 anos.
“Estamos a fazer escalas com quatro pessoas. Desafio qualquer um a fazer escalas nesta situação. Dificilmente um outro Conselho de Administração vai conseguir fazer melhor que nós”, defendeu a responsável, lembrando que o problema da falta de recursos humanos na Obstetrícia é “transversal”. Ainda assim, garantiu, o hospital Garcia de Orta não fechou totalmente a urgência nos períodos mais críticos, tendo recebido grávidas referenciadas.
Para o deputado do PS João Paulo Correia, a demissão da administração da ULS é “invulgar, preocupante e faz parte de uma trapalhada de telenovelas que a senhora ministra tem protagonizado”.